Petista discurso para o Legislativo de Portugal antes de seguir viagem para a Espanha; segundo presidente, Brasil 'condena a violação da integridade territorial' da Ucrânia
Por Gian Amato / O Globo
O presidente Luiz Inácio Lula da
Silva foi alvo de protestos da ultradireita e aplausos de aliados nesta
terça-feira ao discursar no Parlamento de Portugal, seu
compromisso derradeiro do país antes de seguir viagem para Madri. O petista
voltou a falar sobre a guerra na
Ucrânia, após declarações
controversas gerarem mal-estar diplomático nas últimas semanas,
afirmando que "condena a violação da integridade territorial" do país
europeu, mas que "é preciso falar de paz" e que "quem acredita
em soluções militares para problemas atuais luta contra os ventos da
História".
Lula foi ao Parlamento no 49º aniversário
da Revolução dos Cravos, que em 1974 pôs fim aos 41 anos de ditadura em
Portugal — presença que há
dias gera controvérsia entre os políticos portugueses. O petista, que
vestiu uma gravata com cores da bandeira brasileira e um cravo vermelho, disse
sobre a invasão russa na Ucrânia:
— Condenamos a violação da integridade territorial da Ucrânia. Acreditamos em uma ordem internacional fundada no respeito ao Direito Internacional e na preservação das soberanias nacionais. A guerra não poderá seguir indefinidamente — afirmou o presidente. — As crises alimentar e energética são problemas de todo o mundo. Todos fomos afetados pelas consequências da guerra. É preciso falar da paz. Para chegar a esse objetivo, é indispensável trilhar o caminho do diálogo e diplomacia.
Segundo Lula, "quem acredita em
soluções militares para problemas atuais luta contra os ventos da História",
completando que "nenhuma solução de qualquer conflito, nacional ou
internacional, será duradoura se não for baseada no diálogo e na negociação
política".
Os deputados do partido de ultradireita
Chega entraram no hemiciclo depois da chegada dos presidentes Lula e Marcelo
Rebelo de Souza, quebrando o protocolo da cerimônia solene de boas-vindas ao
brasileiro. Depois, bateram na mesa toda vez que a maioria da Casa aplaudia o
convidado — protesto sonoro que gerou incômodo visível nos ministros e membros
da comitiva, levando-os a rebater com aplausos de pé e gritos.
A situação levou o presidente da Casa,
Augusto Santos Silva, a pedir desculpas pelo "comportamento
vergonhoso" da extrema direita:
— Chega de insultos, chega de porem
vergonha no nome de Portugal — disse o parlamentar.
Mesmo após a repreensão, os parlamentares
continuaram a segurar cartazes que incluíam frases como "Chega de
corrupção” e “lugar de ladrão é na prisão” e bandeiras da Ucrânia. Em seus
cumprimentos ao Parlamento, Lula classificou os protestos como uma "cena
de ridículo" de pessoas "que não têm uma coisa boa para fazer":
— Às vezes lamento porque, quando as
pessoas não têm uma coisa boa para fazer, para aparecer, fazem essa cena de
ridículo — disse o presidente. — Quando essas pessoas [do Chega] deitarem a
cabeça no travesseiro vão falar: "Que papelão nós fizemos."
Imbróglio do convite
Lula originalmente havia sido convidado
para participar da sessão principal da Casa no aniversário da Revolução dos
Cravos. Em visita oficial ao Brasil em fevereiro, contudo, o ministro dos
Negócios Estrangeiros de Portugal, João Gomes Cravinho, revelou que havia
planos para Lula discursar no aniversário da Revolução dos Cravos, algo que
nenhum chefe de Estado estrangeiro havia feito.
O ministro do Partido Socialista (PS), do
primeiro-ministro e amigo de Lula, António Costa, fez o anúncio sem a decisão
ter sido tomada em conferência dos líderes partidários do Parlamento, como
determina o regimento da Casa. Isso por si só desatou raiva em setores mais
conservadores de Portugal, mas as falas sobre a Ucrânia foram a gota d'água.
Durante sua passagem pela China e a breve
escala nos Emirados Árabes Unidos, o presidente disse que tanto
Rússia quanto Ucrânia são responsáveis pelo conflito, algo que despertou
indignação na comunidade ucraniana e nos deputados da direita e da
ultradireita. Perante à ira, Lula desistiu de participar da sessão principal,
atendo-se à sessão solene de boas-vindas, onde apenas ele e o presidente da
Casa, Santos Silva (PS) tiveram o direito de subir ao púlpito.
O repúdio à presença de Lula foi comandado
pelo líder de extrema direita André Ventura, deputado do Chega. A foto de
Ventura, inclusive, estava acima de um outdoor instalado na frente do
Parlamento, com a frase "Portugal precisa de uma limpeza" e figuras
do establishment com
os rostos marcados por "x". Ao lado da placa gigante havia um pequeno
cartaz contra o presidente brasileiro e a favor da Ucrânia.
Ventura tem grande apoio das forças
policiais portuguesas e também soma simpatizantes brasileiros bolsonaristas ou
que frequentam a igreja evangélica no país. Nos últimos dias, ele prometia o
maior protesto de todos os tempos contra Lula no país. Apoiadores do presidente
compareceram ao local em número similar, isolados por uma barreira de segurança
e policiais.
Protestos no Parlamento
Os órgãos de segurança mantiveram os
manifestantes em duas ruas distintas para evitar possíveis conflitos, e Lula
chegou ao prédio sob vaias e aplausos. Ao contrário de parte da comitiva, que
acessou a rampa da entrada principal pela direita, onde estão os apoiantes do
Chega, o carro de Lula chegou pela esquerda, próximo à rua que concentrava seus
apoiadores, e foi recebido por Santos Silva.
Em seu pronunciamento antes de Lula, o
presidente da Casa lembrou que Portugal foi um dos primeiros países com os quais
o petista restabeleceu contato após ser eleito em 2022. E o primeiro da Europa
a ser visitado pelo presidente, ainda sem sequer ter tomado posse — o petista
fez uma breve escala em Lisboa em novembro, ao voltar da COP27, no balneário
egípcio de Sharm el-Sheikh.
— Com você, Brasília volta a se abrir ao
mundo. Quando alguns tentavam invadir as instituições democráticas brasileiras,
soube defendê-las sem qualquer hesitação — disse o parlamentar, ressaltando a
defesa da democracia contra os atos golpistas de 8 de janeiro.
Ao lado de Lula, Santos Silva defendeu a
retirada das tropas russas do território ucraniano. Mas, assim como Lula disse
em Portugal, afirmou que é hora de mais negociações e menos batalhas.
— Desde a primeira hora, e tal como Brasil, Portugal condena a agressão da Rússia. Precisamos falar mais de negociações e menos de batalhas – disse o presidente do Parlamento.
Tem bolsonarista em todo lugar,cruzes!
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