Folha de S. Paulo
Por que alguns podem tomar duas garrafas de
vodca por dia e outros se embriagam com uma cerveja?
Leio nas folhas que, segundo pesquisa, 6 milhões de brasileiros consomem álcool "em excesso" e correm risco de dependência. Leitores afirmaram que o problema está aí, no excesso. Segundo eles, todo bebedor deveria saber a "hora de parar" —ou seja, quantos drinques o farão desfrutar apenas os prazeres da bebida, como uma deliciosa alteração de consciência, evitando beber de forma a sofrer os efeitos adversos, como o porre, os vexames e a ressaca.
Isso significa que, depois de chegar àquele
estado de alteração, o bebedor voltará magicamente à lucidez, a qual lhe
soprará que está na "hora de parar". Tal crença supõe que a
humanidade se divide entre os que "sabem beber" e os que "bebem
mal", e que todos têm o mesmo grau de tolerância ao álcool. Mas, se fosse
assim, como se explica que alguns consigam ingerir duas garrafas de vodca por
dia sem demonstrar embriaguez, enquanto, para outros, essa quantidade é
absurda, impensável? E por que alguns se embriagam com algumas cervejas
enquanto, para outros, a cerveja só serve para fins urinários?
A resposta é: porque as pessoas são
diferentes. Estima-se que, na maioria dos países, 15% da população tenham alta
tolerância ao álcool, enquanto, para os outros 85%, ele é um tóxico e elas só
conseguirão bebê-lo no seu limite —ao ultrapassar esse limite, sentir-se-ão tão
mal que pensarão duas vezes antes de repetir a experiência. Donde "a hora
de parar" não tem a ver com "saber beber". É orgânico.
Ironicamente, os grandes candidatos à dependência
são aqueles a quem o álcool parece não fazer mal. O fato de "beberem
bem", de manterem a dignidade e quase nunca terem ressaca não impede que a
doença se instale silenciosamente neles.
Como dizia Scott Fitzgerald, primeiro você
toma um drinque. Depois, o drinque toma um drinque. E, por fim, o drinque toma
você. Mas, para aqueles 15%, esse dia demora a chegar.
Eu bebia muito mal,o alcoolismo saiu de mim há quase dez anos,graças a Deus!
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