Folha de S. Paulo
Embora antirrepublicano, foro especial
acaba sendo melhor chance de punir poderosos
O Brasil não é para principiantes. Meus
pendores republicanos me fazem torcer o nariz para o foro especial. Idealmente,
penso que não deveria haver diferenças de tratamento jurídico entre cidadãos e
autoridades. Mas, numa abordagem menos ahistórica, o foro especial talvez seja
a melhor chance de condenar poderosos.
O mensalão é o grande escândalo envolvendo políticos que produziu condenações que não foram posteriormente anuladas. Nisso ele contrasta com outras operações como Castelo de Areia, Satiagraha e, agora, a Lava Jato. A diferença é que o mensalão, por causa do foro especial de muitos réus, teve começo e fim no STF, inexistindo assim corte que lhe fosse superior e pudesse mais tarde invalidar suas decisões.
Não estou obviamente afirmando que cortes
nunca deveriam anular nada. O que me incomoda é o padrão. Quando o caso envolve
poderosos, tudo acaba sendo invalidado, a menos que o processo tenha tido
julgamento originário no STF. Quando os réus não pertencem a essa seleta
categoria, não vemos nada comparável a esse festival de nulidades totais.
Difícil acreditar que a diferença se deva ao fato de policiais, promotores e
juízes serem mais cuidadosos com os réus pretos e pobres, que compõem a grande
massa carcerária, do que são com os poderosos.
Eu entendo que os processos contra Lula tenham
sido invalidados. As mensagens hackeadas, afinal, escancararam que o petista
não contou com um juiz minimamente imparcial na primeira instância, o que é
razão suficiente para a anulação. Não acompanho, porém, a intemperada decisão
do ministro Dias Toffoli que põe uma pá de
cal na Lava Jato. Não dá para insinuar, como fez Toffoli, que tudo
não passou de uma "armação". A corrupção no
entorno da Petrobras existiu, dezenas de acusados, assistidos pelos melhores
advogados de defesa do país, confessaram, e bilhões de reais foram recuperados.
Isso são fatos, não interpretações.
O autor Hélio Schwartsman foi simples e claro neste seu artigo, em que denuncia o festival de anulação de condenação de poderosos ; em um momento, ele fez uma concessão quanto a haver razões para a anulação da condenação de Lula.
ResponderExcluirO autor, ao fazer a concessão, até encontra um termo e forma que não ofende as provas contra Lula, que são tão robustas como provas que mesmo Lula não ousou questioná-las em nem um dos 468 recursos que apresentou para um dos processos.
O autor usou o termo "invalidar" e o argumento de invalidação dos processos e denunciou o festival de nulidades de processos contra poderosos, e concedeu uma compreensão para um poderoso que escolheu.
Ok!
Mas se as provas mesmas, que é o que importa para saber se alguém fez aquilo de que está sendo acusado, são válidas e inquestionáveis, eventuais parcialidades deveriam ter sido saneadas e os processos contra Lula, o poderoso a quem o autor concede compreensão, deveriam ter terem sido então julgados de forma imparcial, em vez de servirem de desculpas para deixar impune quem liderou roubo de dinheiro público.
Nos julgamesntos de confirmação feitos por oito outros juízes, 3 do TRF-4 e cinco do STJ, Lula foi condenado sem haver nenhuma parcialidade ; e observe-se que nestes dois tribunais o julgamento é feito em turmas colegiadas e os dois são tribunais superiores ao tribunal do juizinho parcial (mas que não fraudou, não falsificou e não inventou as provas).
O autor mostra que argumenta sempre usando a razão, mas mostra também que, dependendo de quem for o poderoso que a razão atinge, ele aceita flexibilizar seu razoável entendimento quanto às anulações de condenações de poderosos.
Se eu agir assim, acusando imparcialidade e festival de anulações, mas dependendo do poderoso beneficiado eu me portar do mesmo modo como se comportam os que eu acuso, eu acho que devo repensar a minha própria parcialidade antes de condenar a parcialidade de outros.
Não lemos o mesmo artigo. Vc tem sobrenome?
ResponderExcluirMAM