quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

Vinicius Torres Freire - Lula dá murro na faca dos juros

Folha de S. Paulo

Sem plano real de mudança, na prática presidente piora economia com suas críticas

Faz três meses, Luiz Inácio Lula da Silva está em campanha contra a política econômica convencional. O resultado prático dos discursos de palanque é evidentemente negativo.

Para ficar nas evidências mais elementares e gritantes, as taxas de juros subiram e o real continua desvalorizado além da conta, um empecilho também para a queda da inflação. Esse aperto de condições financeiras começa a ameaçar o crescimento da economia também em 2024.

Por que o presidente age assim? Lula poderia ter um projeto de mudança. Isso quer dizer propor novas instituições e métodos de política macroeconômica, por exemplo (gastos, dívida, inflação, Banco Central). Os governos do PT jamais apresentaram tal projeto, em 13 anos e meio no poder ou nos 6 anos e meio fora dele, quando criticavam o "rentismo", o "austericídio" e o "neoliberalismo". Particularmente sob Dilma Rousseff 1, a política convencional de controle de déficit e dívida e de metas de inflação foi avacalhada —não houve mudança institucional ou de método.

Partidários do presidente dizem que não se pode julgar a política econômica pelos discursos dele, pois tal política ainda estaria em elaboração. Que seja. Ouvindo discursos do que pode ser tal política, quem tem dinheiro e haveres em geral se protege, cobrando juros maiores e mantendo menos ativos em reais (o dólar sobe ou não cai tanto).

Pelos discursos de Lula até agora, parece que o presidente acredita que algumas gambiarras (avacalhação de políticas, técnicas, métodos, não mudança de fato) bastam para reeditar o "milagre do crescimento". Isto é: um pouco mais de inflação (aumentar a meta). Ou obrigar o Banco Central a "conversar" (baixar a Selic). Fazer o BNDES emprestar mais, a juro de pai para filho, para se "contrapor" ao BC. Ter mais gente sua em comando de estatais, até revertendo a privatização (de fato porca) da Eletrobras.

É razoável discutir se tal ou qual Selic contém a inflação ou o nível da meta de inflação ou tipo de teto de gastos mais adequado. A avacalhação dessas políticas ou as alternativas confusas ou simplórias sugeridas nos discursos de Lula apenas têm resultado e resultarão em menos crescimento.

Um exemplo de debate não vai caber nestas colunas hoje, mas há possibilidades. Um caso interessante é o dos Estados Unidos (e a Europa irá a reboque) projetando pesados subsídios, entre outras medidas, para a "transição tecnológica verde", mas não apenas. Em matéria de heterodoxias, aliás, os EUA têm caprichado desde o grande desastre de 2008. Mas essa é uma conversa séria ou, talvez, para quem pode.

Nosso problema aqui e agora é o de avacalhação ou de propostas grandiosas, por ora com pés de barro, como o Banco Central controlar as taxas de juros de todos os prazos (não apenas a de curtíssimo prazo, como a Selic), de ignorar que a dívida pública recomeçará a crescer sem limite neste ano ou mesmo de gastar (endividar-se) à vontade, imaginando que, mesmo assim, se possa pagar a taxa de juros que se quiser, com a taxa de câmbio que se quiser, talvez controlando tudo isso na marra ou com grande inflação (nunca deu certo, afora em situações de imensa guerra e por pouco tempo), como sugerem novos companheiro de viagem do PT.

Lula faz tudo isso de propósito? Quer jogar a conta do baixo crescimento deste ano em outrem? Não precisava fazer tal esforço, deletério. Não tem noção do estrago que está causando? Acredita que gambiarras vão colocar o país para crescer? Em delírio de grandeza, está descolado da realidade, sem ninguém no seu entorno para dizer o tamanho do problema que provoca com esses murros em faca?

É uma dúvida e um espanto.

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