sábado, 1 de julho de 2023

Hélio Schwartsman - Bolsonaro inelegível é a democracia se defendendo de ataques

Folha de S. Paulo

Decisão do TSE foi correta porque ex-presidente é insofismavelmente golpista

Como se esperava, o TSE tornou Jair Bolsonaro inelegível por oito anos. Foram cinco votos contra dois. O que isso significa para a democracia?

Considero a decisão da corte eleitoral correta, mas daí não decorre que ela não encerre problemas. O mais grave, creio, é que ela debilita um dos pilares da democracia, que é dar a todos os grupos existentes na sociedade a oportunidade de disputar eleições e eventualmente chegar ao poder. É essa possibilidade que faz com que democracia sirva para evitar a violência política. Pelo menos para os principais atores, é preferível passar um período na oposição e um dia talvez voltar ao comando a agarrar-se ao poder pela força, situação em que correria riscos existenciais em caso de derrota.

Ao privar a direita radical de seu candidato mais carismático, o TSE se afasta um pouco desse princípio. Mas é bom frisar o "um pouco". A facção política de Bolsonaro não foi proscrita nem inviabilizada. Basta encontrar um outro postulante e submetê-lo ao crivo popular. Se vencer, assumirá, como o próprio Bolsonaro assumiu em 2019.

O que me faz concordar com a decretação de inelegibilidade é a ideia, nuclear para a vida em sociedade, que malfeitos precisam ser punidos, sob pena de serem normalizados. E Bolsonaro, perdoem-me seus advogados, é insofismavelmente golpista. Defendeu o golpe de 64, a desobediência à Justiça, mentiu sobre as urnas eletrônicas —e poderíamos prolongar a lista. Se fosse só um indivíduo propalando ideias esdrúxulas, acho que tolerá-las estaria no preço que se paga pela liberdade de expressão.

Só que Bolsonaro fez mais do que isso. Ele usou a estrutura da Presidência para atacar a democracia, o que caracteriza um abuso. Não dá para aceitar que um dos Poderes da democracia se volte contra ela e que o responsável por esse curto-circuito lógico não sofra nenhuma sanção. A democracia deve ser tolerante, mas tem a obrigação de defender-se de ataques.

 

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