Valor Econômico
Alexandre de Moraes sai do episódio com uma
renovada união do Supremo em torno de si
O ex-presidente Jair Bolsonaro é o maior
perdedor do incidente da sexta-feira no aeroporto de Roma. O tira-teima das
versões sobre o ocorrido depende das imagens do aeroporto requisitadas pela
Polícia Federal, mas parece improvável que o ministro Alexandre de Moraes
viesse a colocar sua reputação - e seu mandato - em risco inventando uma agressão
contra si e sua família.
Se ainda não se sabe quantos foram os envolvidos nas agressões, não parece haver dúvida sobre os crimes pelos quais podem vir a responder - de lesão corporal, crime contra a honra e injúria, até ameaça contra o estado democrático de direito. No limite, se juntarão às centenas de presos pelos atos de 8 de janeiro e darão argumentos aos representantes mais extremados do bolsonarismo no Congresso Nacional que a causa ainda arregimenta eleitores a enfrentar riscos em sua defesa.
Já Bolsonaro não tem nada a ganhar. O
ex-presidente já baixou o tom e o grau de exposição na expectativa de que a
inelegibilidade baste como penalidade. E investe fortemente na estratégia da
vitimização. Concorrem para isso a narrativa, fartamente explorada nas redes
sociais, dos presos do 8 de janeiro apartados de familiares - em quem não
pensaram quando dispararam para vandalizar a sede dos Poderes em Brasília - e,
principalmente, declarações como a do ministro Luís Roberto Barroso.
No congresso da União Nacional dos
Estudantes (UNE), dois dias antes do incidente do aeroporto de Roma, Barroso
usou o verbo “derrotar” na primeira pessoa do plural para bradar a vitória
sobre o bolsonarismo. Ainda tentou se desculpar, mas já tinha movido o moinho
da estratégia do ex-presidente.
Moraes ganha fôlego em meio à crescente
disputa em Brasília pelas vagas no Judiciário
O que as imagens do aeroporto de Roma estão
por comprovar foi o inverso. Não se tratava de Alexandre de Moraes em comício
nem de seu desdém contra “manés” apoiadores de Bolsonaro. Ali estava um
ministro do Supremo que, acompanhado de sua família, tentava embarcar num avião
quando começou a ouvir xingamentos contra si e contra sua família. E ainda
assistiu o filho, também Alexandre, que foi tomar satisfação, levar um empurrão
e um tapa, como contou à Polícia Federal.
O episódio é particularmente danoso para o
ex-presidente porque concomitante com o desarquivamento, pelo ministro do STF,
Gilmar Mendes, do processo que apurou a condução dada ao enfrentamento da
pandemia. O desarquivamento não apenas desafia a determinação do
procurador-geral da República, Augusto Aras, em ser reconduzido ao cargo como
expõe o isolamento de Bolsonaro.
Se o ex-presidente ainda tem apoio popular,
os votos crescentes de parlamentares do PP e do PL a projetos do governo e,
principalmente a avidez de ambos os partidos por cargos, desidratam o apoio
institucional de que Bolsonaro precisa para enfrentar os tribunais.
Colabora para isso a inconsistência de
declarações como aquelas de dois de seus ex-ministros, os senadores Ciro
Nogueira (PP-PI) e Tereza Cristina (PL-MS), de que a adesão de correligionários
ao governo Luiz Inácio Lula da Silva não representa seus partidos. Horas antes
do episódio no aeroporto de Roma, outro ex-ministro bolsonarista, o senador
Rogério Marinho (PL-RN), líder da oposição no Senado, havia chorado na reunião
da Comissão de Segurança da Casa que tratava dos presos de 8 de janeiro. Isso
não o impediu de, horas depois, condenar a agressão no aeroporto de Roma.
Tereza Cristina limitou-se a retuitá-lo e Ciro Nogueira, a ficar calado.
Se a violência recalcitrante trazida pelo
episódio do aeroporto italiano não favorece a base bolsonarista no Congresso,
tampouco tem potencial para mobilizar os ministros indicados pelo ex-presidente
para o Supremo Tribunal Federal. Se André Mendonça já foi até homenageado pelo
grupo Prerrogativas, Kassio Nunes Marques tem interesses muito concretos nas
indicações para tribunais superiores - incumbência exclusiva do presidente da
República. Nenhum dos dois ministros tem perfil para exercer mandato debaixo de
chuva como o fez o ex-ministro Ricardo Lewandowski sob os governos Michel Temer
e Jair Bolsonaro.
Se Bolsonaro, definitivamente, não tem o
que ganhar com a arruaça de Roma, Alexandre de Moraes sai dela com uma renovada
união do Supremo em torno de si. A liderança do ministro na Corte decorre, em
grande parte, de sua atuação em defesa do colegiado e o episódio só a reforçou.
Este apoio o fortalece na condução dos inquéritos contra o bolsonarismo sob sua
relatoria no Supremo e na sua interlocução junto ao presidente da República
para a composição dos tribunais. Moraes ganha fôlego em meio à crescente
disputa em Brasília pelas vagas que se abrem no Superior Tribunal de Justiça,
na Procuradoria-Geral da República e na própria Corte que integra.
Pois é.
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