Há um mês, na expectativa de ampliar o escopo de sua influência regional, o brasileiro reuniu-se com presidentes de dez países latino-americanos. Suas ideias, pouco explícitas, foram aplaudidas por três ou quatro, mas ganhou a contestação de outros. As derrapadas retóricas do novo chefe do Estado do Brasil terminaram por abalar sua credibilidade também na Europa e nos EUA. Sua opinião sobre a invasão da Ucrânia foi apenas um detalhe.
Lula foi vaiado em Portugal, na
Espanha, e gerou uma mal estar na França, ao contestar o texto do acordo
que os europeus oferecem, ao declarar publicamente que se tratava de
algo com perfil neocolonial. Assim, teve uma recepção fria entre os franceses,
que se recusam a adquirir na América Latina produtos considerados prejudiciais
à luta contra o aquecimento global. Indignado, o presidente brasileiro
denunciou o” protecionismo" dos europeus.
Viu-se, por sua vez, sentado numa bomba relógio, já que os quatro países do Mercosul são exportadores de matérias primas minerais, o que envolve indiretamente a exploração em áreas ambientais protegidas no Brasil; e de produtos agropecuários, justamente os que emergem do agronegócio, aqueles que asseguram o superávit da balança comercial brasileira. Ao retornar, teve de anunciar, ambiguamente, uma nova linha de crédito, via BNDES, da ordem total de dois bilhões para o setor agrícola. Tentou compensar, ainda, dissertando otimista sobre as doações estrangeiras para o fundo de proteção da Amazônia, para o qual existem apenas promessas.
Ao mesmo tempo, está batendo de frente com problemas estratégicos e ideológicos. O primeiro é a defesa da reincorporação da Venezuela ao bloco do Mercosul, banida desde o país tornou-se explicitamente uma ditadura. Obscura ainda é a pretensão de incorporar o Mercosul, um acordo comercial, na UNASUL - União da Nações Sul Americanas, que é um bloco, meio que desativado, com finalidades políticas. Essa anexação envolveria também países da Aliança do Pacífico (México, Colômbia, Peru, Equador, Chile) buscando uma política comum com o outro lado do Pacífico - Japão, China, Rússia, Austrália, Nova Zelândia.
Nem Dom Quixote pensou em algo tão complicado e ardiloso. Na sua pretensão de gerar uma outra alternativa de governança fora do comunismo mas também do liberalismo, Lula sonha em unificar politicamente o continente. Mas não tem nenhuma proposta a oferecer, senão uma mistura de ideologias alienígenas com um pouco da criatividade sertaneja. Falta originalidade e, talvez, até mesmo conseguir a confiança dos pares. Autoproclamado como um grande ator na política internacional tem para si que o BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) será a grande organização que vai deslanchar uma nova governança global. E, assim, está em plena campanha para unir todos ao redor em torno do Brics e fortalecer a sua organização, de tal forma que se possa oferecer soluções fora não apenas da ONU-Organização das Nações Unidas, mas também a OEA- Organização dos Estados Americanos, do FMI -Fundo Monetário Internacional, do Banco Mundial e até do dólar como moeda de lastro para as transações comerciais internacionais.
No caso da Venezuela, só mesmo Lula e seus assemelhados, também confusos, a exemplo dos peronistas, aceitam o regime venezuelano como algo democrático - "A Venezuela faz mais eleições que no Brasil"-, declarou o brasileiro, ignorando que o ditador Nicolas Maduro assinou atos nesses últimos dias proibindo a candidatura de lideranças oposicionistas que possam ameaçar a estabilidade do seu regime autoritário, e que já aprovou leis permitindo sua eterna reeleição. Um desafio para a história.
No acordo do Mercosul, assinado em Ushuaia,
nos sul da Argentina, firmou-se o Compromisso Democrático do Mercosul, no qual
se estabeleceu que só podem ser membros do Mercosul países que adotem regime
democráticos, o que, na ocasião, levou a suspensão do Paraguai, e a também
enganosa incorporação da Venezuela ao Acordo regional. A ideia da absorção do
Mercosul pela Unasul, saiu da cabeça de Hugo Chavez, em nome de suas
ideias bolivarianas, e teve o apoio imediato de Dilma Roussef (Brasil),
Cristina Kirchner(Argentina), e Pepe Mujica (Uruguai). Pretendia-se ampliar
seus benefícios, mas, no fundo, o que Chavez, um inconsequente, queria mesmo era desarticular
o Mercosul, praticamente o único acordo regional de sucesso na história da
América Latina.
A assessoria de Lula vem investindo em
torna-lo porta-voz da América Latina nessas maquinações mundiais ideologizadas.
Mas o cenário não é tão favorável assim com pensam seus articuladores filosóficos.
Primeiro, o Fórum de São Paulo, surgido no passado de uma conversa entre Lula e
Fidel Castro, até mesmo para esvaziar o avanço chavista pelo continente,
conseguiu criar, com ideias e organizações exóticas, a sua própria identidade
contrária à estabilidade política democrática das sociedades regionais,
reunindo partidos de esquerda e excêntricas e "miliciosas" organizações.
Segundo, não conta com a simpatia dos governantes de mais da metade dos
países da AL. É algo que age à margem das instituições.
Sua última visita à França para negociar com Macron o Acordo do Mercosul com a União Europeia, com o fim de anunciá-lo na sua posse, já que Alberto Fernandez, da Argentina, não convenceu, foi recebida com desconfiança pelos franceses. Os jornais abriram manchetes dizendo que Lula não era parceiro do Ocidente, lançando-se dúvida até sobre o perfil e o caráter do brasileiro. Esta semana, Lula voltaria a derrapar na sua fácil retórica, ao voltar a defender o regime da Venezuela, como se fora essa a sua preferência governativa, ao defini-lo como o” democracia relativa", estigma que foi configurado conceitualmente no Brasil pelo ditador general Ernesto Beckmann Geisel. Os europeus temem repetir a derrapagem de Obama.
*Jornalista e professor
Uma crítica sincera ao Lula.
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