Correio Braziliense
Quando Lula se propõe à formação de um clube de
países para negociar a paz entre a Rússia e a Ucrânia, põe em risco suas boas
relações com Joe Biden
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva
adiou a viagem para a China, que faria com uma comitiva de 200 empresários e
uma delegação parlamentar da qual fazia parte o presidente do Congresso,
Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Na lógica geopolítica do chamado “Sul global”, as
relações com presidente Xi Jinping são as mais importantes para a diplomacia
brasileira, porém, qualquer aproximação que possa ser interpretada como uma
aliança principal podem estremecer as relações do Brasil com os Estados Unidos,
cujo apoio foi decisivo para respaldar a eleição de Lula, garantir sua posse e
frustrar a tentativa de golpe de estado de 8 de janeiro. O adiamento é uma
oportunidade de refletir sobre seus objetivos.
O Brasil está entre dois polos de atração da geopolítica global. A China hoje é o nosso principal parceiro comercial, para o qual exportamos algo em torno de US$ 88 bilhões, enquanto importamos US$ 47 bilhões, com um superávit da balança comercial de US$ 41 bilhões. Em contrapartida, importamos US$ 39 bilhões dos Estados Unidos, para os quais exportamos US$ 31 bilhões, um déficit comercial de US$ 8 bilhões. Ocorre que o valor agregado de nossas exportações para a China é muito baixo, enquanto os produtos chineses estão matando a indústria nacional, que perdeu também seu mercado para os chineses na América do Sul.
É preciso levar em conta o contexto em que
isso ocorre. O eixo do comércio mundial se deslocou do Atlântico para o
Pacífico. Nossa infraestrutura foi montada originalmente em conexão com a
Europa e os Estados Unidos; agora, está sendo lentamente convertida para se
integrar ao Pacífico, mas a barreira dos Andes encarece os custos logísticos.
Até 2007, o Brasil acompanhou o boom da demanda mundial, na esteira da
desvalorização cambial. A partir da crise de 2008, a indústria brasileira
sucumbiu à concorrência internacional, aos aumentos de custo de produção em
reais (principalmente salários) e à forte apreciação do câmbio nominal e real.
A expansão do PIB observada no pós-2008 foi
toda baseada em serviços não sofisticados e na construção civil (quadro típico
de doença holandesa). A demanda por bens industriais foi totalmente suprida por
importações. Houve enorme perda de complexidade produtiva. A produtividade da
economia caiu e continuará caindo, ate que as manufaturas domésticas se
recuperem. A desvalorização cambial de 2015 não produziu a reconstrução do
setor de bens com maior valor agregado.
A tentativa de adensar as cadeias
produtivas, verticalizando-as em vez de integrá-las de forma complementar às
cadeias globais de valor, provocou a perda de produtividade e competitividade
da nossa indústria. Nos últimos 20 anos, os produtos minerais e agropecuários
ultrapassaram em três vezes o valor das exportações de bens de baixa, média e
alta complexidades. A principal causa é o comércio com a China, que triplicou o
valor de nossas exportações, mas confinou o Brasil à vocação natural de
exportador de minérios e produtos agrícolas na nova divisão internacional do
trabalho.
Guerra fria
A expansão do comércio com a China é
global. Seu principal parceiro comercial são os Estados Unidos, que exportaram
tecnologia e empregos para a potência asiática, da qual passaram a importar
toda sorte de produtos, desde os mais primários aos eletrônicos de última
geração e redes sociais. A perda contínua de mercado para os chineses,
inclusive no seu próprio mercado interno, provocou a reação política e militar
dos Estados Unidos contra a expansão da influência chinesa no mundo.
Esse cenário havia sido previsto por Henry
Kissinger, o negociador do restabelecimento das relações entre os dois países
durante o governo Nixon, no seu livro Sobre a China (Objetiva), cujo final é
muito perturbador. O ex-secretário de Estado norte-americano assinala que o
século passado foi pautado por uma disputa pelo controle do comércio no
Atlântico entre uma potência continental, a Alemanha, e uma potência marítima,
a Inglaterra, que provocou duas guerras mundiais. Segundo ele, com a mudança de
eixo do comércio para o Pacífico, essa disputa está se repetindo, neste século,
entre os Estados Unidos, uma grande potencia marítima, e a China, a potência
continental emergente. Como isso se resolverá?
O mundo unipolar liderado pelos Estados
Unidos após a dissolução da União Soviética, cujo auge foi o período entre as
guerras da Sérvia (Balcãs) e do Iraque (Oriente Médio), deixou de existir com a
emergência da China. Entretanto, o que está surgindo não é um mundo multipolar,
como vinha se desenhando, com o fortalecimento da Alemanha e da França na União
Europeia e a formação dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul).
Com a brutal invasão da Ucrânia pela Rússia, em resposta à expansão da
Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), instalou-se no mundo um novo
clima de “guerra fria”. A ocupação de parte do território ucraniano se tornou o
palco de uma “guerra por procuração” entre a Otan e a Rússia.
Quando Lula propõe a formação de um clube
de países não envolvidos na guerra para negociar a paz entre a Rússia e a
Ucrânia, para o qual pleiteia o apoio do presidente chinês Xi Jinping, põe em
risco suas excelentes relações com o presidente Joe Biden. A Ucrânia não quer
um cessar-fogo com os russos ocupando a região de Donbass nem os russos aceitam
sair com a Otan na sua fronteira. A Rússia e a China formaram uma aliança
euro-asiática, de caráter autoritário, que se contrapõe à hegemonia
norte-americana. De dimensões continentais, o Brasil é uma democracia emergente
do Ocidente. Em termos geopolíticos, seria um equivoco envolver o Atlântico Sul
nessa disputa, não apenas por razões comerciais, porque isso tornaria
inevitável a sua militarização pelas potências do Ocidente, numa conjuntura de
“guerra fria”.
Boa relação: ser serviçal e atender aos desígnios unilaterais yanke. Daí quando defendem a soberania da Ucrania frente a Russia e etc gritam com toda a força dos pulmões, mas quando o Brasil exerce de sua soberania para receber navios iranianos ou procurar melhores negócios independente com que seja, vem o pessoal do, "Olha, temos que pensar que os EUA são nossos vizinhos" temos de escutá-los e etc. Bando de articulista safado!
ResponderExcluirAmizade com esse país assassino é motivo de vergonha na cara e não político.
ExcluirEsse é a primeira análise sobre o momento geopolítico global que vejo publicada na grande mídia tratando essas questões de forma sintética, realista e precisa, sem concessão à guerra de propaganda e manipulação. Parabéns Azedo!
ResponderExcluirBrasileiros parecem não ligar ao fato do embaixador chinês considera-los inferiores aos chineses, incapazes e preguiçosos que vivem o ano inteiro para a alegria do Carnaval. Pelo menos brasileiros não comem morcegos e outras coisas eu lembraria.
ResponderExcluirE foi justamente por causa da Indústria que ele disse que o brasileiro é incompetente para desenvolvê-la.
ResponderExcluirEsse cara é maluco: "Quando Lula propõe a formação de um clube de países não envolvidos na guerra para negociar a paz entre a Rússia e a Ucrânia, para o qual pleiteia o apoio do presidente chinês Xi Jinping". Xi Jinping já foi na Rússia sozinho e não precisa de apoio do Bananão. Bananão continua anão diplomático , querido, em que mundo vc vive que o Mulambo Ladrão vai dar ideia para o líder chinês? Kkkkk cala a boca e produz farelo e óleo de soja aí pros chineses, bando de tupiniquim.
ResponderExcluirKissinger sabia de tudo
ResponderExcluirXi Jinping já foi na Rússia sozinho e nada mudou em relação à guerra. O líder chinês é poderoso, mas nada conseguiu avançar para acabar com a guerra. Lula pode conseguir uma convergência maior de países importantes que não estejam já diretamente envolvidos. Pode não dar certo, mas acho que ele deve tentar, sim, independente do que pensem os bolsonaristas ou outros incompetentes como Magnoli.
ResponderExcluirAzedo sabe das coisas.
ResponderExcluir