O Globo
BC decide juros sem ver mudanças na
conjuntura, críticos no BNDES atacam juros sem apontar medidas para equilíbrio
fiscal
No tempo das polarizações, a política
monetária também está entre extremos. De um lado, o BC mantém juros em 13,75% e
não dá sinal de que vá reduzi-los nesta reunião, apesar das mudanças fortes que
ocorreram na conjuntura. De outro lado, a visão defendida ontem no BNDES é que
a dívida pública brasileira é baixa, que os juros não combatem a inflação, mas
são em si inflacionários. Não houve pluralismo no seminário do BNDES, os
economistas internacionais, Joseph Stiglitz e James Galbraith, são conhecidos
defensores do expansionismo fiscal e críticos do que eles definem como
neoliberalismo.
A dívida pública brasileira é alta ou baixa? No mercado, o que se fala é que a dívida é alta e sua trajetória, explosiva. Hoje está em 73% do PIB, pelas contas do BC. Isso é dívida bruta. No BNDES, falou-se em dívida líquida de 56%, quando se desconta as reservas cambiais, ou de 45%, quando se deduz também o caixa do Tesouro.
O presidente da Fiesp, Josué Gomes da
Silva, chamou os juros de pornográficos e pediu as mesmas condições da
agricultura que tem, segundo ele, um subsídio de R$ 13 bilhões.
–Nos ofereçam as mesmas condições do agro
que teremos uma indústria pop, tech, tudo.
O vice-presidente Geraldo Alckmin também
ajudou a malhar os juros.
– Não há nada que justifique ter 8% de juros real, acima da inflação, quando não há demanda explodindo e quando o mundo inteiro tem juros negativos.
Ao resumir o que Stiglitz e Galbraith
falaram, o economista André Lara Resende foi contundente.
– Taxas de juros excessivamente altas são
injustificáveis, tanto no combate ao déficit público, quanto no combate a uma
inflação que não é de demanda. Também pode ser contraproducente e ter efeitos
perversos contrários ao que se pretende. Podem agravar a inflação, aumentar o
déficit público, piorar a relação dívida/PIB e inviabilizar o crescimento
econômico. Têm, adicionalmente, efeitos distributivos perversos. Então, estamos
de pleno acordo que juros excessivamente altos são uma política profundamente
equivocada.
Bombardeado no BNDES, o Banco Central se
reúne hoje para decidir para onde vão as taxas. Quando a Selic subiu para 13,75%,
em agosto de 2022, a inflação estava em 10%. Cairia naquele agosto para 8,7%,
por força da retirada dos impostos sobre os combustíveis. De lá para cá muita
coisa mudou. Há um novo governo, a inflação caiu para 5,6%, foram anunciadas
medidas para reduzir o déficit público, a economia desacelerou e o mundo entrou
numa turbulência bancária. Tudo recomendaria uma redução das taxas. Mas o BC
não parece ir nessa direção e os bancos projetam o começo da queda apenas para
setembro.
No BNDES, criticou-se também a autonomia do
Banco Central. Segundo André, o BC pode ter autonomia, mas não pode ser o
quarto poder. Outro consenso do seminário do banco foi o de que é fundamental
ter uma política industrial. Falou-se que isso é necessário para financiar a
transição energética e a descarbonização da indústria. Mas ninguém entrou em
detalhes. Ficou parecendo o novo argumento para repetir o velho subsídio à
indústria.
Enquanto o ministro Fernando Haddad, em
Brasília, circulava entre políticos mostrando a nova regra fiscal, o secretário
de política econômica do Ministério da Fazenda, Guilherme Mello, explicou sua
visão fiscal.
– Qual é o papel da política fiscal dentro
da política macroeconômica? Garantir recursos para viabilizar as políticas
públicas que promovam o desenvolvimento. Uma política fiscal que impede o
financiamento adequado das políticas públicas e portanto inviabiliza a
construção das condições para a redução da desigualdade, para o aumento do
investimento, para inovação, essa não é uma política fiscal que dialoga com o
desenvolvimento.
Mello mostrou uma visão parcial da história
econômica recente.
– Alguém aqui se esquece que no início do
governo Lula, o PIB potencial do Brasil era visto como baixíssimo? Ao final do
governo Lula a gente conseguia crescer a mais de 3% ou 4% ao ano. Isso foi
fruto de um trabalho de oito anos, de mudança na abordagem da política
econômica, social e de políticas públicas.
Faltou contar que, no governo Dilma, o
ritmo caiu e, no segundo mandato, a inflação foi a dois dígitos e o PIB
despencou 3,5%.
É necessário haver uma terceira via entre a
política de gastos sem restrições e a política monetária prisioneira de um
dogma indiferente às mudanças do cenário econômico.
Míriam Leitão entende do riscado.
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