O Estado de S. Paulo
Próximo encontro dos sócios do ‘clube da raiva’ foi adiado por suposta ‘perseguição’ a Jair Bolsonaro
Um centro de convenções em forma de baleia
abrigou, ao longo desta semana, os peixes graúdos da ultradireita
internacional. O anfitrião foi o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, que
organizou em Budapeste uma versão europeia da CPAC, a Conferência da Ação
Política Conservadora. O evento, criado nos Estados Unidos, transformou-se ao
longo dos anos em piscina de exibição para o cardume trumpista. Em seu discurso
de abertura, Orbán pediu a volta do tubarão-mor à Casa Branca.
Orbán e Trump, cujos rostos estampavam camisetas distribuídas na CPAC, são os musos da ultradireita autoritária. Orbán porque conseguiu destruir as instituições democráticas de seu país ao longo de três mandatos. Trump porque varreu do mapa o principal obstáculo da ultradireita – que não é a esquerda, mas a direita moderada. “Ela praticamente deixou de existir nos Estados Unidos, diante da força midiática do trumpismo”, diz o cientista político espanhol Francisco Rodríguez Jiménez, um dos autores do livro Trump: Breve História de uma Presidência Singular. Jiménez é o entrevistado do minipodcast da semana.
Em Portugal, o líder da centro-direita,
Luís Montenegro, declarou recentemente que nunca faria aliança com André
Ventura, principal nome da direita radical em seu país. Na Espanha, o Partido
Popular, que reúne os conservadores moderados, faz bullying com o extremista
Santiago Abascal. Já nos Estados Unidos os radicais reinam sozinhos. “O
principal rival de Trump no Partido Republicano, o governador Ron De Santis, é,
em muitos aspectos, mais extremo que ele”, diz Jiménez.
O público-alvo da ultradireita é, em geral,
o cidadão que tem medo – da violência urbana, da concorrência dos imigrantes no
mercado de trabalho e de um estilo de vida vagamente definido como
“progressista”. Trump soube, melhor que todos, transformar o medo em raiva – e,
com isso, destruiu o debate de ideias na democracia americana.
Cresce o intercâmbio entre os sócios do
“clube da raiva”. O próximo encontro seria no fim da próxima semana, em Lisboa,
tendo como anfitrião o português André Ventura. O evento foi adiado por suposta
“perseguição” a Jair Bolsonaro, que seria a principal atração do convescote. O
ex-presidente brasileiro realmente enfrenta dissabores – é suspeito de
falsificar atestados de vacina e fomentar atos de vandalismo golpista, para não
falar da apropriação indevida de joias, denunciada pelo Estadão em furo de
reportagem.
Democratas mundo afora acompanharam com
atenção o encontro no ventre da baleia húngara. É essencial conhecer as
entranhas do monstro para poder enfrentá-lo – e vencê-lo.
*Escritor, professor da Faap e doutorando
em Ciência Política na Universidade de Lisboa
Pois é!
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