Folha de S. Paulo
Lula celebra em paz o 7 de Setembro, e
reaças roem os cotovelos
Que feriadão "aziago", lembrando
o bardo, para as modalidades mais influentes da extrema direita nativa, que
ambicionaram —e jamais desistirão; esse é seu "ethos"— tomar o poder
por meio de golpe, seja conspirando contra o ordenamento legal, seja
investindo na disrupção institucional. Perderam. E perderão sempre se nos
mantivermos vigilantes. É o preço, sim, da liberdade.
Os reaças costumam evocar esse brocado a cada vez que se veem tolhidos no prazer perverso de humilhar os humilhados. Nas redes, um sujeito chegou a evocar um texto contra o nazismo, de autoria do pastor Niemöller, para acusar a perseguição aos super-ricos no Brasil. Como é mesmo? "Um dia, vieram e levaram meu vizinho judeu. Como não sou judeu, não me incomodei..."
O valente nos convidava, também aos
superpobres, a reagir contra a cobrança de impostos
das offshores e dos fundos exclusivos. Na cabeça dele, no que
concerne à tributação, o governo Lula está
para o nazismo como os nababos estão para os judeus, católicos e comunistas
perseguidos. Os fascistoides e sonegadores, em tempos de redes sociais e de
ignorância alastrante, exercitam um discurso de resistência. Entendo seu
"patético momento", mas não me comovem.
"E o desconcerto e desconserto das
direitas, Reinaldo?" Já chego. É preciso caracterizar minimamente o
ambiente moral e ideológico acanalhado em que se movem esses patriotas, que se
sentem sufocados pela democracia e pelo Estado de Direito. Bradava outro dia,
contra o que vê como "censura de Xandão",
um desses entusiasmados: "A liberdade é quase sempre a liberdade de quem
pensa de modo diferente". Aí fiquei comovido. Citava a comunista Rosa
Luxemburgo... É bem verdade que, nesse caso, ela estava
contestando Lênin.
Mas o bruto ignorava a autoria da frase —e também o resto.
Dada a metafísica dos patetas, vamos às
personagens. Dias Toffoli,
ministro do STF,
fez o óbvio: anulou as
chamadas "provas" que embasaram o acordo de leniência
da Odebrecht em razão das múltiplas e estupefacientes ilegalidades cometidas
pelo órgão acusador, em conluio com o julgador.
As evidências dos malfeitos estão no
material colhido pela Operação
Spoofing, determinada "de ofício" —e estamos nos
esquecendo disto—, por Sergio Moro,
então ministro da Justiça de Jair
Bolsonaro. Ninguém produziu provas contra si mesmo com tanta
determinação e competência. Imaginava destruir aquele conteúdo. Não se deu
conta de que o hackeamento era, claro!, ilegal, mas não a sua apreensão,
ordenada por ele mesmo. Eliminar provas é crime. O cara costuma ter um padrão,
digamos, solipsista em matéria de língua e de direito...
E tonitruam os Catões da moralidade
pública, inconformados com o que consideram os riscos de a Cartago petista
destruir a Roma de que são patrícios: "A roubalheira não aconteceu? Está
tudo apagado?". Os grupos até então mais perigosos formados no Brasil e que
justificam o cometimento de crimes sob o pretexto de combater crimes eram as
milícias e o esquadrão da morte. E a democracia repudia milicianos, ainda que
em terninhos cafonas. Se o padrão de oposição ao PT não mudar, reeleições estão
garantidas ao partido. Convém ler as pesquisas.
No front dos disruptivos, a má notícia diz
respeito à delação de
Mauro Cid, acordada com a Polícia Federal, que depende agora da
homologação da Justiça. Alexandre de
Moraes é o relator dos inquéritos em que o ex-ajudante de
ordens de Bolsonaro é investigado. A informação foi dada com exclusividade pela jornalista Andréia Sadi, do G1
e da GloboNews.
Com suas idas e vindas, parece que havia
método na aparente
maluquice de Cezar Bitencourt, defensor de Cid, para lembrar de novo
o Shakespeare lá do primeiro parágrafo. A ver como se comportará a defesa de
Bolsonaro. Já exibiu várias estratégias. Tendo muitas, não tem nenhuma.
"Mas que dia aziago [...], que
tristeza!", lamenta a vanguarda do atraso, diante de suas ilusões mortas.
Num outro palco, mas no mesmo drama, Lula liderou
um Sete de Setembro em paz. E os Catões a roer os cotovelos do seu
reacionarismo: "Ah, como eu odeio esse cara! Ele tem de ser
destruído!". Os deserdados da Lava Jato e
do "Capitão" perderam. Mas sejamos vigilantes. É o preço da
liberdade.
Verdade.
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