Correio Braziliense
A derrota eleitoral e seu possível alijamento
da disputa de 2026 já estão fomentando o surgimento de lideranças de direita
mais esclarecidas e moderadas, capazes de atrair um eleitorado que ficará órfão
O julgamento do ex-presidente Jair
Bolsonaro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) foi marcado pelo ministro
Alexandre de Moraes para o próximo dia 22. Movida pelo PDT, trata-se de uma
ação por abuso de poder político e econômico ao realizar uma reunião com
embaixadores, em julho do ano passado, e atacar o processo eleitoral
brasileiro. Caso seja condenado, o que é provável, devido à evidência dos fatos
em confronto com a legislação eleitoral vigente, Bolsonaro estará impedido de
disputar quaisquer cargos eletivos, inclusive a Presidência da República em
2026. Isso mudará tudo no cenário político nacional.
O julgamento deve ser concluído ainda neste mês, antes do recesso no Judiciário. Durante o encontro com os embaixadores, no Palácio da Alvorada, Bolsonaro questionou a segurança do sistema eleitoral e apontou risco de fraude nas eleições, sem apresentar provas. Além disso, ele é alvo de 16 investigações no TSE. Sua condenação terá forte impacto no ambiente político do país, porque tira de cena o principal protagonista da extrema direita, que hegemoniza a oposição. Esse espaço político tende a ser ocupado por outra liderança de direita. O conservadorismo continua sendo a força predominante na oposição, na qual emergem novas lideranças, com destaque para os governadores de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos); Minas, Romeu Zema (Novo); e Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB).
A diferença entre o reacionarismo de
extrema direita e o conservadorismo precisa ser levada em conta. O espírito
reacionário invoca o passado para nele viver sem transformações, o que é muito
diferente da atitude do conservador, que tem o passado e suas tradições como
referência, mas busca agir no presente e construir o futuro à sua feição. A
luta para salvar um passado idílico e imaginário, como a dos saudosistas do
regime militar, em 8 de janeiro, é uma decorrência das dificuldades para
conviver com as mudanças do nosso tempo, diante da globalização e do
multiculturalismo, com suas pautas identitárias. Entretanto, tornou-se um problema
“moderno” e mundial. A direita avança no mundo.
O pensamento conservador, mesmo de viés
autoritário, tem um projeto de modernização pelo alto, que busca acompanhar as
mudanças a qualquer preço, desconsiderando seus custos sociais. Tem um caráter
mais pragmático do que ideológico, que seduz os setores da sociedade que buscam
soluções individuais para os seus problemas, sem levar em conta o contexto
geral de progresso e o bem-estar da sociedade, que são fatores de sucesso mais
amplo, mesmo para o empreendedorismo. Com a desestruturação das classes sociais
na modernidade pós-industrial, esses setores buscam uma nova identidade e são a
base natural para o surgimento de uma nova direita.
De certa forma, a derrota eleitoral de
Bolsonaro no ano passado e seu possível alijamento da disputa de 2026 já estão
fomentando o surgimento de lideranças de direita mais esclarecidas e moderadas,
capazes de conquistar um eleitorado que ficará órfão. Ou seja, a direita não
morre com a ilegibilidade de Bolsonaro, ela pode até se renovar, no leito do
antipetismo ainda majoritário na sociedade, com a emergência de uma nova
geração de políticos conservadores, no vácuo eleitoral do bolsonarismo.
Foro de São Paulo
É aí que mora o perigo para o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva, ao não perceber que a emulação sistemática com os
setores de centro, ao mesmo tempo em que deles precisa para ter sustentação
social e política, tende a isolar ainda mais o PT e a fragilizar sua relação
com os demais partidos que dão sustentação ao governo no Congresso. Lula tenta
implementar uma agenda nacional-desenvolvimentista que pode até dar algumas
respostas imediatas para a economia, mas não é a ultrapassagem para a nova
economia e sua integração nas novas cadeias globais de valor. As dificuldades
para fechar o acordo comercial com a União Europeia, nesse aspecto, são
preocupantes, mesmo com o desconto de que o lobby agrícola europeu cria
dificuldades em razão do temor à concorrência do nosso agronegócio.
Para o PT, o governo Lula está em disputa
com o centro. A realização da reunião do Foro de São Paulo, entre 29 de junho e
2 de julho, com representantes de 23 países, tende a reforçar essa tendência.
Não pelo encontro em si, pois é legítimo que os partidos de esquerda se
encontrem, mas pelo rumo político que se pretenda adotar. Criado em 1990, pelos
partidos de esquerda da América Latina, no poder em 10 países, comparecerão ao
evento delegações de México, Colômbia, Venezuela, Cuba, Nicarágua, China,
Índia, Rússia, Belarus, Chile, Argentina, Equador, Bolívia, Peru, Alemanha,
Turquia, Espanha (deve vir o primeiro-ministro), Portugal, França, EUA
(secretária de Estado), Irã e Arábia Saudita. Nesse aspecto, a intervenção do
presidente Lula no evento pode ser um divisor de águas para seu governo e a
esquerda latino-americana. Tudo dependerá da política que preconizar para a
América Latina. Se for um “aggiornamento”, aí, sim, será um fator novo, mas é
pouco provável.
O outro lado dessa moeda são os sinais
positivos de que a inflação está em queda constante, o que reforça a tendência
de redução de juros, cujo patamar freia a economia. As projeções do Boletim
Focus para a inflação de 2024 e 2025 estão em 4% e 3,9%, o que é uma excelente
notícia para o governo Lula.
A inflação caindo já ajuda muito.
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