sábado, 22 de julho de 2023

Alvaro Costa e Silva - Inimigo nº 1 do bolsonarismo

Folha de S. Paulo

Ataque a Alexandre de Moraes é padrão da civilidade brasileira

Dono de um ouvido absoluto para descobrir os segredos mais escondidos da música popular, Ivan Lessa detestava assobios. Melhor dizendo, ele detestava o assobiador inconveniente, mesmo que o sujeito conseguisse reproduzir, soprando ar entre os lábios em bico, a beleza de um choro de Pixinguinha ou de um samba de Ary Barroso.

"Aquele camaradinha que gostava de assobiar e assoviar na intimidade forçada e sem graça das pessoas estranhas reunidas pelo maldito acaso num elevador. Esse tipo, além do mais, se fazia acompanhar batucando na parede sonora de um Otis ou Schindler. Nós outros não tínhamos como assassiná-lo. Ou seria eu apenas que não tinha?", escreveu Ivan numa crônica cruel.

Mata-se hoje por muito menos, e assobiar em público, diante de outras atitudes mais cafajestes, revestiu-se de elegância. O normal é a desatenção, a descortesia, a boçalidade, a estupidez —tudo engrossado pelo caldo da ideologia, do falso instinto de liberdade, da reação ao que é identificado como sistema. "Abaixo o sistema, abaixo o mecanismo", repetem nas redes sociais os vingadores. Se estão em bando, eles são ainda piores e capazes de ação violenta, depredando as sedes dos Três Poderes ou arrumando barraco com ministros do STF.

A intimidação política de que foi vítima Alexandre de Moraes —eleito o inimigo nº 1 do bolsonarismo— no aeroporto de Roma é o padrão da (in)civilidade brasileira nos dias que correm: gritos de "bandido", "comunista", "comprado" e sopapos na cara.

Não serve de alívio, mas esse tipo de ataque não é bem uma novidade nem uma exclusividade nossa. Nos anos 1980 o escritor cubano Guillermo Cabrera Infante foi insultado dentro de um avião da Iberia —"Gusano!"— por sua posição anticastrista. Sua mulher, a atriz Miriam Gómez, tentou responder à agressão; G. Cain a impediu: "Miriam, não discuta com essa gente cafona. Eles não têm nada na cabeça".

 

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