sábado, 27 de maio de 2023

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

STF tem de definir quanta droga torna alguém traficante

O Globo

Erro na Lei Antidrogas contribui para explosão da população carcerária. Passou da hora de corrigi-lo

Está na pauta do STF o julgamento da ação questionando a constitucionalidade do artigo da Lei Antidrogas que criminaliza o porte para consumo pessoal. Uma demonstração da dificuldade para tratar de questão tão relevante é que ele se arrasta há oito anos. Espera-se que desta vez os ministros concluam a votação, determinando que portar pequenas quantidades de entorpecentes não é crime.

O caso analisado envolve um detento condenado por ter sido flagrado com apenas 3 gramas de maconha na prisão. A ação foi movida pela Defensoria Pública de São Paulo, para quem o artigo viola os princípios constitucionais de intimidade, vida privada, honra e autodeterminação. Pela legislação em vigor, é crime “adquirir, guardar, ter em depósito, transportar ou trazer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal”, não importando a quantidade. É uma formulação absurda, já que mesmo quem usa maconha com fins medicinais viola essa lei.

Até o processo ser retomado, apenas três ministros haviam votado. O relator, Gilmar Mendes, defendeu a inconstitucionalidade do artigo e disse que a tese vale não apenas para a maconha, mas para qualquer entorpecente. Luís Roberto Barroso e Edson Fachin concordaram quanto à inconstitucionalidade, restrita à maconha. Inspirado em Portugal, Barroso propôs o limite de 25 gramas para distinguir uso pessoal de tráfico. Fachin entendeu que a regra deve ser fixada pelo Congresso.

A falta de parâmetro para diferenciar o usuário do traficante é o maior problema da Lei Antidrogas. Na prática, qualquer cidadão flagrado com pequena quantidade para uso pessoal está sujeito a ser preso, tanto quanto o bandido que vive do tráfico. A aplicação da lei depende de critérios subjetivos e dos humores do policial de plantão ou do juiz. A consequência mais desastrosa é a explosão da população carcerária, inflada pela prisão de usuários de drogas que, por falhas da lei, são tratados como traficantes e lançados em presídios superlotados, onde dividem celas com homicidas, estupradores ou pedófilos.

A Lei Antidrogas, que pretendia reduzir o encarceramento, teve efeito contrário. Em 2005, antes de ela entrar em vigor, havia 300 mil detentos. Hoje há perto de 800 mil — dez vezes o crescimento populacional no período. A lei não é a única responsável, mas durante sua vigência dobrou o percentual de presos por crimes relacionados a entorpecentes (de 14% para 28% do total). A guerra contra as drogas não deu certo. O tráfico continua a cometer crimes dentro dos próprios presídios.

A rigor, caberia ao Congresso corrigir distorções na lei. Mas o Parlamento tem sido omisso, e a superpopulação carcerária é problema urgente. Por isso o Supremo deve arbitrar a questão. “Não adianta só o STF descriminalizar o uso de drogas”, diz o advogado Pierpaolo Bottini, professor de Direito Penal na USP . “É preciso fixar uma quantidade objetiva que diferencie quem é usuário de quem é traficante.” Com o limite de 25 gramas para maconha e 10 gramas para cocaína, 27% das penas seriam revistas, estima um estudo do Ipea.

Há oito anos a discussão se arrasta, e os presídios ficam mais e mais abarrotados. Dominados por facções criminosas, viraram problema de segurança pública, quando deveriam ser solução. O uso de drogas deve ser tratado como questão de saúde pública, não de polícia. Esta deve ocupar-se apenas de quem tira proveito dele, os traficantes.

Governo não pode demorar tanto para restringir os voos no Santos Dumont

O Globo

Não é necessário aguardar decisão sobre concessão do Galeão para fazer redistribuição racional do tráfego

Quase cinco meses se passaram desde a troca de comando no Planalto, e o imbróglio dos aeroportos do Rio de Janeiro não avançou, apesar das promessas do novo governo de buscar uma solução para o impasse. O Tom Jobim/Galeão (terminal internacional) permanece esvaziado, enquanto o Santos Dumont (doméstico) dá repetidos sinais de saturação, como mostram as filas de carros na entrada do estacionamento. Na tarde de quinta-feira, todas as 980 vagas estavam ocupadas, e a espera para acessar o local chegava a uma hora, praticamente o tempo de voo entre Rio e São Paulo.

Em fevereiro do ano passado, em meio ao desequilíbrio no movimento dos terminais internacional e doméstico, a Changi, empresa de Cingapura que controla o Galeão, anunciou ter desistido da concessão. A decisão levou à mudança de planos do governo. O leilão do Santos Dumont, previsto para 2022, foi adiado para que os dois aeroportos pudessem ser licitados juntos. Fazia sentido. Com a troca de governo, porém, a Changi voltou atrás e manifestou intenção de ficar. A reviravolta só fez embaralhar mais o cenário.

Manter a concessão depois de ter desistido não é questão simples, pois envolve aspectos jurídicos difíceis de contornar. Além disso, o atual governo, embora se mostre favorável à permanência da concessionária, não parece disposto a renegociar a outorga, uma de suas principais reivindicações. A Changi pediu mais tempo para tomar uma decisão. Até agora não há definição.

Enquanto isso, o governo buscou aval do Tribunal de Contas da União (TCU), mas a iniciativa suscitou mais dúvidas que esclarecimentos. A área técnica do tribunal apresentou entendimentos conflitantes. Um dos auditores diz que o Galeão precisa ser relicitado. Outro, que a concessão pode ser renegociada, desde que não haja desvirtuamento do contrato e que sejam apresentados cálculos que justifiquem a medida. Caberá ao relator do processo, ministro Vital do Rego, submeter ao plenário uma proposta de solução.

As idas e vindas não resolvem o principal: o desequilíbrio entre Galeão e Santos Dumont. O contrassenso é evidente. O aeroporto internacional, que dispõe de ampla infraestrutura e onde foram investidos vultosos recursos públicos e privados, vive às moscas. O doméstico, encravado no centro da cidade, com conhecidas limitações operacionais, opera abarrotado, acima da capacidade. Não tem como funcionar.

É um alento que o ministro dos Portos e Aeroportos, Márcio França, tenha reconhecido, depois de reunião com lideranças do Rio, a necessidade de restringir os voos no Santos Dumont. Pelas últimas informações, as mudanças começarão no segundo semestre. Governo e a agência reguladora precisam mostrar mais agilidade. A questão central não é se a controladora do Galeão permanecerá, mas quando serão distribuídos, de forma mais racional, os voos entre os aeroportos do Rio, para que funcionem de maneira complementar, como noutras cidades do Brasil e do mundo. Não dá para demorar tanto para tomar uma decisão tão simples.

Carro impopular

Folha de S. Paulo

Lula repete velhos erros ao subsidiar automóveis, agora sem planejamento mínimo

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lançou um plano de incentivo a compras de carros ditos populares —automóveis de valor até R$ 120 mil, entre os quais os mais baratos custam ao menos R$ 69 mil, o equivalente a mais de 50 salários mínimos.

Ideia cara ao presidente, desde o início controversa, o programa ainda não existe, entretanto.

O plano foi divulgado na quinta (25) sem que houvesse avaliação de seus custos ou de quanta receita o governo estaria disposto a abrir mão a fim de subsidiar a compra de automóveis.

A intenção anunciada foi a de oferecer reduções de impostos suficientes para reduzir os preços de 1,5% a 10,96%, de acordo com o Ministério do Desenvolvimento, comandado pelo vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB).

Desconhecem-se a duração do incentivo e as faixas de isenção. Não estão claras as condições para calcular o tamanho do abatimento de tributos, que vai depender do valor do carro, de sua eficiência energética e do conteúdo nacional das peças. Não se sabe se o benefício valerá apenas para o varejo ou também para outras operações.

Se não se conhece o tamanho do incentivo a ser bancado pelo contribuinte, ficam inviabilizados cálculos sobre custos e benefícios, mesmo em termos econômicos mais rudimentares. Logo, não é possível saber como se vai compensar a perda de receita ou qual poderia ser um uso alternativo e melhor do dinheiro.

Em suma, o governo não sabe o que está fazendo.

O ministro Fernando Haddad, da Fazenda, afirmou nesta sexta (26) que o plano será "tópico", de curta duração. Não passaria, depreende-se, de um auxílio temporário para que montadoras esvaziem seus pátios em um momento em que as vendas são prejudicadas também pelo alto custo de financiamento, de taxas de juros altas.

Ou seja, trata-se de um paliativo improvisado, um incentivo setorial para uma indústria já privilegiada. De um estímulo econômico na contramão da política do Banco Central e dos objetivos declarados do governo de reduzir o déficit do Tesouro e organizar o sistema tributário. De um programa que decerto não beneficia pelo menos a metade mais pobre da população.

Em si mesmos, incentivos para a compra de veículos particulares têm sido criticados pelos seus impactos ambientais, pela falta de sentido social e pela escassez de resultados em termos de progresso tecnológico e de encadeamento de efeitos econômicos.

A longa experiência brasileira na matéria tem sido decepcionante, mas o governo Lula parece obstinado em repetir erros —neste caso, sem planejamento mínimo.

A dúvida que liberta

Folha de S. Paulo

ONGs que revertem condenações injustas expõem erro na identificação de acusados

"É melhor absolver cem culpados do que condenar um inocente." O dito representa um dos princípios fundamentais do direito penal, o do "in dubio pro reo", que privilegia o direito à liberdade do acusado quando colocado em confronto com o direito punitivo do Estado.

Na dúvida, prevalece o interesse do réu, que é inocente até que se prove o contrário. Mas, infelizmente, não é incomum ver inocentes na cadeia, tendo suas vidas destruídas por anos, até décadas.

Nos EUA, estima-se que de 1% a 5% dos presos foram condenados injustamente —o que representa cerca de 20 mil até 100 mil pessoas.

Daí a importância de entidades que buscam desfazer tais descalabros. Uma delas é o Innocence Project (Projeto Inocência), que desde 1992 já libertou 243 pessoas. A iniciativa criou uma rede que atua em 12 países. O Projeto Inocência Brasil completa cinco anos com cerca de 5.000 pedidos de revisão criminal e seis prisões revertidas.

Segundo levantamento do Innoncence Project, entre 1989 e 2020, 375 presos foram libertados a partir de testes de DNA nos Estados Unidos. Desses, 60% eram negros, e 69% das condenações se basearam em erros de identificação.

Análise de 100 casos de inocentes encarcerados no Brasil, feita pela Folha em 2021, revelou que o reconhecimento incorreto do acusado ocorreu em 42 deles e, nesses, 71,5% dos condenados eram negros.

O problema tem duas causas principais: método de identificação e corporativismo do Judiciário.

Segundo o artigo 226 do Código de Processo Penal, o reconhecimento deve ser feito alinhando pessoas que tenham semelhanças com o suspeito, após a testemunha já tê-lo descrito. Mas o procedimento geralmente é descumprido.

Muitas vezes a testemunha apenas olha um álbum com fotos de suspeitos que já passaram pela polícia, o que potencializa preconceitos e lapsos de memória —constatação feita por inúmeras pesquisas.

Foi preciso que, em 2020, o Superior Tribunal de Justiça decidisse que o rito previsto na lei é obrigatório e a identificação só por imagens nunca deve servir como prova.

Ademais, tem-se a ideia de que a melhor promotoria é aquela que mais condena, e o Judiciário tende a proteger a si mesmo, relutando em admitir seus erros —o que torna difícil reverter condenações.

Mas eficiência tem a ver com qualidade, não quantidade. Uma Justiça de excelência age a partir de certezas e, na dúvida, liberta.

Incentivo às montadoras, de novo

O Estado de S. Paulo

Estímulo ao carro popular vai de encontro aos objetivos do arcabouço fiscal e da reforma tributária. A quem serve um programa que nada tem a ver com a ‘neoindustrialização’?

O governo de Lula da Silva anunciou que lançará um pacote de medidas para estimular o setor automotivo e as vendas do chamado “carro popular”. De acordo com o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, a ideia é reduzir o preço de veículos de até R$ 120 mil e viabilizar descontos entre 1,5% e 10,96% ao consumidor final.

Ainda não há muitos detalhes sobre como o plano funcionará, mas essa indefinição não impediu o vice-presidente de apresentar publicamente as premissas do programa. A data em que o evento ocorreu, no Dia da Indústria, escancara a primazia que o Executivo dá às montadoras, embora a indústria vá muito além desse segmento. E como não existem coincidências em Brasília, o programa foi anunciado na mesma semana em que o governo conseguiu aprovar o arcabouço fiscal na Câmara dos Deputados. Eis o confuso retrato do governo Lula em seu terceiro mandato.

A ausência da clareza que qualquer política pública requer já seria razão suficiente para questionar suas bases, mas já é possível criticar o pouco que se sabe dela. Trata-se de uma reedição de medidas já testadas e reprovadas para impulsionar a indústria automotiva, entre as quais elevar o índice de nacionalização de peças. O motivo pelo qual o País insiste em repetir os mesmos erros do passado permanece uma incógnita, mas não é por falta de aviso ou de estudos a comprovar o fracasso de iniciativas anteriores.

Com ou sem desconto, o preço dos veículos evidentemente não tem nada de popular, considerando a renda média da população e os recordes de endividamento e inadimplência registrados nos últimos meses. O limite de R$ 120 mil é amplo o suficiente para livrar o governo da acusação de privilegiar algumas marcas em detrimento de outras. O paradoxo é que o valor escancara que os tais critérios ambientais do pacote não passam de balela. Se fosse para incentivar a produção de veículos menos poluentes, não haveria por que desconsiderar os carros elétricos. Fato é que eles estão fora do alcance do programa, pois partem de valores mais próximos de R$ 150 mil.

O plano mostra ainda que engolir sapos nesta semana não foi exclusividade das ministras do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, e dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mal teve tempo de comemorar a aprovação do arcabouço pela Câmara dos Deputados e já teve de digerir um programa que vai de encontro à recuperação de receitas, algo fundamental para assegurar a credibilidade de sua política fiscal.

Contrariada, a equipe econômica sinalizou, nos bastidores, que o pacote deve vigorar por poucos meses e que a isenção tributária será de, no máximo, R$ 500 milhões, embora a indústria, por óbvio, trabalhe para aumentá-los. Especialistas calculam que a renúncia chegaria a R$ 8 bilhões se durasse um ano. Por menores que sejam o impacto fiscal e o prazo da medida, trata-se de um tratamento privilegiado a um setor específico, o que mina o princípio da proposta de reforma tributária do Ministério da Fazenda. Não há dúvida de que essa concessão custará caro quando a reforma chegar ao Congresso.

Por fim, o programa ignora ainda uma realidade que não está restrita ao mercado brasileiro. O atual portfólio das montadoras expõe a escolha de margens mais altas em detrimento de um maior volume de vendas, o que explica muito sobre os altos índices de ociosidade do setor. No Brasil, em particular, o segmento opera com cerca de 50% de sua capacidade instalada há anos. Pode até ter sido uma estratégia errada das empresas, mas não é papel do governo corrigi-la. Por isso mesmo, chama a atenção que o setor não tenha dado nenhuma garantia de que esses descontos serão integralmente repassados ao consumidor, bem como o fato de não ter assumido qualquer compromisso no sentido de manter e gerar empregos.

Diante dos custos políticos e econômicos que a proposta terá ao País, cabe ao governo esclarecer a quem serve um programa que não parece ter nada a ver com a anunciada “neoindustrialização” que ele diz defender.

Lula ‘perdido’ da Silva

O Estado de S. Paulo

Sem plano estratégico para o País, o petista parece desorientado. As crises que já engolfam um governo de apenas cinco meses formam o retrato de um presidente fora do prumo

É difícil acompanhar a política nacional e não se espantar com o fato de que o governo do presidente Lula da Silva não completou cinco meses, mas já está imerso em confusões que o fazem parecer precocemente envelhecido, como se já estivesse padecendo da fadiga de material típica de fim de mandato.

Lula parece perdido. Sabe-se que ele queria governar o País pela terceira vez, ou não teria se submetido, a essa altura da vida, ao desgaste de uma virulenta campanha eleitoral como foi a do ano passado. Mas, até agora, ainda não se sabe exatamente para quê. Afinal, aonde Lula quer levar o Brasil? Qual seu plano estratégico para o País?

Desencontros são naturais no início de qualquer governo. No entanto, não há explicação razoável para tantas crises políticas, em tão pouco tempo, a não ser a desorientação do presidente da República. Mais especificamente, a falta de um programa de governo consistente e de uma política de comunicação que sejam capazes de unir a sociedade em torno de objetivos comuns, malgrado todas as divergências políticas que possa haver entre os cidadãos, como as há em qualquer democracia saudável.

Enquanto as reais intenções de Lula não forem conhecidas, é lícita a inferência de que o presidente só está se movendo por seus caprichos e por sua pulsão pela desforra. É nítida a intenção do petista de demolir tudo o que foi feito de bom no País enquanto o PT esteve fora do poder, em particular o Marco Legal do Saneamento, a Lei das Estatais, a autonomia do Banco Central (BC), as reformas do Ensino Médio e a trabalhista e a capitalização da Eletrobras, entre outras medidas.

Lula pode vir a público e afirmar, como o fez há poucos dias, que “não voltaria à Presidência para ser menor” do que foi em seus mandatos anteriores. Porém, até o momento, isso é exatamente o que se descortina. Lula também pode fazer afagos públicos nas ministras do Meio Ambiente, Marina Silva, e dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, mas nada compensará o fato de que, em nome de uma certa governabilidade, permitiu que o Centrão desfigurasse esses Ministérios que, bem ou mal, serviam para ser a cara do governo petista. Como bem disse o próprio Lula depois da humilhação de suas ministras, “tudo parece normal”.

Em um Congresso infenso às pretensões do presidente, Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) brotam por todos os lados, em número sem precedentes para uma legislatura que mal começou. O que é isso senão o retrato de um governo fraco, como já destacamos nesta página?

Enquanto claudica na articulação para formar uma base de apoio no Legislativo consistente o bastante para aprovar projetos realmente importantes para o Brasil, Lula se perde entre questões distantes das prioridades do País, como a guerra na Ucrânia, sua rixa pessoal contra o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, suas agressões aos empresários do agronegócio, sobretudo os paulistas, e os endossos aos arruaceiros do MST. Enquanto o mundo já discute como serão as cidades do futuro, Lula dobra a aposta no transporte individual por meio de carros baratos movidos a combustíveis fósseis.

O que haveria de ser pior para o Brasil do que ser governado por um presidente desorientado, alguém que, ao invés de servir à Nação como fonte de estabilidade, funciona como vetor de crises perfeitamente evitáveis?

O País teve a infelicidade de ser governado por um desqualificado como Jair Bolsonaro durante a mais grave emergência sanitária em mais de um século. Seu despreparo e, principalmente, seu descaso com a vida dos brasileiros fizeram de sua gestão da crise, por assim dizer, uma tragédia dentro de outra tragédia. A razia promovida pelo ex-presidente em praticamente todas as áreas da administração pública demandava do sucessor um esforço de união e reconstrução sem precedentes.

Lula se apresentou como a única pessoa à altura dessa tarefa, o líder de uma fenomenal “frente ampla” capaz de reconectar os brasileiros com a esperança de dias melhores. Tempo há para que esse Lula, enfim, apareça. Resta saber se era isso o que ele realmente se propôs a fazer pelo País.

O bom combate à fraude bancária

O Estado de S. Paulo

BC acerta ao adotar medida que pode ajudar a prevenir golpes, praga que atormenta os brasileiros

Veio em boa hora a iniciativa do Banco Central (BC), anunciada na terça-feira, de buscar brecar o crescente número de fraudes bancárias. Os bancos e outras instituições financeiras terão que compartilhar entre si dados sobre fraudes. As informações repassadas entre essas entidades devem ajudar a prevenir a repetição dos golpes. Como se sabe, é comum que uma pessoa que aplica um golpe tente repeti-lo com outros e em outros bancos. Ao tomar conhecimento de detalhes das fraudes, os bancos poderão adotar procedimentos de prevenção e aumentar a segurança dos clientes e deles mesmos.

Os números são alarmantes. Apenas no mês de janeiro, os brasileiros sofreram 284 mil tentativas de fraudes, segundo a Serasa Experian. Ou seja, a cada 9 segundos há uma tentativa de golpe. E o setor mais afetado é exatamente o financeiro. Pelas estatísticas da Serasa, fraudes contra bancos, cartões e financeiras representaram 66% do total.

Os valores envolvidos também impressionam. No ano passado, levantamento feito pelo Estadão indicou que o volume de golpes no sistema financeiro poderia atingir R$ 2,5 bilhões, e mais de 70% desse volume estaria relacionado ao uso do Pix, o sistema de pagamentos instantâneos criado pelo BC, lançado em 2020. Rapidamente, o Pix foi adotado por grande parte da população pelas facilidades que oferece, em especial a rapidez nas transações, e pela gratuidade.

Entre 2021 e 2022, o uso do Pix aumentou 228,9%, segundo dados do BC; o Brasil passou a ser o segundo país em que os mecanismos de pagamento instantâneo são mais populares, atrás apenas da Índia. Curiosamente, são os países emergentes que lideram a corrida pela popularização dos meios de pagamento instantâneos.

O aumento do número de fraudes não é exclusividade do Brasil. Pesquisa feita pela empresa de consultoria KPMG, divulgada em 2019, com 43 bancos de todas as regiões do mundo, apurou que mais da metade dos entrevistados anotou incremento no valor e no volume das fraudes, incluindo roubo de identidade e de contas, ataques cibernéticos e golpes de pagamentos supostamente autorizados. Para os bancos, a conta é alta. Embora a pesquisa não informe os valores envolvidos nesses golpes, relata que mais da metade dos entrevistados recuperou menos de 25% das perdas.

A norma instituída pelo Banco Central brasileiro ainda depende de novas orientações a serem dadas pelas autoridades monetárias nos próximos meses, e os bancos terão que passar a trocar informações até o dia 1.º de novembro. E antes que o sistema possa começar a funcionar, os bancos terão que pedir licença a seus clientes para repassar os dados das fraudes para outras instituições financeiras. Esses procedimentos burocráticos fazem parte da boa prática bancária.

A ocorrência com tanta frequência de golpes e fraudes perturba a vida de milhares de brasileiros e de suas famílias, atrapalha os orçamentos domésticos e pode corroer a confiança dos clientes nas instituições financeiras. É salutar, portanto, o passo dado agora pelo BC. E que venham outros aprimoramentos para melhorar a relação dos brasileiros com o sistema financeiro.

 

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