Valor Econômico
Mudanças que pretendem dar mais elementos
para se discutir como, e com quais resultados, é gasto o dinheiro do
contribuinte
Independentemente da pancadaria que o
aguarda no Congresso Nacional e das dúvidas que especialistas levantam sobre
sua factibilidade, o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2024 traz
novidades que o colocam no estado da arte do que se discute no mundo sobre
governança de recursos públicos. São mudanças que pretendem dar mais elementos
para se discutir como, e com quais resultados, é gasto o dinheiro do contribuinte
brasileiro.
O Brasil está atrasado uns 15 anos nesse debate, comentou o secretário de Orçamento Federal, Paulo Roberto Simão Bijos, em entrevista a este jornal. As principais economias do mundo implementaram mudanças após a crise de 2008.
São quatro novidades no PLOA 2024, das
quais duas são imediatamente visíveis e duas mostrarão seu reflexo ao longo do
ano.
Entre as visíveis, está o orçamento de
médio prazo. Pela primeira vez, foram disponibilizadas previsões sobre quanto
será gasto não só no ano seguinte, mas também nos três anos à frente.
Por exemplo: sabe-se que o governo pretende
aportar R$ 69,4 bilhões na educação básica em 2024, cifra que passará para R$
70,6 bilhões, R$ 80,2 bilhões e R$ 85 bilhões nos anos seguintes. Com o
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), serão R$ 61,7 bilhões, R$ 58,7
bilhões, R$ 62,2 bilhões e R$ 63,9 bilhões.
O que esses números pretendem mostrar é que
uma eventual decisão de conceder um grande reajuste salarial, por exemplo,
poderá significar menos recursos para o PAC não só naquele ano, mas no período
à frente, explicou Bijos.
“Decisões alocativas são políticas, mas
tecnicamente subsidiadas”, afirmou. “Quanto melhor o subsídio, melhor chance de
a decisão política ser bem-informada.”
Outra novidade visível é o recorte
transversal, que mostra quanto os diversos ministérios estão destinando a
determinados grupos: mulheres, infância e adolescência, igualdade racial, povos
indígenas e ambiental. Ainda neste ano, serão criados painéis virtuais
detalhando essas despesas.
Na parte não imediatamente visível no PLOA,
haverá um primeiro “cara-crachá” do gasto público, informou Bijos. A cada
semestre, será possível saber quantas unidades do programa Minha Casa Minha
Vida foram entregues e comparar com a meta. O mesmo será feito com cisternas e
com operações de crédito e instalação de famílias assentadas. Esse controle
será futuramente ampliado.
Por fim, o novo conjunto de regras
orçamentárias contempla as revisões de gastos (“spending reviews”). Essas vão
afetar a execução dos gastos públicos de várias formas, segundo o secretário.
Por exemplo: os pentes-finos nas concessões
do Bolsa Família e dos benefícios previdenciários poderão proporcionar redução
nas despesas obrigatórias.
As revisões, que estão em curso no
Ministério do Planejamento, mostrarão se a despesa pública tem gerado os
resultados esperados ou não. Assim, podem embasar decisões sobre
contingenciamento de recursos orçamentários ou sobre ampliação de créditos para
ministérios. Também servirão de guia para a elaboração do próximo PLOA.
Já no próximo Projeto de Lei de Diretrizes
Orçamentárias (PLDO) haverá um relatório com recomendações produzidas a partir
das avaliações. Poderão ser ignoradas, como já ocorreu outras vezes, ou poderão
servir de base para reformular programas que estejam usando mal os recursos.
“Espero que, passada a turbulência típica
da discussão do ajuste fiscal de curto prazo, esses temas subam na escala das
prioridades do governo”, comentou Felipe Salto, economista-chefe da Warren
Rena. “As ‘spending reviews’ não vão mudar a qualidade do gasto da noite para o
dia, mas elas podem representar um processo gradual, porém contínuo, de melhora
da composição do orçamento.”
A revisão de gastos e o orçamento de médio
prazo podem produzir “uma pequena revolução em matéria fiscal”, avaliou.
Realizar avaliação de gastos é um primeiro
passo, mas o desafio é fazer com que esse trabalho gere resultados concretos,
acrescentou a diretora da Instituição Fiscal Independente (IFI), Vilma Pinto.
Ela disse que há espaço para melhorar políticas públicas, mas em muitos casos é
preciso alterar a lei para que elas possam ser mais bem focalizadas. Assim, é
grande a dificuldade em melhorar a alocação de recursos públicos.
Bijos chama esse conjunto de mudanças de
Orçamento por Desempenho 2.0. “Se vou ter acréscimo de mais de R$ 50 bilhões
para a saúde, o que isso vai gerar de resultado? Queremos avançar com força
nessa discussão”, explicou.
Elogiadas por especialistas, as mudanças
estão por ora ofuscadas pelas grandes incertezas sobre o PLOA 2024. Ao depender
de um grande volume de receitas ainda não concretizadas, a peça orçamentária
traz desconfiança, avaliou Pinto. Apesar de o governo haver sinalizado com o
prometido déficit zero, o cenário é muito incerto, comentou.
No entanto, os aperfeiçoamentos no marco
orçamentário, em particular as revisões de gastos, merecem toda atenção. É um
trabalho que busca tratar com mais respeito os recursos públicos e trazer aos
contribuintes um retorno de maior qualidade.
Lendo e aprendendo.
ResponderExcluirMuito bom! Jegues prometeu muito e entregou pouco, além de ser humilhado por Bolsonaro e postergar os precatórios pro governo que viria (no caso, Lula III). Quem sabe os ministros de Lula consigam superar as expectativas pessimistas do dito "mercado".
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