Valor Econômico
Não há dúvidas no entorno de Haddad que
partiu das próprias linhas do governo a ideia de modificar a meta fiscal de
2024
Concretizar as medidas que conduzirão as
contas públicas ao déficit zero em 2024 será importante para reduzir incertezas
que afetam a inflação e os juros. A mensagem está na ata da mais recente
reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem.
Diz o documento que, antes, a incerteza
recaía sobre o desenho do novo arcabouço fiscal. Agora, falta colocá-lo em pé.
“Tendo em conta a importância da execução das
metas fiscais já estabelecidas para a ancoragem das expectativas de inflação e,
consequentemente, para a condução da política monetária, o comitê reforça a
importância da firme persecução dessas metas”, afirma.
Pode parecer uma bronca. No Ministério da Fazenda, isso foi visto como um alinhamento. O Banco Central, avaliou um integrante da equipe, se colocou como um aliado.
E o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem
precisado de aliados. Os elogios que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez
a ele ontem, reafirmando a linha de trabalho da equipe econômica, só confirma
isso: o próprio Executivo tem falhado no apoio ao ajuste fiscal.
Por exemplo: não há dúvidas no entorno de
Haddad que partiu das próprias linhas do governo a ideia de modificar a meta
fiscal de 2024. A discussão se dá no âmbito do Projeto de Lei de Diretrizes
Orçamentárias (PLDO). O projeto está em análise no Congresso Nacional.
“Não sou maluco de fazer isso sozinho”, disse
à coluna o relator do PLDO, deputado Danilo Forte (União-CE), quando
questionado se alteraria a meta fiscal do ano que vem. Ele acrescentou, porém,
que tem dialogado a respeito.
Se, em vez da meta zero, for admitido um
pequeno déficit, haverá mais espaço para acomodar despesas num Orçamento que se
mostra apertado diante das ambições políticas do eixo Planalto-Congresso.
Além disso, aumenta a chance de a meta ser
atingida. Isso reduz o risco de o crescimento das despesas ser freado pelo
arcabouço em 2025. A punição pelo descumprimento é a despesa avançar ao ritmo
de 50% do crescimento das receitas, e não 70% como é a regra geral.
Nada disso, porém, está no centro do radar da
equipe econômica. A prioridade é entregar o ajuste fiscal proposto no início do
ano.
Chamou pouca atenção a sanção da lei que
restabeleceu o desempate a favor do governo nas votações do Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Essa, porém, foi a proposta legislativa
prioritária para Haddad no primeiro semestre deste ano. Era considerada por ele
mais urgente até do que o próprio arcabouço e a reforma tributária.
A partir dela, a expectativa do governo é
obter R$ 54 bilhões em cobranças que estão travadas. A lei também permite que
sejam abertas negociações com contribuintes em torno de teses jurídicas. Nessa
frente, são aguardados R$ 12 bilhões em transações com a Procuradoria-Geral da
Fazenda Nacional (PGFN) e outros R$ 30 bilhões com a Receita Federal.
A prioridade na pasta é fazer o Carf “voltar
com tudo” ainda neste ano. Se necessário, serão abertas novas turmas de
julgamento, com acréscimo de conselheiros, e convocadas sessões
extraordinárias, informou um integrante da equipe.
Ele disse que a pasta tem uma estratégia para
cumprir a arrecadação prometida em 2024, na qual o Carf é peça fundamental.
Aprovada a lei, começa o trabalho para que isso se converta em receitas.
Espera-se que os primeiros resultados ajudem a reduzir o ceticismo que há hoje
em relação ao déficit zero.
Das medidas destinadas a elevar as receitas,
a equipe econômica avalia que conseguirá aprovar as mudanças na taxação das
offshores e dos fundos exclusivos. A proposta do fim da dedutibilidade dos
Juros sobre Capital Próprio (JCP) tende a ser modificada para limitar e
aperfeiçoar o mecanismo.
Por fim, há muita preocupação na Fazenda com
o destino da Medida Provisória (MP) 1.185/2023, que reduz o impacto de
incentivos fiscais estaduais na base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa
Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). A
expectativa é recolher R$ 35,3 bilhões no ano que vem. No entanto, a MP
enfrenta resistência no Congresso, por bancadas de Estados que concederam
incentivos com base na “guerra fiscal”. O governo já indicou que pode ceder em
alguns pontos para destravar a matéria.
Esse é o “plano A” da equipe de Haddad.
Existem alternativas pelo lado das receitas.
Pelo lado das despesas, mais modesto, está em
andamento um trabalho de avaliação de políticas públicas que pode ajudar a
melhorar a qualidade dos gastos e, eventualmente, reduzi-los. Adicionalmente,
comenta-se no Congresso que um “plano B” envolveria o contingenciamento de
despesas, inclusive as de investimento.
Em seu discurso, Lula afirmou que o governo
não dará cavalo de pau na economia, manterá a condução serena e fará “o que
tiver de ser feito”, preservando os pilares da credibilidade, da estabilidade e
da previsibilidade. Essas balizas não combinam com fogo amigo, nem com
contabilidade criativa. Zerar o déficit será muito difícil, mas o jogo ainda
está sendo jogado.
Sei.
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