sexta-feira, 4 de agosto de 2023

Bruno Boghossian - A grama do vizinho

Folha de S. Paulo

Equilíbrio entre centrão e outros partidos da coalizão pode desaguar em mudança mais ampla no futuro

A arrastada negociação para o embarque do centrão no governo envolve uma concorrência dentro da futura base de Lula. A disputa passa pelo mercado imobiliário da Esplanada, com o espaço cobiçado pelos novos inquilinos e o tamanho do terreno ocupado por antigos moradores.

Na montagem do governo, Lula deu nove ministérios a partidos que não haviam feito parte de sua aliança eleitoral: MDB, PSD e União Brasil. Entraram no pacote latifúndios políticos como Cidades, Agricultura e Desenvolvimento Regional, com peso grande na distribuição de verba para os redutos dos parlamentares.

Nenhuma das três legendas devolveu uma quantidade de votos que deixasse o Planalto perto de uma maioria no Congresso. Lula pode alcançar essa marca com a adesão do PP e do Republicanos, mas a barganha feita pelo governo na escolha das pastas que esses partidos vão ocupar incomodou o centrão.

O grupo de Arthur Lira enxergou um jogo duro nos sinais emitidos pelo Planalto. O centrão quer comandar estruturas que facilitem o escoamento de emendas, como Esportes, Desenvolvimento Social e Caixa. Nas últimas semanas, o governo expôs resistências a esse plano.

Negociadores de Lula falaram em preservar os três feudos e entregar ao centrão pastas como Ciência e Tecnologia ou Portos e Aeroportos, além de vice-presidências da Caixa. Um aliado de Lira reagiu com a queixa de que o governo queria apoio, mas só estava disposto a ceder "ministérios de quinta categoria".

O argumento do centrão é que o grupo representaria um acréscimo de 90 votos à base de Lula na Câmara, dando ao governo uma maioria confortável. Os cargos pedidos equivaleriam ao espaço ocupado pelo MDB, que tem 43 deputados e uma fidelidade pouco maior do que 30 votos.

Lula deve chegar a um acordo com Lira, mas o equilíbrio entre os partidos ainda deve voltar à mesa do presidente. A depender do apoio medido nas próximas votações, a questão pode desaguar numa reforma ministerial mais ampla no ano que vem.

 

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