quinta-feira, 13 de julho de 2023

Míriam Leitão - O bom cenário e as perspectivas

O Globo

A queda forte dos preços no atacado é parte da caminhada para a meta de inflação e da garantia de um bom segundo semestre

A inflação vai subir nos próximos três meses, mas isso não vai alterar as projeções de queda no médio prazo. A pequena deflação de junho não surpreendeu, mas consolida outro cenário para a conjuntura, totalmente diferente de há um ano, com uma série de efeitos positivos e melhora nas perspectivas da economia. É em parte resultado da política monetária, mas não só. Tem também os vários acertos da política econômica que, aliás, provocaram uma reviravolta na perspectiva do mercado financeiro. E, além disso, houve a safra agrícola. O economista José Roberto Mendonça de Barros avisa que há boas indicações para frente, com o derretimento dos preços no atacado.

— No nosso acompanhamento diário das cotações no atacado, a gente vê o quanto é importante mesmo essa evolução recente. Só para você ter uma ideia, a variação até 10 de julho no atacado deste ano contra o ano passado mostra os seguintes números de queda de preços: algodão caiu 36%, café 22%, milho, 20%, trigo, 17%, boi gordo, 17% e bezerro, 21%. De relevante só o que subiu foi o arroz, 21% por causa da safra ruim no Rio Grande do Sul e o suíno que havia caído demais no ano passado. É impressionante a força da queda no atacado agrícola e é isso que está chegando no varejo e tem mais para chegar — me disse ele.

O IPCA de junho já trouxe queda de 0,66% nos alimentos e bebidas e de mais de 1% em alimento no domicílio. José Roberto chama a atenção para os efeitos na faixa mais pobre da população.

— Essa queda dos preços agrícolas é a coisa mais consolidada, além da aprovação da reforma tributária, para o processo de caminhar na direção da meta de inflação. É uma queda forte e consistente, porque se inicia na oferta, do custo de alimentação, o que equivale a um delta no salário para as classes, C-, D e E. E vai ter efeito para frente.

Na base da pirâmide social, os preços em queda provocarão melhora na qualidade de vida. Esse ambiente também permitirá a queda dos juros com todo o efeito positivo que isso passará a ter. No topo da pirâmide, a Faria Lima começa a olhar o governo e, principalmente, o ministro Fernando Haddad com outros olhos. A virada de humor captada pela Genial/Quaest, que divulguei ontem cedo no meu blog, é impressionante. Em março, entre 94 gestores, economistas e analistas de mercado financeiro ouvidos na pesquisa, 90% faziam avaliação negativa do governo. Em maio, 86%. Agora, 44%. Mas o recordista de salto olímpico foi o ministro da Fazenda. Apenas 10% dos integrantes do mercado financeiro avaliavam positivamente o trabalho de Haddad em março. Esse número passou para 26% em maio e agora foi para 65%. Em março, 98% dos entrevistados diziam que a política econômica estava na direção errada, em maio, 90%, e agora 53%. Os que acham que a direção está certa eram 2%, agora 47%.

O que mudou tão radicalmente? Como eu escrevi quando saiu a primeira rodada da Genial/Quaest, os operadores de mercado financeiro estavam se deixando levar por ideias preconcebidas do que seria a política econômica do ministro Haddad. Como a maioria do mercado votou no candidato que perdeu a eleição, estavam analisando com o fígado, ou, ideologicamente. O que depõe contra a objetividade que devem ter os que administram o dinheiro alheio. Até porque eles tomam decisões com base em suas expectativas e acabam tornando realidade as profecias que fazem sobre os preços dos ativos. Em março, 78% achavam que a economia iria piorar, agora só 21%. Os que acham que vai melhorar são 53%.

E vai melhorar? A inflação vai subir nos próximos três meses porque houve deflação em julho, agosto e setembro do ano passado com a desoneração dos combustíveis feita como manobra para ganhar os votos da classe média para Jair Bolsonaro. Quando esses números saírem da conta, mesmo a inflação mensal sendo baixa haverá uma alta do acumulado. Mas o número do final do ano está ficando cada vez mais perto do teto da meta, 4,75%. Para 2024, as previsões são de inflação na meta. Os juros vão cair a partir de agosto em todas as reuniões do ano. Esse início do ciclo de afrouxamento da política monetária tem efeitos diretos na economia. A reforma tributária passará agora pela etapa do Senado e é possível que seja aperfeiçoada. Os preços de alimentos, como disse Mendonça de Barros, devem continuar cedendo, o que melhora a renda das famílias mais pobres. Sim, a economia pode ter um bom segundo semestre.

 

Um comentário: