Esses diálogos fazem parte da rotina dos nossos governantes e lideranças civis preocupadas com os casuísmos, que dão uma cara para a governabilidade. O presidente Luís Inácio da Silva só vai dando suas alfinetadas. Canetadas ainda não . Lula está ocupado mesmo é com a reinserção do Brasil no grupo de países que , neste momento, comanda o mundo. Esteve com o presidente dos Estados Unidos, vai visitar o da China, e pretende conseguir uma reunião do BRICS - Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul - para defender oficialmente sua proposta de acordo para acabar com a guerra da Rússia contra a Ucrânia.
Existe hoje no mundo um clima de belicosidade que parece mesmo propiciar o surgimento de uma "nova ordem mundial, multipolar". A tese é do articulista Luiz Carlos Azedo, do jornal Correio Braziliense, de Brasília. O presidente brasileiro tenta antecipar-se, agarrando a bandeira da paz, esperando mediar entendimentos pacíficos, desestimulando pretensões hegemônicas de alguns. Azedo reafirma que Lula tem a ambição de conquistar o prêmio Nobel ( a Argentina tem cinco) e Celso Amorim parece estar ali, no Palácio do Planalto, para pavimentar a rota. Resta saber se o personagem brasileiro tem lá fora essa credibilidade imaginada.
O voluntarismo do atual cenário inspira, de fato, a presunção de uma nova ordem. Mas, os protagonistas parecem afetados por um certo transtorno dissociativo de identidade. Vladimir Putin, da Rússia, chegou a dar uma entrevista ameaçando o mundo com suas armas nucleares. "Se essa guerra acontecer, ninguém vai ganhá-la". Parece ter pouca conexão com os ideias das populações civis e ser indiferente ao destino do mundo. Ji Jinping deseja a paz , buscando hegemonia própria. Não parece preocupar-se com o futuro dos ucranianos, como povo soberano . Do outro lado, o Ocidente, liderado por Joe Biden, presidente dos EUA, e sua retaguarda altamente conservadora, mantém uma retórica anti belicosa, mas posiciona tropas , via OTAN pelo mundo afora. Será para essas lideranças doentias crêm na factibilidade um novo mundo?
Como um dom Quixote, o presidente brasileiro, sem espada, sem lança, quase à pé, vai tentando se posicionar como um equilibrista nesse meio, sob um tal "olhar maledicente" dos compatriotas, que olham para o próprio umbigo. Não conseguem perceber que fora do seu espaço local, regional ou nacional existe um outro mundo. Aquele em que os atores se assumiram como "países centrais" diante da omissão dos que por aqui sempre acreditaram em fatalidades históricas. Darcy Ribeiro dizia que para alcançarmos mudança profunda no caminho do Brasil, não se pode deixar o passado entrar. São décadas e décadas perdidas.
Nesses tempos pandêmicos aproximei-me um pouco mais, como alternativa, do pensamento de Darcy Ribeiro. Não estou certo ainda se era um contestador temperamental (iracundo) ou um profeta. No complexo cenário dos pós guerra, vivido por ele, Darcy prenunciou um Brasil líder de um "novo processo civilizatório", por meio de um "povo novo"; mestiço, já descrito Gilberto Freire, com estilo próprio de vida .
Ao refutar o pensamento derrotista que impregnou conformismo histórico do brasileiro, Ribeiro argumentou que, como país ocupado por populações indígenas, os povos nativos tinham modelos próprios de sobreviver . Não precisavam do branco. Os povos que caracterizam a naturalidade brasileira são aqueles surgidos da miscigenação entre os nascidos na terra, que Darcy chamou de um "povo novo", a quem caberia a responsabilidade de gerar, espontaneamente, um novo processo civilizatório no mundo. O Brasil de Lula é aquele mesmo solo tupiniquim de Darcy, que o escritor alemão Stefan Zweig escolheu para viver por entender que seria este o "País do Futuro", de raça híbrida, segundo historiadora brasileira Lilian Scwartz.
Um mundo destruído pelas guerras e a insensatez de meia dúzia não parece que será um território demarcado por planos plurianuais de investimento, dominado por etnias isoladas. Precisa de rumo, sim. As grandes migrações estão criando um povo novo, resultante de fusões étnicas. Os valores civilizatórios de hoje não seriam os mesmos, e não haveria hegemonias, nem de países - se remanescerem como tal - nem de lideranças com poderes extraordinários autoproclamados, quanto esses que a pós-modernidade revela por aí. Berthold Brecht já havia advertido que pobres os países que não tem líderes, mas pobre mesmo são aqueles que precisam deles.
*Jornalista e professor.
Darcy Ribeiro é sempre uma inspiração como educador e político!
ResponderExcluirApoiado.
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