sexta-feira, 7 de julho de 2023

Vinicius Torres Freire - O duelo de titãs afundados

Folha de S. Paulo

Bolsonaro versus Tarcísio ou chutes sobre preços não são o assunto da Reforma Tributária

No jorro de notícias e conversas fiadas sobre a Reforma Tributária, dá-se grande importância à pinimba entre Tarcísio de Freitas e Jair Bolsonaro. Hum.

O capitão das trevas gostaria de derrubar a mudança dos impostos porque, quando não é um parasita, quer depredar "o sistema" ou espalhar imundície por onde quer que exista vida civilizada. Como Freitas passou a negociar um acordo com os adeptos da reforma, os Bolsonaro convocaram a seita deles para dar uma surra digital no governador de São Paulo, até a semana passada um vassalo nominal do bolsonarismo.

O assunto tem ainda menos relevância prática do que essas conversas equivocadas e chutes sobre qual bem ou serviço vai custar mais ou menos com a Reforma Tributária, se o "streaming", o bombom, o remédio, o jet-ski ou sei lá o quê. Não saberemos tão cedo. O assunto central não é esse, é a aprovação do imposto sobre valor agregado com a maior uniformidade possível. O resto vai depender da longa e complicada implementação da reforma, se passar.

A implicação política mais importante da reforma, caso passe, seria o fortalecimento do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, "tudo mais constante". Isto é, caso o governo não faça besteira maior ou consiga arrumar dinheiro para reduzir seu déficit; caso a economia mundial não vá para o vinagre ou os juros possam cair no mundo rico. Etc.

A refrega e os prognósticos exaltados sobre a "divisão da direita" fazem a gente lembrar das peripécias da historinha de Sergio Moro.

O ex-juiz foi escorraçado com humilhação do ministério de Bolsonaro em abril de 2020. Acusou seu ex-chefete de meter a mão na Polícia Federal. Foi ameaçado de linchamento virtual, tal qual Freitas. Mas, já em outubro de 2022, Moro estava nos debates dos candidatos a presidente, carregando a mala de Bolsonaro, quando foi comparado ao candidato Padre Kelmon.

Sim, Moro não tinha alternativa política. Levara rasteiras vexaminosas de políticos profissionais e não conseguira ser candidato a presidente. A Lava Jato fora desmoralizada, em grande parte por obra de Moro, além de espezinhada pelo sistema jurídico-político. Não conseguiu ser candidato a senador por São Paulo. Elegeu-se pelo Paraná, no União Brasil, mas faz parte da turma do fundinho do Senado, isolado. Tarcísio de Freitas é governador de São Paulo.

Sim, a situação política de Moro e Freitas foi diferente. Mas, em 2024 ou em 2026, sabe-se lá o que será de Bolsonaro e de Freitas, ex-coadjuvante de "lives" infames do presidente das trevas. Sabe-se lá se haverá justiça, se Bolsonaro acabará na cadeia ou banido por mais tempo das eleições.

Quase impossível prever se Freitas vai conseguir escapar desse triturador de políticos e candidaturas que é o governo paulista. Se conseguir, pode até juntar a direita negocista mais normal, como está se arranjando na política desertificada de São Paulo, dependendo menos de Bolsonaro. Mesmo assim, pode não ter vontade de botar o nariz para fora na eleição de 2026 caso Lula 3 seja sucesso de público e crítica.

Em resumo, pode ser que o capitão das trevas e o candidato a capitão da direita paulista até venham a se arranjar, a depender do interesse do negócio.

Por ora, Bolsonaro não tem força política nem mesmo para influenciar o PL a fechar questão contra a Reforma Tributária. Não apita nada.

O PL o guarda no banco ou quem sabe na geladeira, para ver se o ferrabrás das cavernas ainda será uma marca vendável nas próximas eleições ou um agitador de massas útil no caso de Lula 3 adernar. Por ora, não passa de um investimento que teve rentabilidade no passado, o que não é garantia de rentabilidade futura, como se lê em prospecto de aplicação financeira.

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