Viagem aos EUA resgata status global do Brasil
O Globo
Adesão dos americanos ao Fundo Amazônia
mostra que Lula começa a tirar do país a pecha de pária
O encontro dos presidentes Luiz Inácio Lula
da Silva e Joe Biden na Casa Branca rendeu mais que o esperado aperto de mãos
no Salão Oval e a condenação do extremismo político dos populistas
autoritários. Em comunicado conjunto, os Estados Unidos anunciaram a intenção
de destinar recursos ao Fundo Amazônia, que já conta com aportes da Noruega e
da Alemanha. Desde o início do governo anterior, o Brasil pedia aos americanos
dinheiro para ajudar a preservar a Amazônia, mas as conversas nunca foram
adiante devido à política antiambiental do governo Jair Bolsonaro. Em 2019,
Noruega e Alemanha congelaram seus repasses ao fundo, enquanto a devastação na
floresta batia recordes.
Criado em 2008, o Fundo Amazônia depende de doações para investir em prevenção, monitoramento, combate ao desmatamento e promoção do uso sustentável da floresta. Até o momento, a Noruega já doou R$ 3,1 bilhões, a Alemanha R$192 milhões (e a Petrobras R$ 17 milhões). Gerido pelo BNDES, em 15 anos o fundo já apoiou 384 instituições locais, 195 unidades de conservação, 101 terras indígenas, além de dezenas de milhares de indivíduos em atividades produtivas sustentáveis. As ações permitiram a inscrição de 1,1 milhão de imóveis no Cadastro Ambiental Rural, 1.700 missões de fiscalização e o combate a cerca de 30 mil incêndios e queimadas. Quanto mais recursos, mais projetos podem ser apoiados.
Com a volta de Lula ao poder, as
negociações com os americanos foram enfim destravadas, e os europeus voltaram a
contribuir com o fundo. O anúncio dos Estados Unidos aconteceu dois dias depois
de a chanceler francesa, Catherine Colonna, ter afirmado em Brasília que França
e União Europeia estudam também fazer parte do Fundo Amazônia. Parece evidente
que a saída de cena de Bolsonaro provocou reação imediata das potências
ocidentais, dando a oportunidade para Lula cumprir uma de suas promessas de
campanha: retirar do Brasil a pecha de pária.
Independentemente do valor que será
arrecadado dos americanos, o gesto representa um voto de confiança dos Estados
Unidos na promessa do novo governo brasileiro de combater o desmatamento ilegal
na Amazônia. Outra evidência da mudança se viu na aproximação entre a ministra
do Meio Ambiente, Marina Silva, e o enviado especial para o clima dos Estados
Unidos, John Kerry. Marina e Kerry se encontraram na Conferência do Clima das
Nações Unidas no Egito e no Fórum Econômico Mundial, em Davos, Suíça.
Noutro sinal de boa vontade, o governo
americano incluiu no comunicado conjunto apoio à ampliação do Conselho de
Segurança da ONU, antiga demanda de governos petistas. A questão mais espinhosa
foi a guerra na Ucrânia. Nas negociações, os americanos queriam uma condenação
veemente da Rússia. No final, o texto condena a violação do território
ucraniano nos mesmos termos usados na visita a Brasília do chanceler alemão,
Olaf Scholz. Em entrevista à CNN, Lula já declarara que a Ucrânia tem o direito
de se defender da invasão russa. Justificou ter se negado a mandar munição aos
ucranianos dizendo não querer fazer parte da guerra e insistiu que é preciso
conversar sobre uma saída pacífica. Prevaleceu a sensatez. Lula e o Brasil têm
o que celebrar no voo de volta.
Decisão da Anatel facilita combate a
caixinhas que pirateiam TV paga
O Globo
Operadoras estarão autorizadas a bloquear o
sinal dos dispositivos não homologados pela agência
Uma decisão da Agência Nacional de
Telecomunicações (Anatel) anunciada na quinta-feira representa um passo
importante no combate à pirataria de TV por assinatura. A partir de agora, a
Anatel atuará com as operadoras de internet para fazer o bloqueio dos sinais
piratas das caixinhas de TV não homologadas. Estima-se que haja hoje no Brasil
de 5 milhões a 7 milhões desses dispositivos dando acesso ilegal a conteúdos
protegidos por direito autoral.
Apesar da ilegalidade flagrante, os
decodificadores clandestinos de TV por assinatura são facilmente encontrados no
mercado. Não só em feiras e lojas de artigos eletrônicos, mas até nos sites de
grandes varejistas. Há mais de 700 modelos à venda, a maioria fabricada na
China, por preços que chegam a R$ 1.000. É irregular, mas basta uma busca na
internet para deparar com um sem-número de ofertas. A caixinha instalada numa
SmarTV ou num aparelho convencional dá acesso a conteúdos pirateados via
streaming.
Ao contrário dos conhecidos “gatos” de TV
por assinatura espalhados pelas comunidades pobres, especialmente as
controladas por organizações criminosas, a pirataria das caixinhas de TV reúne
todas as classes sociais, mesmo quem teria recursos para contratar um serviço
legal, que gera empregos e paga impostos.
Autoridades têm feito operações para
apreender dispositivos clandestinos e bloquear conteúdos ilegais. Em junho
passado, uma ação do Ministério da Justiça com apoio das polícias estaduais
prendeu pelo menos dez suspeitos em 11 estados. Entre 2018 e 2022, mais de 1,4
milhão de dispositivos não homologados foram apreendidos. Mas essas ações são
insuficientes para deter o problema que se alastra. Bloqueios obtidos por via
judicial também não têm impedido o serviço ilegal.
Não há inocência nas caixinhas de TV
clandestinas. Pirataria é crime. O prejuízo para as empresas de TV por
assinatura é estimado em R$ 15 bilhões por ano, e a sonegação fiscal em R$ 8
bilhões por ano, dinheiro que poderia ser destinado a setores prioritários como
educação, saúde e segurança. O negócio clandestino é controlado por máfias
internacionais. A caixinha instalada na sala de casa é um computador que, na
prática, abre portas a todo tipo de transgressão. Pode ser usado para vigiar,
furtar dados, senhas, fotos íntimas e atacar sistemas. Inspeções da Anatel já
detectaram intenções maliciosas. Os sistemas permitem que terceiros tenham
acesso irrestrito ao dispositivo com privilégios de administrador.
A pirataria é um problema grave. Representa
prejuízo para quem atua dentro da lei e para o Estado, além de riscos para os
usuários. Por isso precisa ser combatida. Um dos méritos da decisão da Anatel é
permitir mais agilidade e eficiência ao enfrentar os piratas por meio de
bloqueios administrativos do sinal das operadoras. Espera-se que a iniciativa,
implantada com sucesso em países como Portugal, Itália, Alemanha, Grécia e
Lituânia, funcione como desestímulo ao streaming clandestino e à venda de
aparelhos não homologados. É só o começo, mas já é um avanço.
Atividade em risco
Folha de S. Paulo
Se desaceleração da economia em 2023 era
prevista, Lula ameaça a retomada futura
Depois do surpreendente desempenho da
economia em 2022, com alta do Produto Interno Bruto próxima a 3%, queda
acentuada do desemprego e expansão da renda, é sabido há muitos meses que
haverá desaceleração neste ano.
As projeções para o PIB do quarto
trimestre, a ser divulgado em março, apontam para uma pequena retração. As
vendas no varejo começaram a cair, e o crédito caro conterá o consumo. Apenas a
agropecuária, que colherá uma safra recorde, deve ter expansão. Tudo somado, a
economia deve crescer menos de 1% em 2023.
É o resultado do esgotamento do impulso da
reabertura pós-pandemia, mais o efeito do necessário combate à inflação pelo
Banco Central. A taxa básica de juros está em muito elevados 13,75% anuais
—descontada a inflação esperada para os próximos 12 meses, são cerca de 8% em
termos reais.
É um patamar contracionista. Seguindo o
curso normal, até recentemente era esperada uma desaceleração material da alta
dos preços, que viabilizaria a convergência da inflação para a meta de 3% no
ano que vem. Nesse quadro, seria possível algum afrouxamento da política
monetária ainda neste ano.
A retomada viria em 2024 e tudo indicava
que podia ser duradoura. Esse prognóstico valia com uma condição —a de que
haveria boas escolhas na política econômica por parte do novo governo.
Entretanto os sinais que se acumulam são péssimos, em especial os que derivam
da conduta temerária de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Com declarações desastradas e acirramento
de confrontos contraproducentes para sua própria gestão, o mandatário não
parece perceber que mina as frágeis expectativas de melhora no médio prazo.
As críticas nada institucionais ao Banco
Central e as ameaças de
retrocesso em reformas e privatizações feitas nos últimos anos
têm enorme impacto na economia, muito além do mercado financeiro —o vilão
preferido do petista.
Lula busca
bodes expiatórios e uma cobertura política para não ser responsabilizado pela
perda de vigor econômico deste ano, mas poderá colher um resultado muito pior,
sem ter a quem culpar depois.
Investimentos começam a ser adiados,
concessões fundamentais para o avanço da infraestrutura atrairão menos
interessados e empréstimos para famílias e empresas serão reduzidos.
Se um 2023 difícil está contratado, o
grande risco para o governo é comprometer as chances melhores que estavam
postas para os anos vindouros.
O presidente deveria fiar-se no apoio
popular do início do mandato para efetuar os ajustes necessários. Fazer o
contrário é elevar o risco de uma recessão em breve.
Educar desde o berço
Folha de S. Paulo
Matrículas em creches aumentam, mas falta
alcançar meta e garantir qualidade
Segundo o Censo Escolar 2022, O número de
matriculas em creches no Brasil aumentou. No ano
passado, foram 3.935.689, o que representa 36% das crianças até 3 anos —alta
de 4% em relação a 2019 e de 5% ante os dois anos da pandemia.
O avanço é contínuo —em 2005 eram apenas
17%. É lento, porém. Ainda estamos distantes da meta do Plano Nacional de
Educação (PNE), que é de 50% em 2024. A matrícula escolar só é obrigatória a
partir dos 4 anos de idade, mas creches desempenham um papel importante não só
na educação.
Uma pesquisa do americano James Heckman,
prêmio Nobel de economia, revelou que pessoas que recebem atendimento
pedagógico entre 0 e 4 anos de idade ficam mais motivadas para os estudos ao
longo da vida e têm mais chances de conseguir emprego.
Isso porque, nesse estágio do
desenvolvimento infantil, o cérebro em formação é capaz de criar conexões
neurológicas que facilitam cognição, aprendizagem, sociabilidade —e que
perduram ao longo da vida. No entanto estar matriculado não é suficiente. O
diferencial está nos estímulos recebidos.
Segundo
especialistas ouvidos pela Folha, a creche no Brasil funciona mais como
serviço de assistência (higiene e alimentação) do que de
educação. O motivo é a escassez de recursos para contratar e capacitar
profissionais, adquirir brinquedos e livros e montar espaços de interação
diversificados.
Por isso, o desafio nacional é duplo:
aumentar o número de vagas e melhorar a qualidade do atendimento. Mesmo assim,
deve-se enfrentá-lo, também para diminuir desigualdades sociais e de gênero.
Como em outras áreas da educação, famílias
com maior poder aquisitivo têm acesso mais fácil a creches de melhor qualidade,
enquanto as pobres aguardam em longas filas por vagas em estabelecimentos
precarizados —problema que impacta ainda mais as mães.
De acordo com pesquisa do IBGE publicada em
2021, apenas
54,6% das mulheres que vivem com crianças de até 3 anos conseguem trabalhar —ante
89,2% dos homens na mesma situação. O percentual sobe para 67,2%, no caso de
mulheres sem crianças nessa faixa etária, e cai para 49,7% quando são negras.
Investir em creches, e na educação infantil
de um modo geral, não apenas melhora a aprendizagem como é um mecanismo que
aumenta a produtividade e reduz desigualdades. Os países desenvolvidos já
aprenderam essa lição.
Presidente pode muito, mas não tudo
O Estado de S. Paulo.
Assim como seu antecessor, Lula considera
que ter vencido as eleições lhe dá poderes extraordinários, e as instituições
que existem para limitá-los são, por isso, tratadas como inimigas
Por tática política ou capricho, o
presidente Lula da Silva transformou o Banco Central (BC) – em particular o
presidente da autarquia, Roberto Campos Neto – no inimigo público número 1 do
crescimento econômico e, consequentemente, do “povo brasileiro”. Lula passou a
liderar uma cruzada contra o BC após o Comitê de Política Monetária (Copom)
decidir, na semana passada, manter a taxa básica de juros em 13,75% ao ano, o
que desagradou ao Palácio do Planalto.
A retórica belicosa de Lula contra o BC,
uma instituição independente do Poder Executivo por força da Constituição,
convém lembrar, assemelha-se muito ao discurso que era adotado por seu
antecessor no cargo, Jair Bolsonaro, para contestar decisões derivadas da
autonomia funcional de instituições que estão fora da esfera de influência direta
da Presidência da República.
Como esquecer, por exemplo, dos ataques de
Bolsonaro à autonomia da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em
alguns dos momentos mais dramáticos da pandemia de covid-19 no País? Como
esquecer também os resultados da desabrida campanha de Bolsonaro contra
instituições como o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral?
Lula e muitos de seus apoiadores podem até
ficar sentidos com a comparação, mas a realidade é implacável: o petista e
Bolsonaro, em que pesem as muitas diferenças que há entre um e outro, convergem
numa incompreensão da legitimidade que lhes foi conferida pela supremacia da
vontade popular para governar o País. Nos ataques de Lula ao BC subjaz essa
irresignação com o fato de que o presidente da República pode muito, mas não
pode tudo.
Durante os últimos quatro anos, Bolsonaro
disse e cometeu os maiores absurdos afirmando que estava apenas fazendo aquilo
que o “povo escolheu nas urnas”. Na abertura da reunião com o Conselho Político
da Coalizão, um grupo formado pelos presidentes dos partidos políticos e outras
lideranças que integram a base de apoio do governo, Lula, a pretexto de justificar
suas críticas ao BC e à política monetária, afirmou que “não tem de pedir
licença para governar” e que o governo tem de “tentar fazer aquilo que foi o
propósito pelo qual ganhamos a eleição”.
Ora, ninguém em sã consciência haveria de
achar que o presidente Lula teria mesmo de “pedir licença” para governar o
País. Uma coisa, no entanto, é ter o direito e mesmo o dever de implementar a
agenda vencedora nas urnas; outra, muitíssimo distinta, é tentar deslegitimar
as instituições que, com ou sem voto popular, são tão democráticas quanto a
Presidência da República e que integram a arquitetura que sustenta a República.
O arranjo institucional estabelecido pela
Constituição de 1988, tão atacado por Bolsonaro não apenas durante seu trevoso
mandato presidencial, mas ao longo de toda sua trajetória de quase três décadas
de vida parlamentar, parece desagradar também ao presidente Lula. Na lógica
lulopetista (e bolsonarista), quando a independência funcional de instituições
como o BC vai de encontro aos interesses do governante de turno, ela é ruim
para o País e tem de ser revista; quando se coaduna com os desígnios do chefe
do Poder Executivo, é boa e deve ser preservada. Ora, não é assim que se opera
em uma República democrática. A Constituição não se molda aos humores de nenhum
governante.
O curioso é que a loquacidade de Lula tem
sido contemporizada por alguns de seus interlocutores mais próximos, assim como
fizeram muitos auxiliares diretos de Bolsonaro por ocasião de suas diatribes.
Enquanto o presidente Lula pressiona o BC e fustiga publicamente Campos Neto,
os ministros da Fazenda, Fernando Haddad; da Casa Civil, Rui Costa; e de
Relações Institucionais, Alexandre Padilha, põem panos quentes e só falta
dizerem que o que Lula fala não deve ser levado a sério. Padilha foi o mais
enfático ao declarar, no dia 8 passado, que o governo “reafirma” não haver
“qualquer discussão” para alterar o status do BC no que concerne à sua
autonomia.
O que pretende Lula, então? Passar os
próximos 22 meses brigando publicamente com Campos Neto para forçá-lo a deixar
o cargo? Ou trabalhar pela construção e aprovação de medidas econômicas que
levem à queda natural e sustentada da taxa de juros no País?
Novos rumos para a novela do Brexit
O Estado de S. Paulo.
Britânicos começam a se dar conta dos ônus
do Brexit e muitos acalentam o sonho de voltar à UE. Sendo ou não possível,
todos ganham com um processo realista de pacificação
Além das motivações mais abstratas,
culturais e emocionais da maioria de britânicos que votaram pela saída do Reino
Unido da União Europeia (UE) em 2016, como se libertar do “super-Estado
europeu” comandado pela “tecnocracia globalista de Bruxelas”, a expectativa era
de mais controle sobre a imigração, menos impostos, mais subsídios à indústria
local, menos regulação e melhores serviços públicos. Mas poucos casos ilustram
mais redondamente a metáfora do “tiro no pé” que o Brexit.
Seis anos depois, e dois após o retorno das
barreiras comerciais com a UE, o Reino Unido é a única economia desenvolvida
que não recuperou seu tamanho após a covid, e o FMI prevê que ela terá o pior
desempenho em 2023. O Brexit não é a única causa do mal-estar, mas ele agrava
as outras. Modelagens do Centro para a Reforma Europeia e da Secretaria para a
Responsabilidade Orçamentária sugerem que sem ele a economia estaria até 6%
maior. Além disso, os investimentos teriam crescido 11%; o comércio, 7%; e a
produtividade, 4%, enquanto os alimentos teriam ficado 6% mais baratos. Acordos
com países fora da UE, seu maior parceiro comercial, não supriram as perdas.
Para compensá-las, mantendo o padrão de seguridade social europeu ao qual os
britânicos se acostumaram, foi preciso aumentar impostos.
A imigração segue alta. A diferença é que os
imigrantes da UE, que em 2016 eram metade do total, hoje são um quinto, e foram
substituídos por outros com menos afinidades culturais e qualificação.
O mercado comum europeu eliminara os
controles alfandegários entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda, mas
o Brexit ameaça restabelecêlos, prejudicando a paz na região. Após a “guerra
civil” política do Brexit, o Reino Unido já teve cinco premiês – os cinco
anteriores se distribuíram em 31 anos. Não surpreende que só 28% dos britânicos
acreditem que a vida melhorará em 2023, nem que a confiança no governo tenha
despencado.
Pode esse reverso da fortuna ser
interrompido? Para o articulista do Financial Times Gideon Rachman, sim. Hoje,
quase 60% dos britânicos creem que a saída foi um erro e votariam para se
reunir à UE. A demografia está a seu favor: 79% dos jovens são pela reunião.
“Em algum momento, os políticos precisarão responder – e a ideia de retornar à
UE se tornará o mainstream”, escreveu Rachman. Uma plausível maioria
trabalhista após as eleições de 2026 facilitaria o processo. Mas Rachman não
ignora as dificuldades: a UE pode resistir à volta desse parceiro recalcitrante
e ela traria custos: a integração teria de ser mais profunda, incluindo
compromissos com o euro, o orçamento europeu e o livre fluxo de pessoas.
A concretização desse ideal, factível ou
não, depende de um pragmatismo realista que desde já estabilizaria a relação
entre o Reino Unido e a UE. Muitas das frustrações dos favoráveis e dos
contrários ao Brexit resultaram da recusa em aceitar os ônus da saída ou da
permanência, um estado de espírito ilustrado pelo “bolismo” (cakeism) – “ter o
bolo e comê-lo” – do ex-premiê Boris Johnson, que levou à opção por um Brexit
duro, sem concessões. O momento pede flexibilidade.
Certas medidas encontrarão resistência dos
nativistas, como o alinhamento com regulamentos europeus supervisionados pela
Corte europeia, mas as evidências dos danos comerciais do Brexit podem
aliviá-la. Resolver as disputas comerciais com a República da Irlanda seria um passo
importante, assim como retomar a participação em programas comuns estudantis e
científicos. Mais relevante, brexiteers e remainers terão de renunciar ao
dogmatismo e ao voluntarismo que excitam uma polarização tóxica. “Tomar esse
caminho exigirá o fim do pensamento mágico”, comentou a revista britânica The
Economist. “Será um processo lento e incremental, não impulsivo e
revolucionário. Isso significará nutrir a confiança e o consenso, ao invés de
sustentar referendos do tipo ‘o vencedor leva tudo’ e impor ultimatos a
Bruxelas.”
Em resumo, se as partes divorciadas
reconstruírem a amizade, há uma chance de voltarem a se casar com laços mais
firmes. Mas, independentemente desse desfecho, desde já, todos ganham com o
processo de pacificação.
Infância longe da pré-escola
O Estado de S. Paulo.
Brasil tem o dever de assegurar o direito à
educação das crianças de 4 e 5 anos
O início de mais um ano letivo renova o
desafio para que o País consiga universalizar por completo o acesso à educação
básica. Apesar de enormes avanços nas últimas décadas, 1 milhão de crianças e
adolescentes permanecem fora da escola. Vale notar que essa exclusão atinge
principalmente a população em idade pré-escolar, na faixa de 4 a 5 anos − fase
em que o cérebro está em plena formação. O recém-lançado Censo Escolar de 2022
mostra que 512 mil crianças nessa faixa etária estavam longe das salas de aula
no ano passado. Uma lástima e um alerta para que as redes de ensino adotem ou
reforcem estratégias de busca ativa.
A meta de universalização do atendimento
das crianças de 4 e 5 anos foi incluída no Plano Nacional de Educação (PNE) e deveria
ter sido atingida em 2016. De acordo com estimativa do Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), no entanto, a parcela
de crianças sem frequentar a pré-escola girava em torno de 8% no ano passado,
índice bem maior que o verificado no ensino fundamental (0,3%). Vale lembrar
que o PNE é lei e que a própria Constituição prevê o atendimento escolar
obrigatório a partir dos 4 anos de idade. No Brasil, não raro, nem isso basta
para garantir a efetivação de direitos.
Recente estudo elaborado pela Fundação
Maria Cecilia Souto Vidigal − Desigualdades na garantia do direito à pré-escola
− chamou a atenção para a diminuição de matrículas durante a pandemia de
covid19 e como isso afetou ainda mais as crianças de famílias de baixa renda,
pretas, pardas e indígenas. Os novos dados do Censo Escolar, felizmente,
revelam que essa tendência foi estancada em 2022. Uma boa notícia. Mas o País
tem muito a avançar rumo à universalização.
Pesquisas em diferentes países já
constataram a contribuição da pré-escola para o desenvolvimento cognitivo e
emocional, com reflexos na vida adulta. Brincadeiras e atividades na pré-escola
facilitam a alfabetização na idade certa, passo decisivo para as demais
aprendizagens no ensino fundamental e médio. Quem é privado desse tipo de
experiência na infância tende a enfrentar mais dificuldades. O relatório da
Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal diz isso claramente: “Crianças que
frequentam a pré-escola têm mais chances de terminarem a educação básica e maiores
taxas de empregabilidade, bem como níveis mais altos de escolarização durante a
vida adulta.”
O estudo foi elaborado com apoio do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime). As duas organizações estão à frente de iniciativas de busca ativa para tentar reduzir o contingente de crianças longe das salas de aula. A educação infantil é responsabilidade das prefeituras, mas esse esforço deve mobilizar também os governos estaduais e o governo federal, além da Justiça, dos conselhos tutelares e das famílias em todo o País. Cada criança matriculada é uma chance a mais de um futuro melhor.
O Globo
ResponderExcluir"Parece evidente que a saída de cena de Bolsonaro provocou reação imediata das potências ocidentais, dando a oportunidade para Lula cumprir uma de suas promessas de campanha: retirar do Brasil a pecha de pária."
É evidente! Bom pro mundo, bom pro Brasil!
O Globo
ResponderExcluir"Noutro sinal de boa vontade, o governo americano incluiu no comunicado conjunto apoio à ampliação do Conselho de Segurança da ONU, antiga demanda de governos petistas."
Fantástico! Excelente!
Estadão
ResponderExcluir"A retórica belicosa de Lula contra o BC, uma instituição independente do Poder Executivo por força da Constituição,..."
Elaborar um editorial com base num pressuposto falso depõe contra a imprensa.
Campos Neto não cumpriu suas obrigações exatamente porque NÃO foi independente.
A belicosidade, por outro lado, fica por conta da subjetividade do editorialista.