O Globo
Jornalistas e auxiliares de Lula erram ao
iniciar bolsa de apostas que prejudica a largada do governo e mantém
acirramento na sociedade
Lula ainda não completou uma semana de
mandato, mas as bolsas de apostas para a sucessão presidencial de 2026 estão a
todo vapor.
O erro é comum à imprensa e aos integrantes
do próprio governo, e, além de ser o caminho certo para fofocas e conchavos que
podem inviabilizar a largada da gestão, invariavelmente produzirá análises
equivocadas.
Quem escreve coleciona uma série desses
equívocos, frutos da tentação de passar a esquadrinhar a eleição seguinte tão
logo é anunciado o resultado da última.
Depois de eleger João Doria prefeito de São
Paulo em 2016 e na sequência governador do estado, Geraldo Alckmin foi apontado
por todos, inclusive por mim, como nome forte para 2018. Teve menos de 5% dos
votos válidos.
O próprio Doria, eleito duas vezes em dois
anos, responsável por viabilizar a primeira vacina anti-Covid em 2021, era nome
dado como certo na cédula de 2022, mas chegou avariado à campanha e bateu em
retirada.
Voltando ainda mais no tempo e evocando o passado petista, em 2003, quando Lula subiu a rampa do Planalto, imediatamente se deflagrou uma disputa pelo posto de seu sucessor, entre José Dirceu, então instalado na Casa Civil, e Antonio Palocci, responsável pela Fazenda. Mudança de script: os dois se inviabilizaram por escândalos distintos e não chegaram vivos a 2010; sobrou para Dilma Rousseff, que no bolão dos cotados de sete anos antes não teria sequer um voto.
Um dos primeiros a darem corda para esse
tipo de especulação estéril na nova equipe foi o titular da Casa Civil de Lula
3, Rui Costa, em entrevista ao “Roda viva” nesta semana. Depois de
orgulhosamente desviar de todas as tentativas de jornalistas de colocá-lo como
opositor de colegas de ministério ou candidato a receber a faixa de Lula, ele
achou por bem dizer que nada impede que seja o próprio presidente o cabeça de
chapa em 2026, a despeito de tudo que ele próprio tem garantido desde que se
lançou candidato. Se a ideia era acalmar a disputa entre os ministros, o
resultado foi o oposto: catapultar o presidente de volta ao palanque, com Jair
Bolsonaro, que nunca desceu, do outro lado.
Lula tem vários defeitos, mas não custa
lembrar que, em 2014, ele resistiu aos insistentes apelos do “volta, Lula”.
Antes ainda, em 2010, desviou da casca de banana dos que propugnavam que ele
tentasse um terceiro mandato. Em suma: nem tentou ser um autocrata com ares de
democrata, nem puxou o tapete de Dilma Rousseff, sua criatura, mesmo quando
petistas queriam vê-la pelas costas.
Tentar adivinhar em janeiro de 2023 quem
será competitivo em 2026 é burrice política e falta de acuidade jornalística.
Instados a opinar demais — além de nos espaços de trabalho, também nas redes
sociais —, nós, jornalistas, não podemos repetir essa esparrela depois de
termos apostado que Jair Bolsonaro encontraria um teto e ficaria pelo caminho
em 2018. Sabemos qual foi o desfecho.
É importante escrutinar o novíssimo governo
com as lentes de hoje (e do que ele resgata de ontem), sob pena de turvar a
análise com a tentativa de adivinhar o grid eleitoral de 2026.
Bolsonaro estará elegível? Se estiver e for
competitivo como hoje, haverá algum candidato que não seja Lula capaz de
enfrentá-lo com alguma chance? Todas essas e mais muitas são questões de longo
prazo a que só o dia a dia do governo que entra poderá responder.
Se repetir escândalos e desastre econômico,
Lula não só se inviabilizará, como queimará qualquer um dos aliados de hoje
listados como candidatos daqui a três anos e alguns meses. Cabe a ele,
portanto, construir o caminho da própria sucessão. E a nós e a seus assessores,
o bom senso de não enveredar pela predição supersticiosa no lugar da análise de
dados, fatos e evidências.
Vera Magalhães e sua análise correta.
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