O Estado de S. Paulo
A razão de existência do Centrão é a captura de partes da máquina estatal
O Centrão é o principal fiador hoje do
experimento brasileiro do semipresidencialismo com dois primeiros-ministros (os
chefes das Casas Legislativas), que formalmente se instalou mais uma vez desde
ontem. Os avanços dos poderes do Legislativo sobre o Executivo, que se
aceleraram ao longo de quase uma década, são apenas parte da explicação.
Os fatores “estruturais” são mais amplos e têm a ver com a falência dos partidos (no sentido que lhes deu a Constituição) e de um sistema de votação proporcional que garante a desproporção. O Centrão é um amálgama de organizações privadas (apelidadas de partidos) cuja razão de existência é a captura de partes da máquina estatal transformadas em ferramentas para defesa de seus interesses.
Para efeitos práticos, o apertado resultado
da eleição presidencial do ano passado fortaleceu esse formidável bloco
abastecido constantemente com o que já não se pode mais chamar de “moeda de
troca”. Na verdade, essa incessante atividade é a essência da nossa política,
conduzida por um conjunto de líderes partidários de escassa projeção nacional e
interesses nacionais, mas forte peso regional.
Para Lula e o PT, é uma situação difícil e
preocupante. Não tanto pelas amarras impostas ao chefe do Executivo, apesar de
a distribuição de cargos estratégicos ter ido para petistas.
Nem pela necessidade de articular uma
“maioria de governabilidade”, o mais fácil de ser obtido.
O problema central é interpretar a forte
oposição social que os resultados das eleições, sobretudo no Legislativo, não
diminuíram. É o que ajuda a entender a relativa rapidez com que estão se
dissipando os efeitos traumáticos da barbárie do 8 de janeiro – e que permite a
dirigentes de várias agremiações, todas no Centrão, “justificar” (claro, sem
justificar) o que aconteceu.
Nem Lula nem o PT estão conseguindo
transformar o trauma de janeiro numa onda que sirva para encurralar o
adversário político e solidificar uma “liderança” de amplas forças que
genuinamente abominam os atos golpistas. Essa dificuldade é resultado, em
parte, da leitura feita pelo novo presidente e seu velho estado-maior de que a
vitória eleitoral lhes deu a condição de “levar tudo”.
Parecem estar assumindo que, mesmo com a
força do Centrão, detêm mais poder político do que de fato possuem. Calcula-se
também que provável inelegibilidade de Bolsonaro o neutralize
“definitivamente”. Embora o que talvez melhor explique a resiliência de um
personagem com defeitos tão evidentes como os de Bolsonaro é o que tem sido tão
difícil de reconhecer e aceitar para Lula e o PT: a oposição social que
enfrentam.
Verdade,devo reconhecer.
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