O Globo
Presidente do Senado topa correr com MP,
engavetar marco temporal e votar Zanin para o STF, mas com qual expectativa?
Diante da humilhação pública imposta por
Arthur Lira a Lula na votação da Medida Provisória da estrutura do governo, a
rapidez e a facilidade com que a proposta tramitou no Senado transformou
Rodrigo Pacheco numa espécie de salvador da pátria do governo.
Não foi só na votação da MP que Pacheco
levou alívio a um governo que estava nas cordas na Casa vizinha. Ele também
confirmou a expectativa de que o Projeto de Lei que estabelece o marco temporal
para demarcação de terras indígenas não correrá no Senado como na Câmara. E
listou outras propostas que retiravam direitos dos povos originários que não
prosperaram com os senadores.
Por fim, tudo leva a crer que a indicação
de Cristiano Zanin ao Supremo Tribunal Federal, enfim confirmada para surpresa
de ninguém, será aprovada com agilidade e tranquilidade na Casa, sem o sufoco
que Davi Alcolumbre impôs ao último nomeado para a Corte, André Mendonça.
O que explica a boa vontade de Pacheco com Lula, que destoa de maneira tão explícita do jogo bruto de Lira? E, principalmente: será possível esperar que o presidente do Senado mate no peito todas as bolas quadradas do governo?
Aliados do presidente do Senado não
escondem que seu sonho seria chegar ao STF. Houve discreta movimentação nesse
sentido com uma ideia meio maluca de fazer um combo “dois em um” e esperar a
aposentadoria de Rosa Weber, em outubro, antes de aprovar o sucessor de Ricardo
Lewandowski. O cálculo, segundo os que venderam esse balão de ensaio, seria
forçar Lula a indicar Pacheco na outra vaga para que o Senado não impusesse uma
derrota a Zanin.
Mas não será simples para o presidente
indicar outro homem branco para a Corte depois de nomear seu próprio advogado
de defesa na primeira oportunidade — e dizer, alto e bom som, que não tomou a
decisão “apenas” porque Zanin o defendeu na Lava-Jato.
A própria presidente do Supremo, Rosa
Weber, que nunca manda recado algum e raramente dá qualquer declaração, usou um
encontro com o presidente da Finlândia, Sauli Niinistö, para dizer que a
representação feminina na cúpula do Judiciário é “ínfima”. A cobrança em cima
de Lula se intensifica também entre os juristas que apoiaram sua candidatura,
e, até outubro, a pressão pela escolha de uma mulher, de preferência uma mulher
negra, será imensa.
Se continuar a atuar como goleiro de um
governo com zaga e ataque dizimados, Pacheco pode querer se cacifar com uma
lista de serviços prestados, mas seria um peso simbólico gigantesco para Lula
ser o presidente que reduziu, em vez de ampliar, a participação feminina na
mais alta Corte de Justiça.
Há outros riscos no horizonte da
articulação política no hoje cordato Senado Federal. Caso cumpra um dos desejos
de Lira e mexa na composição do ministério, desalojando os indicados do União
Brasil que até agora não justificaram a nomeação, Lula poderá se indispor com
Davi Alcolumbre, padrinho de ao menos dois deles e um operador que lembra mais
o estilo do presidente da Câmara que de seu sucessor no comando do Senado.
Basta lembrar que o senador do Amapá já pôs
a boca no trombone diante da negativa do Ibama para a prospecção de petróleo em
seu estado e ajudou a colocar várias das maldades na MP dos ministérios, na
função de presidente da comissão especial que analisou o texto.
Pode parecer ao leitor que a fulanização de
personagens do Congresso é de menor relevância, mas ela é crucial quando se tem
um governo fraco na articulação política, que depende da benevolência do
comando das duas Casas para ver sua pauta avançar e não ser surpreendido com
outras que são a completa negação de seu programa.
O mar no Senado, por enquanto, é menos bravio
que na Câmara. A dúvida é quanto dessa calmaria vem da esperança de Pacheco de
que poderá ser reconhecido lá na frente. E em que medida a frustração dessa
expectativa poderá mudar a maré.
Pois é.
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