quarta-feira, 3 de maio de 2023

Vinicius Torres Freire - O mundo lá fora e o Banco Central

Folha se S. Paulo

Dia ruim no mercado financeiro mundial indica riscos e medos que afetam o Brasil

Esta quarta-feira (3) é dia decisão sobre taxas básica de juros nos Estados Unidos e no Brasil. Será mais um dia de escaramuças políticas por causa da Selic. É também um dia conveniente para revisar o que se passa na economia mundial, para o que pouco damos atenção, apesar de tanto dessa vida lá fora nos influenciar tanto por aqui. Influencia também a decisão do Banco Central brasileiro.

A terça-feira (2) ruim nos mercados financeiros sugere alguns motivos de atenção. Sim, a leitora pode não gostar deles e de seus solavancos, mas isso equivale a não gostar da previsão do tempo e sair pelado em dia de prognóstico de neve, no caso extremo.

Há uma crise financeira que, para alguns, segue em banhomaria e esfriando, mas pode estar apenas fervendo baixo. Os donos do dinheiro desconfiam dos bancos médios americanos. Alguns mais visados chegaram a perder de 10% a 28% do valor de mercado nesta terça-feira de tombos nas Bolsas do mundo e aqui.

Persiste a conversa de que as desconfianças de clientes, de seus credores, talvez apertos regulatórios e balanços fracos afetam bancos de modo relevante e terão (ou já têm) efeitos secundários na economia real, no crédito.

Economistas de um bancão como o JP Morgan dizem que se tem prestado pouca atenção no risco de uma crise no setor financeiro não-bancário. Quase 15 anos de taxas de juros globais muito baixas podem ter criado uma dependência tão grande que largar o hábito pode causar traumas.

Por falar nisso, o JP Morgan acaba de comprar os restos de um desses bancos médios que foram à breca, ou quase, mas a tensão, se não a crise, continua.

Os sinais de esfriamento da economia americana se tornam mais frequentes. O mercado de trabalho dá sinais de que pode voltar ao normal (está muito acima disso).

No mundo, cai o preço de commodities, como o petróleo. Nem o corte de produção do cartel, da Opep, adiantou. Depois de um pico de US$ 87 em abril, o preço do barril do tipo Brent desceu de novo à casa dos US$ 75. O consumo de diesel, um termômetro de atividade e comércio mundial, está em baixa. O preço caiu até por aqui.

Economia mundial mais fria em tese pode dar em taxas de juros menores ou em alta contida, o que facilita o trabalho do BC do Brasil.

Uma decorrência do esfriamento, ou da especulação a respeito, é a baixa ou contenção do preço de commodities (petróleo, ferro, carnes etc.). Se também dólar ficar ao menos na casa dos R$ 5, é mais uma contribuição para a contenção dos preços no Brasil.

No entanto, apesar de melhoras mínimas e lentas, a inflação continua alta. A expectativa de inflação para 2024 não baixa. A inflação de serviços continua ruim e não deve baixar até que sobrevenha contenção de aumento do salário médio. A concessão de crédito bancário cai desde o final do ano passado. Pode ser um aviso de resfriamento a partir do segundo semestre, mas temos estado muito no escuro sobre indicadores econômicos brasileiros.

Pressões menores na inflação têm um avesso em tese ruim. Uma economia mais fraca no mundo pode provocar baixas por aqui. Podem ser efeitos diretos, como no comércio menor, contágios etc. Commodities em baixa diminuem a arrecadação de impostos, tudo mais constante. Para que o teto Lula-Haddad dê certo, é preciso arrecadar mais imposto. O destino da arrecadação vai temperar as reações da praça financeira e agentes econômicos maiores a respeito do dito arcabouço fiscal.

Enfim, crises ou tensões financeiras importantes são de digestão lenta e incerta. Uma explosão nos afeta. Mesmo a "marolinha" de 2008 causou uma minirrecessão por aqui em 2009 —isso quando o país estava perto do auge econômico dos últimos 40 anos.

 

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