O Globo
Nova regras fiscal incluirá um limite de
despesas, e não vai prever gastos fora da regra fiscal, seja social ou
investimentos
O arcabouço fiscal vai ter uma regra de
limite de gastos, e não haverá despesas fora do teto. O que se pretende é ter
um mecanismo que respeite qualquer escolha da sociedade no futuro. Ou seja, se
houver um governo de centro, ou até de direita, que a administração pública
possa conviver com a regra. Bastará apenas ajustar os parâmetros para o novo
projeto. Pode parecer teórico, mas a ideia da equipe econômica é separar o que
é conceito e o que são os parâmetros. Como se fosse assim: o conceito fica, os
parâmetros podem mudar.
A proposta de não criar qualquer exceção, seja para gastos sociais, seja para investimentos, pode gerar um grande ruído no governo ou no Partido dos Trabalhadores. Mas era muito arriscado deixar algumas despesas fora de qualquer controle.
Os economistas do governo, ao preparar o
novo arcabouço fiscal, tiveram em mente três fatores: evitar os erros do
passado, ver o que o mundo tem discutido e ter no horizonte alguns problemas
que estão contratados. A transição climática exigirá mais despesas e
investimentos, o envelhecimento da população obrigará o país a repensar o
sistema de proteção social, as mudanças do mercado de trabalho também criam
novos desafios. Haverá naturalmente mais pressão por gastos.
Decidiram também que o instrumento terá que
ser anticíclico. Querem evitar o erro da política de superávits primários que,
no período de crescimento da arrecadação, permitia aumento de despesas e, no
tempo recessivo, com queda de receita, exigia corte em despesas, aprofundando a
crise.
O teto de gastos, na visão desses
economistas, tinha o defeito de impor a diminuição do tamanho do estado na
economia qualquer que fosse o contexto social, político e econômico.
— Como a despesa só podia ser corrigida
pelo IPCA, o gasto público tinha que perder peso perante o PIB. E como era uma
emenda constitucional, foi colocado dentro do IPCA o projeto de país – explicou
uma fonte do governo.
Não seria mesmo possível seguir o teto de
gastos, ainda que quisessem, porque ele foi alterado tantas vezes que ficou
imprestável como instrumento de coordenação das expectativas. Certa vez, o governo
Bolsonaro mudou a data do indexador das despesas apenas para ter o que chamou
na época de “folga fiscal”. Estava criando espaços mirabolantes nas despesas
para políticas eleitoreiras. Bolsonaro demoliu o teto.
Inicialmente, quando foi aprovado o Teto de
Gastos, a ideia era de reduzir o tamanho do estado no PIB, levando-se em conta
que, nos anos anteriores, as despesas tinham crescido muito como proporção do
PIB. Os formuladores do teto diziam que isso obrigaria o país a fazer escolhas
dado que o limite era rígido. O país fez escolhas. As erradas. As despesas
defendidas por lobistas cresceram ou foram mantidas. Houve uma compressão
insustentável da folha de pessoal, com o congelamento dos salários dos
servidores, que representou uma pedalada, o reajuste foi jogado para o governo
seguinte. Gastos obrigatórios cresceram levando investimentos a quase zero. O
teto tinha defeitos como regra fiscal, mas o pior é que foi mal usado e, por
fim, desmoralizado.
Se o novo arcabouço fiscal vai conseguir
fazer tudo a que se propõe é cedo para dizer. Uma grande vantagem será o fato
de que esse novo limite de receita será apresentado por lei complementar, que é
mais fácil aprovar no Congresso. Para quem pensa que isso tirará força da regra
fiscal, basta lembrar que a Lei de Responsabilidade Fiscal também não foi
emenda constitucional.
O ministro Fernando Haddad mostrou o
projeto para alguns ministros e o presidente Lula. Agora terá que levá-lo aos
presidentes da Câmara e do Senado. Depois, seguirá o debate. O presidente Lula
disse, na última sexta-feira, que “se a gente não tiver dinheiro, a gente vai
atrás e Haddad vai ter que arrumar”. Na mesma ocasião, havia dito que “não
podemos ficar chorando o dinheiro que falta, temos que utilizar bem o dinheiro
que a gente tem”. Sinais que podem ser entendidos nas duas direções.
O cronograma que o Ministério da Fazenda
estabeleceu é muito apertado. Quer que a Lei de Diretrizes Orçamentárias já
seja formulada dentro do novo arcabouço. A LDO vai em abril ao Congresso. Muito
pouco tempo para um debate que vai definir o rumo do terceiro governo Lula.
Lendo e aprendendo.
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