sexta-feira, 24 de março de 2023

Celso Ming - Crise bancária à velocidade da luz

O Estado de S. Paulo

Os bancos têm de lidar com explosivos, como os especialistas das Forças Armadas. É da natureza de sua atividade conviver com perigoso descasamento entre ativo e passivo.

No caso dos depósitos em conta corrente, devem à vista, mas são credores a prazo. A qualquer momento o correntista pode sacar seu dinheiro que pode não estar lá, porque foi reemprestado e tem prazo para voltar. É o que levou o analista Martin Wolf, do Financial Times, a abrir sua coluna desta terça-feira, 21, com a afirmação duramente realista: “Os bancos são projetados para falir”.

Isso é assim desde que há bancos, e eles existem desde a Antiguidade. Na Parábola dos Talentos – e isso tem 2 mil anos –, Jesus advertiu o servo que fracassou na administração do talento que lhe foi entregue de que deveria, ao menos, tê-lo confiado aos banqueiros para garantir retorno com juros (Mateus 25,14-30).

Mas há uma novidade que adicionou mais pólvora à atividade já perigosa dos bancos. É a possibilidade de saques à velocidade da luz. Nos velhos tempos, a transferência de depósitos era uma epopeia. O ouro ou metais preciosos exigiam logística complicada para armazenamento e transporte. Mesmo recentemente, saques com cheques eram submetidos a processo de compensação e levavam certo tempo para ser concluídos. Hoje, um clique transfere dezenas de bilhões em tempo real.

O Silicon Valley Bank (SVB) quebrou porque seus correntistas sacaram US$ 42 bilhões em um único dia. Dias depois, autoridades americanas fecharam o Signature Bank por “risco sistêmico”. Na reta final em direção ao naufrágio, o Credit Suisse sangrou US$ 11 bilhões por dia. Na última quarta-feira, a secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen, declarou prostrada: “Nunca vimos depósitos fugirem (dos bancos) no ritmo que ocorreu no SVB”.

A questão aqui não é de administração perdulária ou de fraude, embora não descartável. É apenas a da altíssima velocidade proporcionada pelo Pix e pelos aplicativos acionados via computador ou smartphone.

Os mecanismos convencionais de segurança, baseados no recolhimento compulsório e nas exigências de capital determinados pelo Acordo de Basileia, já não são suficientes para blindar os bancos de movimentos de pânico e de corridas aos saques. O SVB quebrou, embora seus ativos fossem pesadamente compostos pelo título mais seguro do mundo, o do Tesouro dos Estados Unidos.

Também na quarta-feira, Jerome Powell, presidente do Fed, o banco central dos Estados Unidos, avisou: “Precisamos melhorar a regulação”. O potencial de crise sistêmica se multiplicou. Uma das consequências funestas é a de que, em todo o mundo, os bancos pisaram no freio do crédito e isso empurra para a recessão.

O que fazer para desarmar a bomba é exaustiva discussão já em curso, mas que terá de ser breve porque a situação é de emergência e o estrago que pode ser produzido pela velocidade das engenhocas eletrônicas é incomensurável.

 

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