Folha de S. Paulo
Petista acerta ao liderar reabilitação da
Venezuela, mas mancha processo ao tratar violações como ilusão
O presidente Lula foi mais
generoso com Nicolás
Maduro do que o candidato Lula. Na campanha, o petista reclamava das
sanções impostas ao regime venezuelano, mas driblava os críticos do
ditador ao
reconhecer os benefícios da alternância de poder.
"Desejo para a Venezuela e para todos os países. Não há presidente
insubstituível", disse, em agosto.
No Planalto, Lula deixou a concessão de lado. Ao receber Maduro, o brasileiro ignorou as violações democráticas do venezuelano, pintou o companheiro como vítima de "uma narrativa" e agraciou o regime com uma absolvição: "Nossos adversários vão ter que pedir desculpas pelo estrago que fizeram na Venezuela".
Lula não mudou de posição, mas a diferença
de tom evidencia o raciocínio por trás de suas escolhas. Antes, o petista
preferiu modular o discurso de campanha para amortecer os ataques de seus
adversários. Agora, ele faz questão de usar o poder presidencial para ajudar e
demarcar uma ligação firme com o vizinho.
Ninguém esperava que Lula convidasse Maduro
para ouvir um sermão. O petista corrigiu um erro político ao reatar laços com a
Venezuela, reforçou
o investimento num projeto de integração regional e se protegeu atrás
da doutrina brasileira de não interferência em outros países.
Se parasse por ali, Lula conseguiria
beliscar uma vitória diplomática. Dentro do jogo político, poderia até tratar
como um lamento ingênuo a exploração, feita por opositores, de sua fotografia
ao lado de Maduro. O petista ultrapassou esse limite ao oferecer ao venezuelano
uma espécie de defesa coletiva ("nossos adversários") e apresentar
conselhos ao ditador.
Lula parece interessado em aproveitar a
estatura do Brasil e sua credibilidade internacional para pegar um atalho
diplomático enganoso. O objetivo seria acelerar uma reabilitação da Venezuela
que, de certa maneira, poupasse o chavismo de um acerto de contas. Tratar a
deterioração da democracia como uma ilusão, porém, deixa uma mancha na legitimidade
desse processo.
Verdade-Verdadeira.
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