O Globo
O presidente da Câmara, deputado Arthur
Lira, está com duas panelas no fogo. Numa, sofre o impacto das investigações
que envolvem a compra, pelo governo federal, de kits de robótica para escolas
de Alagoas e Pernambuco que não tinham estrutura e, num caso, nem água. É
desnecessário lembrar que os kits estavam superfaturados.
Noutra panela está a briga por nomeações.
As repórteres Catia Seabra e Julia Chaib revelaram que as queixas do Centrão
concentram-se na ministra Esther Dweck, da Gestão e Inovação em Serviços
Públicos. Trata-se de uma servidora de perfil técnico, pessoalmente discreta.
Ela teria emperrado nomeações na Secretaria do Patrimônio da União. Logo na
repartição que leva o nome do Patrimônio da Viúva. As queixas ramificam-se para
uma fundação de previdência e estendem-se ao Ministério da Saúde.
Ganha um fim de semana em Caracas quem for capaz de enunciar o questionamento de uma só política pública envolvida nessas disputas. Quase sempre, as queixas estão associadas ao preenchimento de cargos que têm chaves de cofres.
O governo Lula 3 é relativamente novo, mas
o Centrão, com suas obras e suas pompas, é velho. As duas panelas de Lira,
contudo, trazem um aviso. Toda roubalheira tem um prazo de maturação.
Geralmente, ele vai de dois a três anos. Quando nasce, é apenas uma nomeação.
Depois, vêm um convênio e uma compra. Finalmente, chega a Polícia Federal e
acha até um cofre com uma pequena fortuna na casa de um suspeito. Tome-se como
exemplo o caso dos kits de robótica.
Primeiro, sabe-se lá quando, foi nomeado
algum amigo para o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, o benevolente
FNDE. Depois, entre 2019 e 2020, as verbas foram liberadas e compraram-se os
kits. Em abril de 2022, quatro repórteres da Agência Pública mostraram que R$
54 milhões do FNDE foram para aliados alagoanos de Lira, sob a capa do
orçamento secreto. O repórter Paulo Saldaña mostrou que, à celebrada Canapi,
feudo alagoano dos Maltas, chegaram 330 kits que custaram R$ 5,4 milhões.
Canapi tinha 35 escolas, nenhuma com laboratório de ciência e metade sem
conexão com a internet.
Carimbada a roubalheira, coisa de R$ 26
milhões, a Polícia Federal entrou no caso, e ele reapareceu, um ano depois da
denúncia e provavelmente dois ou três anos depois da nomeação dos amigos para o
FNDE. A Operação Hefesto já achou R$ 4,4 milhões em 27 endereços.
Aquilo que hoje parece ser má vontade da
ministra Esther Dweck para atender a nomeações para cargos no Serviço do
Patrimônio da União ou fundos de pensões é apenas zelo. Nada tem a ver com
falta de coordenação entre os acordos feitos no Planalto e as nomeações
travadas no Ministério da Gestão. Se em algum momento tivessem sido travadas
nomeações para o FNDE, Lira não estaria passando hoje pelo dissabor de ver seu
nome associado às conexões da escalafobética compra dos kits de robótica.
Uma nomeação travada em junho de 2023 pode
estar evitando o escândalo de 2026. Existem formas decentes para ganhar
dinheiro.
Se há nomeações travadas para cargos no
Serviço do Patrimônio da União e se algum parlamentar está aborrecido com isso,
a solução é simples: basta que se divulgue o currículo do candidato preterido.
Não precisa dizer seu nome, basta o currículo.
Simples assim.
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