O Globo
Governo diz que projetos ambiental e
indígena são prioritários, mas como tem minoria no Congresso nos temas, a
estratégia é manejar politicamente
O que o presidente Lula falou na reunião de sexta-feira é que os projetos ambiental e indígena estão no coração do governo. Ótimo. Mas o que os dados mostraram, nas análises dos ministros presentes no encontro no Palácio, foi que, para estes dois temas, a base parlamentar tem pouco mais de 130 votos. Portanto, o governo não baterá de frente com o Congresso e vai manejar politicamente para recuperar os poderes dos ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas. É tudo o que eles podem fazer e é pouco para manter a integridade do projeto de recuperação do meio ambiente e dos direitos dos indígenas.
Por coincidência que só o criativo roteirista
do Brasil explica, no meio dessa tempestade que se abateu sobre a área
ambiental, a ONU escolheu Belém para sediar a COP 30, em novembro de 2025. A
Petrobras entrou com novo pedido para liberar a perfuração no mar da Amazônia,
os políticos se vingaram do Ministério do Meio Ambiente, a ponto de
parlamentares progressistas se juntarem com a bancada do agronegócio. Culpa-se
o centrão, quando o que intriga é o que faziam parlamentares do PT atrapalhando
o projeto de organização do governo. O Brasil ficou sabendo que a ONU aceitou
nosso convite de sediar a mais importante reunião global sobre o clima,
enquanto os defensores da energia fóssil escalam nas pressões para liberar a
exploração do petróleo na Costa da Amazônia.
O Centro de Despetrolização das Aves no
projeto da Petrobras foi instalado em Belém, a 800 quilômetros do local onde se
quer perfurar. Se houver algum desastre, doze barcos teriam que ir e vir para
salvar as aves. O que a Petrobras está argumentando é que tudo está pronto para
fazer o tal furo.
— Preparou-se o simulado, mandou-se a sonda
para lá, todos os helicópteros, todos os barcos, tudo mobilizado e na hora de
autorizar o simulado, o Ibama negou intempestivamente. A broca está lá no fundo
e só precisamos do licenciamento ambiental desse poço — reclama uma fonte da
empresa.
O problema é exatamente este, explica-se no
Ministério do Meio Ambiente. O governo Bolsonaro fez a política do fato
consumado, e mobilizou todo o material da Petrobras como se a licença fosse ser
dada. A mesma licença que havia sido negada em 2018. Na reunião que houve na
Casa Civil, semana passada, a conclusão foi que tudo passará agora pela AAAS, a
avaliação ambiental estratégica de toda a região, antes de se retomar o pedido
de licença.
É um nó. A Petrobras diz que teve de
recorrer, insistindo no pedido, do contrário não teria como explicar aos
acionistas o investimento que fez. Alega que atendeu todos os pedidos do Ibama.
O Ibama diz que eles não foram acolhidos. A broca está no fundo para fazer o
furo. Os políticos da região sonham com a ilusão de royalties e, por isso, se
uniram ao que há de pior no Congresso para derrotar o projeto ambiental inteiro
do governo.
O relator da MP da reorganização do
governo, Isnaldo Bulhões, mostrando pouca latitude mental, disse que o Cadastro
Ambiental Rural ficaria no Ministério da Gestão e Inovação porque o e-gov está
lá. O CAR não é apenas um cadastro, é um instrumento fundamental para o combate
à grilagem neste momento. Ele tem duas etapas. O primeiro passo é
autodeclaratório. O produtor diz que a terra é dele. Depois o governo valida.
Hoje o CAR virou o caminho da fraude porque grileiros registram como
propriedade privada fatias de terra em parque nacional, em floresta pública, em
terra indígena. A validação, feita agora de forma séria, será o instrumento
estratégico de resgate da política ambiental.
Há outras perdas como a Agência Nacional de
Águas que sairia do Ministério do Meio Ambiente, retirando-se a possibilidade
de gestão ambiental dos recursos hídricos. Depois de impor essas derrotas, a
coalizão antiambiental do Congresso quer mais e prepara novos botes no
plenário. Por isso, a estratégia definida no governo foi reconhecer que é
minoritário nessas pautas e tentar reverter um a um os retrocessos. No governo
se diz que a agenda ambiental e indígena é prioritária, mas a semana terminou
sob uma enorme incerteza. É um equívoco pensar que o governo é que saiu
derrotado. O Brasil é que perde se prevalecer esse tipo de retrocesso.
Verdade.
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