Folha de S. Paulo
Se passam a ideia de que tudo está à venda,
políticos desmoralizam a si mesmos
Apesar de a ministra do Turismo, Daniela
Carneiro, ter ganhado uma sobrevida,
tudo indica que o presidente Lula acabará
atendendo aos apelos do centrão e a trocará por Celso Sabino.
Se é lícito imprimir alguma picância à descrição, Lula substituiria uma aliada
de primeira hora e que tem entrada no público evangélico por um bolsonarista.
Há também uma boa chance de a Embratur, hoje presidida por Marcelo
Freixo, figura icônica da esquerda, ser cedida ao grupo de Arthur Lira.
Sabe-se que a ingratidão é um dever do político, mas, mesmo assim, acho que vale perguntar até onde deve ir o pragmatismo de um governante. Como bom consequencialista, não me oponho às negociações, compromissos e até a algum toma lá dá cá. Se todo mundo for lutar até o fim pelo que acha que é certo, o resultado seria a guerra civil. A democracia funciona porque põe os principais atores políticos para conversar, aplainando as arestas e reforçando os pontos comuns.
Ocorre que, também por razões
consequencialistas, dirigentes e partidos precisam zelar por uma identidade
reconhecível. Se passam a ideia de que tudo está à venda, desmoralizam a si
mesmos e à própria atividade política. Foi o que aconteceu com o outrora
combativo MDB, que enfrentara a ditadura.
O próprio PT experimentou um pouco disso após ver-se envolvido em escândalos de
corrupção. O consequencialismo não pode olhar só para os efeitos imediatos;
precisa avaliar também as implicações mais difusas das escolhas.
O melhor modo de enfrentar a situação,
creio, é reabrir negociações com o centrão, mas preservando esferas de
influência que possibilitarão ao governo conservar uma feição discernível.
Minha sugestão é que a pauta
ambiental e de direitos
humanos esteja entre as prioridades. Embora haja resistência no
centrão a essa agenda, ela tem a vantagem de agregar apoio internacional e de
setores que vão além do PT e da esquerda em geral.
Verdade.
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