Correio Braziliense
Se a articulação de Haddad na Câmara foi um
sucesso, a crise com o União Brasil está longe de ter sido resolvida. O centro
da disputa não é o Turismo, é o Ministério da Saúde
O ministro mais bem-sucedido do governo
Lula até agora é Fernando Haddad, da Fazenda, que está construindo a sua
própria blindagem no Congresso, com muito diálogo, capacidade de articulação e
uma orientação econômica que vem obtendo resultados positivos e mais aceitação
no mercado. A blindagem política do ministro da Fazenda foi um dos principais
fatores de sucesso do presidente Fernando Henrique Cardoso e do próprio
presidente Lula, nos mandatos anteriores.
O caso do ministro Pedro Malan é o mais simbólico, embora tivesse um perfil técnico muito mais sofisticado do que o de Haddad, que não é economista. Malan pilotou a execução do Plano Real com muito pragmatismo e firmeza, mas isso não impediu o “fogo amigo” dentro do próprio governo. A trombada mais feia foi com o ministro Clovis Carvalho, que havia saído da Casa Civil para assumir o Ministério do Desenvolvimento, no segundo mandato de FHC. Ousou criticar Malan publicamente e acabou defenestrado.
No primeiro governo Lula, o ministro
Antônio Palocci também recebeu todo apoio para dar continuidade à política de
estabilização da moeda do governo anterior, centrada no equilíbrio fiscal, no
câmbio flutuante e na meta de inflação. Era fustigado pelo então chefe da Casa
Civil, José Dirceu, mas tinha o apoio de Luís Gushiken, seu grande aliado desde
os tempos da Libelu, a irreverente tendência trotskista do movimento estudantil
paulista.
Dirceu caiu primeiro do que Palocci, mas
não por isso; eram embates entre velhos amigos. Entretanto, Dilma Rousseff, que
assumiu a Casa Civil e, depois, seria a vitoriosa candidata de Lula à
Presidência, era economista. Adversária agressiva, constrangia o ministro da
Fazenda em reuniões ministeriais, ao fazer contas com a calculadora do Nokia,
seu celular, para contestar as propostas “neoliberais” da equipe econômica, e
seus supostos impactos sociais e econômicos negativos. Seu estilo durão
transformou-a na mais poderosa ministra de Lula.
A crise financeira mundial de 2008,
provocada pelo colapso do alavancado mercado imobiliário norte-americano, mais
do que o escândalo que derrubou Palocci, favoreceu as teses
nacional-desenvolvimentistas de Dilma, que entrariam em sintonia com as ideias
do novo ministro da Fazenda, Guido Mantega. Foi a gênese da chamada “nova
matriz econômica”, uma política anticíclica que garantiu notáveis índices de
aprovação de Lula ao final de seu segundo mandato, mas acabou sendo uma das
causas do colapso econômico do governo Dilma.
O fogo amigo do PT contra a política
econômica, que marcou os primeiros 100 dias do governo Lula, foi extinto na aprovação
do novo arcabouço fiscal pela Câmara, negociado exaustivamente pelo ministro
Fernando Haddad com o relator Cláudio Cajado (PP-BA), os líderes do Centrão e,
principalmente, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Havia um
compromisso de Lira com o presidente Lula de aprovar o projeto, mas sua
conformação, que contrariou parte da bancada petista, foi produto de um amplo
acordo político.
Nota de risco
Nesta quarta-feira, antes mesmo de o novo
arcabouço fiscal ser aprovado no Senado, o governo colheu os primeiros frutos
de sua orientação econômica no mercado financeiro. A agência de classificação
de risco S&P Global Ratings alterou o rating (nota de crédito) do Brasil de
estável para positiva. Isso não acontecia desde 2019. O rating de crédito soberano,
que reflete a capacidade do país de honrar seus compromissos financeiros, foi
reiterado em “BB”. Essa classificação aponta que o Brasil está menos vulnerável
ao risco no curto prazo, mas ainda enfrenta incertezas em relação a condições
financeiras e econômicas adversas.
Haddad, no Twitter, comemorou: “Nossa
economia já demonstra uma capacidade grande de apresentar resultados positivos.
Dólar caindo, PIB crescendo, inflação sob controle e a classificação do Brasil
melhorando frente ao mundo. Ainda há muito o que fazer. Vamos em frente!”.
Aproveitou a notícia boa para afirmar que as condições para a redução das taxas
de juros estão dadas, porque a inflação deve ficar dentro da meta.
Se a articulação de Haddad na Câmara foi um
sucesso, a crise com o União Brasil está longe de ter sido resolvida. Nesta
quarta-feira, o chefe da Casa Civil, Rui Costa, que é muito criticado na
Câmara, almoçou com o líder da legenda, Elmar Nascimento (União-BA), na
residência do parlamentar. A conversa não foi boa. O parlamentar saiu do
encontro e anunciou que a legenda somente apoiará o governo quando o presidente
da Câmara, Arthur Lira, for convidado por Lula a indicar um ministro que tenha
seu apoio. O União Brasil pretende substituir a deputada Daniela Carneiro (RJ),
esposa do prefeito de Belford Roxo, que balança no cargo de ministra do
Turismo, mas vem sendo mantida por Lula. Para o governo ter o apoio de Lira, o
PP quer o comando do Ministério da Saúde.
Sei.
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