terça-feira, 11 de abril de 2023

Pedro Cafardo - Empresários sugerem ‘plano safra industrial’

Valor Econômico

Medidas emergenciais podem antecipar a reindustrialização

A reindustrialização do país é um objetivo explícito do governo Lula, praticamente não tem opositores, mas depende de planejamento de médio e longo prazo e da criação de um amplo programa nacional. É possível, porém, tomar medidas executivas rápidas que não dependam do Congresso e possam desde já começar a reerguer a indústria.

Um grupo de pessoas ligadas ao setor industrial, principalmente empresários e economistas, denominado “Brasil Primeiro”, dedicou meses a estudar um minipacote com medidas simples para reanimar a indústria enquanto o plano maior estaria sendo desenhado pelo novo governo.

Na sexta-feira (31/3), o grupo entregou ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, suas propostas emergenciais. O documento tem só quatro itens, majoritariamente relacionados à indústria, mas cujos benefícios alcançariam a sociedade em geral. São ideias de execuções facilitadas, quase todas dependentes apenas de atos administrativos e que podem aumentar a competitividade da indústria no curto prazo. Abaixo, um resumo dos quatro itens:

1. Agilização burocrática e poupatempo empresarial. A ideia é criar uma Agência Federal de Investimentos, na qual empreendedores de setores produtivos possam ter acesso rápido às opções de apoio público ao investimento. Seria criado também um “Poupatempo Empresarial Nacional”, em que qualquer empresa possa resolver rapidamente quaisquer pendências e/ou regularizações na União, nos Estados e nos municípios.

2. Plano safra industrial. A indústria teria um sistema de financiamento nos mesmos moldes do existente para a agricultura. Ou seja, créditos seriam oferecidos ao setor em condições competitivas internacionalmente em prazo e custo. Se necessário, o Tesouro deveria prever a equalização de juros enquanto a Taxa de Longo Prazo (TLP) não for modificada.

Seria preciso estabelecer níveis coerentes para a exigência de garantia a financiamentos de investimentos.

Também seria necessário simplificar o acesso a financiamentos como InovaCred e InovaCred 4.0. E modificar a Lei do Bem, que incentiva investimento em inovação tecnológica, assim como a lei da depreciação acelerada, para que seus benefícios sejam acessíveis à maioria das empresas, e não restritos às que operam no regime de lucro real.

Seria importante também capacitar gerentes de bancos públicos para atuar como representantes do BNDES e da Finep, tornando-os parceiros da indústria, como são ao financiar o agronegócio no Plano Safra.

3. Comércio exterior. Propõe-se a criação de um mecanismo de drawback consolidado por valores, classificando o direito por famílias de produtos, por meio de um banco de drawback. E também a ampliação do uso de drawback para serviços contratados no exterior vinculados ao produto/serviço exportado.

Sugere-se ainda a oferta de seguro de crédito para as exportações de pequenos negócios por meio do fortalecimento da ABGF, a agência gestora de fundos garantidores.

4. Digitalização de empresas industriais. Propõe-se o incentivo à digitalização via redução de custos indiretos de mão de obra conforme metas alcançadas e verificadas. Ao mesmo tempo, haveria financiamento de investimentos em equipamentos e sistemas para digitalização e criação de programa de extensão em capacitação para gestores de pequenas e médias empresas industriais.

Entre os que assinam o documento estão Mario Bernardini, empresário e consultor; José Cristiano Daudt, industrial e engenheiro; Fernando Bitzer, engenheiro e ex-executivo industrial; Hiram Freitas Andreazza, diretor de empresa industrial; Paulo Tonicelli, CEO de empresa exportadora; Pedro Evangelinos, presidente da Abrava-Sindratar; Cristina Helena Pinto de Mello e Nelson Marconi, ambos economistas e professores; Fausto Oliveira, jornalista e escritor.

A proposta foi apresentada a Haddad e a dois secretários do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo e Guilherme Mello. Mario Bernardini, um dos líderes signatários da proposta, disse à coluna que Haddad pediu detalhamentos e revelou que um “Plano Safra Industrial” está nas intenções dele.

Os empresários sugeriram que o FAT, responsável por 60% do funding do BNDES, passe a ser corrigido pelo IPCA projetado, por se tratar de um fundo público e não de investimentos. Assim, o BNDES poderia emprestar a juros abaixo da Selic, sem custos adicionais ao Tesouro.

Haddad considerou a mudança politicamente complicada e disse preferir reservar recursos no Orçamento para equalização de juros, tal como no agro.

Na reunião do dia 31, os empresários lembraram que a legislação sobre depreciação acelerada favorece as indústrias, mas só as que operam no regime de lucro real. Tal como ocorre com a Lei do Bem, o incentivo estaria chegando a apenas 7% das empresas. “Sugerimos a extensão do benefício às indústrias do lucro presumido”, disse Bernardini. Mas Galípolo argumentou que o lucro presumido já é incentivado. Segundo Bernardini, isso não corresponde à realidade: “Estudo da Fiesp mostra que, em média, quem está no lucro presumido paga mais impostos sobre o faturamento do que os que operam no lucro real. Ficamos de atualizar o estudo e encaminhá-lo a Guilherme Mello”.

Bernardini considera que houve real interesse na simplificação do drawback. Os empresários também ficaram de encaminhar proposta detalhada sobre o tema.

Em suas sugestões, eles tentaram poupar o Tesouro de gastos adicionais. Consideraram que a melhor solução para financiar a indústria a custos razoáveis seria mesmo a redução da remuneração do FAT. “Se o pequeno poupador da caderneta e o do FGTS são remunerados muito abaixo da TLP, não há razão para o FAT ser remunerado como um especulador”, disse Bernardini. Na ampliação da depreciação acelerada, argumenta, não há renúncia fiscal. Apenas antecipação de créditos. Na Lei do Bem, haveria uma modesta renúncia fiscal.

Paulo Tonicelli, também signatário, saiu otimista do encontro. “Estamos trabalhando em detalhamentos para ser discutidos com o governo, que ouviu, entendeu e nos abriu a porta. Aliás, esta é a melhor notícia”, afirmou.

 

 

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