Folha de S. Paulo
Marco temporal e mudanças em ministérios
comprometem compromisso do país na área
Na segunda-feira (5), Dia Internacional do
Meio Ambiente, o presidente Lula anunciou o novo Plano de Ação para Prevenção e
Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), preparado pela equipe da
ministra Marina Silva. É a quarta atualização da estratégia responsável pela
vertiginosa queda do desflorestamento na região entre 2004 e 2012.
Naquele mesmo dia, Lula vetou trechos da
lei recém-aprovada pelo Congresso que debilitava os mecanismos de proteção da
mata atlântica. Ao fazê-lo, foi fiel ao compromisso com a agenda ambiental
afirmado no discurso de posse e reiterado perante plateias estrangeiras.
Na semana passada, porém, a coerência desfaleceu. O governo parece não ter movido uma palha para impedir, primeiro, que a Câmara aprovasse o projeto 490, o do desastroso Marco Temporal; segundo, que vingasse a não menos retrógrada medida provisória 1154, que reestruturou o governo federal, eliminando atribuições relevantes do Ministério do Meio Ambiente e o dos Povos Indígenas.
O PL 490,
que agora tramita no Senado, restringe a possibilidade de demarcação de terras
indígenas àquelas ocupadas em 5 de outubro de 1988 —quando entrou em vigor a
atual Constituição—, afrontando direitos nela explicitamente assegurados às
populações originárias. Caso seja aprovado, ficariam elas expostas à cobiça de
todo tipo de predador ambiental: grileiros, madeireiros, mineradores e
traficantes de animais, drogas e pessoas. Se isso ocorrer, seriam afrontados os
próprios objetivos do PPCDAm anunciado pelo governo com justificada ênfase.
A explicação corrente para esse retrocesso
–que é atribuído ao direitismo hegemônico no Congresso e à força da chamada
bancada ruralista– está longe de convencer.
Não há dúvida de que a amplitude de ação do
governo nas relações com o Legislativo se estreitou. Nas duas Casas, onde reina
a direita, os líderes têm mais cacife para pressionar o Executivo, e a
fragmentação nas bancadas parece maior. Resultado: tornou-se mais trabalhoso
manter coesa a heterogênea coalizão governante.
Entretanto, mesmo no passado, quando as
engrenagens do presidencialismo de coalizão eram mais azeitadas, o poderio do
Executivo sempre dependeu da clareza com que o titular da vez definia suas
prioridades e da sua determinação em construir maiorias políticas ao seu redor.
Tudo isso faltou aos articuladores do governo na tramitação do marco temporal e
da mudança nos ministérios. Enquanto a questão ambiental –sobre a qual uma
coisa e outra incidem– não estiver de fato entre os compromissos pétreos do
governo, a porteira por onde passa o atraso seguirá entreaberta.
*Professora titular aposentada de ciência
política da USP e pesquisadora do Cebrap.
Com esse congresso nada é simples.
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