O Estado de S. Paulo
Ainda sem explicar como cuidará das contas públicas, o presidente retoma o padrão da companheira Rousseff ao pretender dar ordens ao BC
Uma nova etapa de crescimento, emprego e
prosperidade vai começar depois de cem dias de mandato, prometeu o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva, até agora mais ocupado em falar, reacender conflitos
e tentar recompor programas abandonados ou degradados, como o Mais Médicos e o
Bolsa Família. Declarou superados os livros de Economia e defendeu a criação de
“uma nova mentalidade sobre a razão de a gente governar”, mas sem apresentar um
plano de governo e um esquema de sustentação das contas públicas. Além disso, o
presidente nem sequer explicou essa “nova mentalidade”, contentando-se com a
defesa de alguns tipos de gastos, como aqueles destinados à área da saúde. Mas
foi adiante e, confirmando o desprezo aos livros de Economia, propôs uma
estranha reforma conceitual – excluir esse dispêndio da categoria de gasto.
Nesses manuais, custeio e investimento são diferentes tipos de despesas – ou de
gastos. A pregação reformista se completou com ataques ao presidente do Banco
Central (BC), à política de juros e à autonomia da instituição, uma
característica observada nas maiores economias capitalistas.
Apesar do apoio de alguns ministros, de líderes do PT, de pelegos sindicais e também de uma parte do empresariado, o presidente foi derrotado no primeiro grande confronto com o BC. O Copom, Comitê de Política Monetária, anunciou na quarta-feira, dia 22, a manutenção da taxa básica de juros em 13,75% e, além disso, declarou a disposição de voltar a elevá-la se piorarem as perspectivas de inflação.
Pode-se discutir se os juros em vigor no
Brasil são exagerados ou razoáveis, mas na quarta-feira essa questão se tornou
secundária. Havia motivos para o BC reafirmar sua autonomia e, com isso,
valorizar a ordem legal contestada pelo presidente da República e por vários de
seus companheiros. Os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento,
Simone Tebet, diferenciaram-se, nesse momento, como defensores desse
ordenamento.
Empenhados no debate sobre juros, analistas
do mercado e dos meios de comunicação nem sempre deram ênfase à questão
institucional, especialmente importante, e muitos parecem ter esquecido o
desastre do governo Dilma Rousseff, quando o BC foi submisso ao Executivo.
Desde a primeira redução de juros, no trimestre final de 2011, até abril de
2013, quando se tornou inevitável enfrentar o surto inflacionário, o governo
tolerou a alta de preços e a autoridade monetária se desmoralizou perante os
políticos e o mercado.
Se os analistas houvessem dado mais ênfase
a esse episódio, teriam ficado mais claros o despropósito e os perigos dos
novos ataques à autonomia do BC. Além disso, teria sido ressaltada a semelhança
entre o discurso do presidente Lula e os critérios da presidente Dilma Rousseff
e de alguns de seus auxiliares mais influentes. Teria ficado mais visível,
enfim, o risco de retomada, no terceiro governo Lula, do caminho seguido até a
catástrofe econômica de 2015-2016. Lula mencionou, há poucos dias, “o grau de
destruição ao qual o País foi submetido nesses últimos seis anos”, como se
fosse possível desconhecer, ou relevar, a desordem criada antes disso pela
companheira Rousseff.
Mas a manutenção de juros, já esperada
antes das manifestações de Lula, é mais que uma resposta ao seu destempero.
Razões técnicas são enumeradas em nota do BC. O texto menciona a elevação de
juros no exterior, a piora das expectativas de inflação desde a última reunião
do Copom e “a incerteza sobre o arcabouço fiscal”. Essa incerteza, lembram os
autores da nota, se estende às expectativas em relação à dívida pública. Mesmo
sem os ataques presidenciais, haveria razões para uma decisão conservadora. Mas
a referência à incerteza fiscal torna-se especialmente importante, agora,
quando um governo iniciante é cobrado sobre seus planos para as contas
oficiais.
No Brasil, muito mais do que na maior parte
dos países de renda média, a questão fiscal é relevante. Não se trata apenas de
oferecer segurança a financiadores do Tesouro e a investidores. A solidez das
contas públicas é importante para o sistema financeiro, para a evolução dos
preços e para o bem-estar das famílias, em especial das pobres, supostamente
beneficiadas pela gastança livre defendida pelo presidente.
O presidente Lula deve explicações sobre como pretende administrar as contas da União e, portanto, sobre a evolução provável da dívida pública. As informações levadas ao Congresso pelo ministro da Fazenda foram bem avaliadas por parlamentares, mas ninguém pode dizer, ainda, se essas ideias serão sacramentadas pelo presidente. Ele mesmo reforçou as dúvidas, ao deixar para depois da viagem à China a apresentação oficial do tal arcabouço. Há motivos de inquietação, tanto pelas falas presidenciais sobre responsabilidade social versus responsabilidade fiscal, quanto pelas bobagens sobre a noção de gasto. Sem autoridade sobre o BC, o presidente Lula tem poder, no entanto, sobre o ministro da Fazenda e o Tesouro. Isso basta, agora, para justificar sérias preocupações.
Pessoal quer blindar a todo custo o rentismo nesse país que ganha dinheiro na especulação da bolsa de valores. Não fazem correlação com outros países e pior ignoram as motivações que levam o país a ter a maior taxa de juros real do mundo. Me pergunto: estupidez ou má-fé? Tendo a pensar que má-fé seguida de cegueira ideológica e ódio de classes seja bastante do caldo que está em jogo nesse momento.
ResponderExcluirMá fé eh a sua, petebento
ExcluirEstupidez e preguiça de pensar, acho eu. É mais fácil ser "maria vai com as outras" e agradar os donos dos jornais!
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