Folha de S. Paulo
Programa ainda vai ajudar a reduzir bem a
pobreza em 2023, mas essa fonte vai secar
A renda
dos brasileiros cresceu em 2022, dizem os números do IBGE divulgados
na semana passada. A informação causou certa indiferença. É compreensível.
O ano de 2021 havia sido o pior de uma
década tenebrosa. Ainda assim, a despiora foi maior para os mais pobres. Na
média, o aumento da renda domiciliar per capita foi de 6,9%. Para os 10% mais
pobres, de 57,3%.
Com o Bolsa Família de
Lula 3, o aumento de renda dos mais pobres deve ser expressivo em 2023. Mas,
daqui em diante, será muito difícil que a vida dessas pessoas melhore por meio
de aumento de transferência de renda.
Antes de mais nada, explique-se a
"melhora". O rendimento médio por pessoa entre os 10% mais pobres
passou de R$ 102 por mês em 2021 para R$ 162 em 2022. É miséria.
Em 2021, a falta de trabalho foi a pior da década, afora o 2020 do início da epidemia. O governo das trevas enxugou o auxílio emergencial. Foi o terror social. Em meados de 2022, Jair Bolsonaro veio com o Auxílio Brasil porque sua candidatura naufragava. Era um programa social improvisado, ruim, mas que pagava mais.
Mesmo assim, em 2022 o rendimento
domiciliar per capita foi dos menores da década. Foi 4% menor do que em 2014,
na média. Para o décimo mais pobre da população, 9,5% menor.
A melhoria de 2021 para 2022 deveu-se
"principalmente ao Auxílio Brasil. Esse aumento das transferências também
levou a uma menor oferta de trabalho de jovens pouco escolarizados, o que
forcou um aumento dos salários de trabalhadores menos qualificados", diz
Daniel Duque, pesquisador da área de Economia Aplicada da FGV-IBRE.
Embora o Auxílio Brasil tenha feito
diferença, a maior parte dos rendimentos vem do trabalho: 72%, mesmo no caso
décimo mais pobre do país; 86% entre aqueles no décimo seguinte de renda.
De 2021 para 2022, 74% do aumento da renda
do décimo mais pobre veio de aumento da renda do trabalho, segundo dados da
Pnad/IBGE compilados por Duque.
Em relação a 2019, porém, o aumento da
renda derivada do trabalho respondeu por 33% do aumento da renda dos 10% mais
pobres; o Auxílio Brasil, por 67%, nas contas deste jornalista. É um aumento
excepcional em vários sentidos. Outros assim não serão possíveis.
Em 2019, a despesa com o programa foi de R$
41,8 bilhões, perto da média de 2012-2019, de R$ 41,3 bilhões. Em 2022,
aumentou para R$ 91,5 bilhões, sob o nome de Auxílio Brasil. Neste 2023, deve
ser de R$ 167 bilhões. Os valores são corrigidos pela inflação.
A despesa com o Bolsa Família deve chegar a
9% do gasto federal neste 2023. Em 2010, último ano de Lula 1, era de 2% do
total. Em 2014, último ano de Dilma 1, de 2,5%.
De onde tirar mais?
Quase 80% da despesa federal vai para Previdência/INSS (44%),
salários e aposentadorias de servidores (18,7%), BPC (9%, para pessoas com
deficiência e pobres idosos), seguro-desemprego e abono (3,2%) e Bolsa Família.
O governo está no vermelho. O aumento de
impostos que virá mal cobrirá o déficit.
O investimento em obras, equipamentos etc.
equivale a menos de um quarto do Bolsa Família. Mesmo se for a R$ 75 bilhões,
como quer Lula 3, chega a 45%. A fim de aumentar em um tico o crescimento, é
preciso investir mais.
O país é pobre, de resto.
O valor médio do Bolsa Família foi de R$
670 em abril. Equivale a 51% do salário mínimo. O salário mínimo equivale a 46%
do rendimento médio do trabalho ("salário") e a muito mais do que o
rendimento mediano. Os valores do Bolsa Família e do salário mínimo estão no
limite, dada a baixa renda (PIB per capita) do país.
Melhoria na tributação pode atenuar
minimamente a pobreza. É preciso acelerar o crescimento. Tornar o país mais
produtivo, encontrar setores que "puxem" o investimento. A fonte da
transferência extra de renda vai secar.
Contas e mais contas.
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