O Globo
O choro por Daniela do Waguinho não tem o
mesmo peso político do choro que frequentemente toma conta de Lula quando ele
fala de pobreza e de desigualdade
O presidente Lula chorou na reunião em que
demitiria Daniela do Waguinho do Ministério do Turismo. Alguma coisa está
errada nesse emocionalismo excessivo. Os dois, Waguinho e Daniela, nunca foram
petistas, nem próximos a Lula. A saída do ministério não se deu por uma crise
daquelas sérias, que deixam sequelas em velhos amigos, como sempre acontece nos
governos.
Nem o ministério tem importância, infelizmente. A ponto de ser dado para uma deputada que nada tem a ver com o assunto, que agora será sucedida por outro deputado, que também não entende nada de turismo. Não me lembro de Lula ter chorado quando o então todo-poderoso ministro José Dirceu teve de se demitir da Casa Civil em meio à crise do mensalão. Nem mesmo quando vários deputados, esses sim, chorando, saíram do PT em protesto contra a corrupção escancarada.
Não há razão aparente para o choro do
presidente. Pelo menos o choro por Daniela do Waguinho não tem o mesmo peso
político do choro que frequentemente toma conta de Lula quando ele fala de
pobreza, de desigualdade. Esses choros, que foram frequentes durante a campanha
presidencial, têm sentido, combinam com as preocupações sociais que basearam a
carreira política de Lula.
Chorar por tão pouco — por Waguinho, que
nem lhe deu uma vitória em seu território eleitoral, Belford Roxo, no Rio; por
um ministério que não tem peso político nem é fundamental no seu plano de
governo — é sinal de que a pressão está sendo sentida, por maior que seja sua
experiência. Lula, por mais que soubesse que o país está dividido, achava que
uma vitória abriria caminho para impor-se como se impusera noutros tempos.
Não é o caso, porque a maioria do Congresso
é do Centrão, e em proporção maior que a revelada pelas urnas. Como o governo
petista não sabe lidar com outros partidos a não ser em condições de hegemonia,
não conseguiu refletir no Congresso a margem mínima que o levou de volta ao
poder.
Quando Fernando Henrique levou o PFL para
seu governo de coalizão, em 1994, foi um escândalo nos meios políticos. Foi um
governo de centro-esquerda, mas onde os políticos da direita tinham vez e voz,
sem precisar abrir espaço para a extrema direita. Esse governo de coalizão foi
se deturpando ao longo do tempo, se transformando em mero organizador das
demandas fisiológicas dos partidos que, não sendo de esquerda, davam seus votos
em troca de verbas e cargos.
Hoje, depois que os partidos descobriram
sua força e, sobretudo, tiveram o gostinho de assumir o poder real durante os
governos Temer e Bolsonaro, o jogo entrou noutro patamar. Talvez por isso Lula
chore. Há quem considere um exagero dizer que Lula não tem projeto de governo.
Ele todo dia lança um programa, um projeto, argumentam. Sem notar que todos os
programas já lançados são repetições do já feito há 20 anos, importantes a
maioria, outros bizarros, como copiar o carro popular do Itamar.
O projeto para o futuro está na Amazônia,
na ocupação da selva pelos técnicos, cientistas, na criação de empregos na
região marcados pelas energias renováveis do futuro. Engraçado o presidente da
Câmara, deputado Arthur Lira, lamentar que Lula não assuma a condição de
candidato à reeleição presidencial. Claro que ele quer uma sinalização para ver
para que lado o vento poderá soprar mais adiante.
A proposta de reeleição, que o próprio
Fernando Henrique já admitiu ter sido um erro para um país como o Brasil,
nasceu com o propósito de manter o Plano Real. Acabou se transformando num
instrumento de manutenção do poder, sem nada a ver com projeto de futuro do
país. É um projeto de futuro dos políticos envolvidos na disputa presidencial.
E agora, nem isso. Vai servir para colocar um bolsonarista num governo petista.
Era só o que faltava.
O Lero Lero de Lira.
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