Folha de S. Paulo
Dinheiro não é apenas valor de troca, mas
incremento de fantasias de eternidade e poder
Tão logo solto, o ex-governador do Rio voltou à memória dos jornais a sua admissão pública de corrupção compulsiva, nos termos de vício em poder e dinheiro. É uma fala espantosa, porque sincera e confirmadora de um fenômeno que afeta, em escalas diferentes, a classe política no mundo inteiro. O que singulariza essa confissão é tanto o tamanho quanto a exibição pública da defraudação. "Taxa de oxigênio" era o nome debochado da propina.
Dinheiro não é apenas valor de troca, mas incremento de fantasias de eternidade e poder que, não raro, beiram a loucura. Daí o vício. Mas o cerne social da questão consiste em saber como isso acontece na esfera pública, ou melhor, como é possível a continuidade da prática espoliativa, uma administração após outra. Sobre o Rio, explicações meramente políticas vinculam as linhas mestras do fenômeno a uma organização partidária dependente de fisiologismo secular. Uma chaga histórica próxima à de outras regiões nacionais.
Nada disso, entretanto, dá conta da
facilidade com que administrações estaduais e municipais descambam para a
corrupção, viciante como um jogo. Uma hipótese é a de que a privatização do
Estado, macrofenômeno do patrimonialismo brasileiro, tenha inflexão acentuada
na paisagem fluminense, onde sucessivas dinastias de famílias e clãs se ampliam
por "sócios ocultos" em currais eleitorais.
Na deslavada promiscuidade territorial entre Estado e organizações criminosas
floresce a violência social. Por outro lado, o mal que espreita nas sombras de
toda esfera pública vive solto na buraqueira local, sob a forma de fraudes e
peculato. A desenvoltura benfazeja à beira de praia é tenebrosa em sede de
governo. Na encruzilhada do crime, entretanto, ainda se perfila
institucionalmente o risco da penitenciária de Bangu que no verão, dizem, é
quente como o inferno, com taxa de oxigênio sofrível.
*Sociólogo, professor emérito da UFRJ, autor, entre outras obras, de "A Sociedade Incivil" e "Pensar Nagô".
Acho que Muniz Sodré comete um erro ao generalizar (ui!) a doença da corrupção compulsiva dizendo que "afeta a classe política do mundo inteiro". Isso nos países capitalistas em geral e especialmente no capitalismo selvagem como é o brasileiro. Creio que um Sérgio Cabral da vida não vinga numa sociedade como a dos países nórdicos onde vigora a socialdemocracia que é o "capitalismo com rosto humano".
ResponderExcluirO viralata acima acha que a corrupção é endêmica por aqui e por lá as pessoas são boas per si. Meu caro, dinheiro e poder é como o economista acima descreve. Essa tese viralatista de que nos países nórdicoa não existem Sérgios Cabrais é tanto rídicula quanto ingênua. Pueril.
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