quarta-feira, 7 de junho de 2023

Vinicius Torres Freire - O aumento do imposto de Lula 3

Folha de S. Paulo

PIB maior e vitórias em disputas tributárias devem melhorar situação das contas públicas

Há indícios de que o acerto nas contas do governo neste ano pode dar mais certo do que estimam economistas do setor privado, em geral de instituições financeiras ou similares, mas não apenas.

Os motivos do otimismo são o crescimento da economia maior do que o previsto para este 2023 e o aumento das chances de sucesso de arrecadação extra, com as medidas do ministério da Fazenda.

E daí?

Se as contas do primeiro ano de Lula 3 ficarem mesmo menos no vermelho, devem cair as taxas de juros no atacadão do mercado de dinheiro, onde se definem as taxas de juros cobrados do governo, grosso modo o piso das demais taxas da economia —por exemplo. Isto é, se não houver outros acidentes no percurso.

Dar certo ou menos errado quer dizer que o ministério da Fazenda pode chegar mais perto de sua meta de déficit primário para este ano. O objetivo, anunciado com o teto de gastos de Lula 3, o dito arcabouço fiscal, é de déficit de 0,5% do PIB, uns R$ 50 bilhões em 2023 (receitas menos despesas, desconsiderados gastos com juros da dívida pública). Na previsão mais recente do próprio governo, o déficit deste ano seria de R$ 136 bilhões.

Um PIB maior em geral implica receita maior de impostos. Um efeito ainda maior viria do dinheiro extra que renderiam as providências anunciadas desde janeiro pelo ministério da Fazenda. As contas do governo estão mais otimistas do que na ocasião em que essas medidas ou fontes de recursos foram anunciadas. Há decisões favoráveis da Justiça e do Congresso.

Gente razoável de "o mercado" e outras, não está considerado parte relevante desse dinheiro nas contas do déficit. Essa diferença em relação à estimativa do governo pode ir de 0,5% do PIB a 1% do PIB.

A fim de resumir uma história muito enrolada, duas dessas fontes importantes de receita devem-se ao fato de o ICMS (imposto estadual) afetar a arrecadação federal. Um emaranhado de medidas de governos estaduais (a maioria de fato estapafúrdia), leis (parte delas marota) e decisões judiciais modificava a forma como o ICMS alterava o cálculo do imposto federal e, assim, o que as empresas deviam ao fisco.

Deu-se ao limite de uso de benefícios fiscais do ICMS na base de cálculo de IRPJ e CSLL e ao uso da dedução do ICMS na base de cálculo de PIS/Cofins. Para a Fazenda, daí podem vir cerca de R$ 90 bilhões em um ano. O dinheiro começa a entrar em meados do ano. A Receita começa a chamar as empresas para pagar.

Outra fonte subestimada deriva do fim de uma artimanha para subfaturar exportações de modo a pagar menos imposto, mumunha condenada internacionalmente (a querela do "preço de transferência"). Daí viriam, de início, em torno de R$ 20 bilhões por ano.

O plano de redução dos contenciosos, litígios, com a Receita, renderia mais do que os R$ 20 bilhões estimados no início do ano (serão pagos mais adiante, em 2023). Há outras fontes de receita extra.

Economistas e, em especial, advogados de empresas dizem que não é bem assim. Haveria novas judicializações, protelações de outra ordem e o processamento desses débitos seria incerto ou demorado —é assunto para outro dia.

Mudanças do comportamento do contribuinte podem afetar a receita. Quando impostos mudam, podem mudar preços, decisões de compra, de investimento e resultados de empresas. Tudo isso pode ter efeito negativo. Trata-se, enfim, de aumento de carga tributária, por mais justa que seja a alta de imposto devido e ainda que não tenham sido criados novos tributos ou que alíquotas não tenham sido elevadas.

A Fazenda parece convicta de que o governo vai arrecadar e tem indícios positivos. Se não vier o tanto de dinheiro que previu, diz que tem "plano b e c".

 

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