O Estado de S. Paulo
Os bancos têm de lidar com explosivos, como
os especialistas das Forças Armadas. É da natureza de sua atividade conviver
com perigoso descasamento entre ativo e passivo.
No caso dos depósitos em conta corrente,
devem à vista, mas são credores a prazo. A qualquer momento o correntista pode
sacar seu dinheiro que pode não estar lá, porque foi reemprestado e tem prazo
para voltar. É o que levou o analista Martin Wolf, do Financial Times, a abrir
sua coluna desta terça-feira, 21, com a afirmação duramente realista: “Os
bancos são projetados para falir”.
Isso é assim desde que há bancos, e eles
existem desde a Antiguidade. Na Parábola dos Talentos – e isso tem 2 mil anos
–, Jesus advertiu o servo que fracassou na administração do talento que lhe foi
entregue de que deveria, ao menos, tê-lo confiado aos banqueiros para garantir
retorno com juros (Mateus 25,14-30).
Mas há uma novidade que adicionou mais pólvora à atividade já perigosa dos bancos. É a possibilidade de saques à velocidade da luz. Nos velhos tempos, a transferência de depósitos era uma epopeia. O ouro ou metais preciosos exigiam logística complicada para armazenamento e transporte. Mesmo recentemente, saques com cheques eram submetidos a processo de compensação e levavam certo tempo para ser concluídos. Hoje, um clique transfere dezenas de bilhões em tempo real.
O Silicon Valley Bank (SVB) quebrou porque
seus correntistas sacaram US$ 42 bilhões em um único dia. Dias depois,
autoridades americanas fecharam o Signature Bank por “risco sistêmico”. Na reta
final em direção ao naufrágio, o Credit Suisse sangrou US$ 11 bilhões por dia.
Na última quarta-feira, a secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet
Yellen, declarou prostrada: “Nunca vimos depósitos fugirem (dos bancos) no
ritmo que ocorreu no SVB”.
A questão aqui não é de administração
perdulária ou de fraude, embora não descartável. É apenas a da altíssima
velocidade proporcionada pelo Pix e pelos aplicativos acionados via computador
ou smartphone.
Os mecanismos convencionais de segurança,
baseados no recolhimento compulsório e nas exigências de capital determinados
pelo Acordo de Basileia, já não são suficientes para blindar os bancos de
movimentos de pânico e de corridas aos saques. O SVB quebrou, embora seus
ativos fossem pesadamente compostos pelo título mais seguro do mundo, o do
Tesouro dos Estados Unidos.
Também na quarta-feira, Jerome Powell,
presidente do Fed, o banco central dos Estados Unidos, avisou: “Precisamos
melhorar a regulação”. O potencial de crise sistêmica se multiplicou. Uma das
consequências funestas é a de que, em todo o mundo, os bancos pisaram no freio
do crédito e isso empurra para a recessão.
O que fazer para desarmar a bomba é
exaustiva discussão já em curso, mas que terá de ser breve porque a situação é
de emergência e o estrago que pode ser produzido pela velocidade das engenhocas
eletrônicas é incomensurável.
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