O Globo
Em 1967 os generais americanos estavam
seguros de si
Diplomatas israelenses compararam o ataque
terrorista do Hamas ao
11 de setembro de 2001, quando aviões sequestrados por militantes suicidas da
Al-Qaeda destruíram as Torres Gêmeas de Nova York,
matando cerca de 3 mil pessoas. O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu evitou
essa comparação. Fez muito bem, porque, se há uma semelhança original entre os
dois episódios, o paralelo mais próximo é outro, com a ofensiva do Vietnã do
Norte e do Vietcongue, durante os festejos do Tet em janeiro de 1968.
A Ofensiva do Tet fracassou militarmente, mas
quebrou a espinha dorsal do apoio popular à intervenção americana no Vietnã e
custou a ruína política ao presidente Lyndon Johnson. Em março, ele anunciou
que não disputaria a reeleição, foi para seu rancho, deixou o cabelo crescer e
morreu em 1973. Foram necessários mais de 30 anos para que ele fosse defendido
como um grande presidente, noves fora o Vietnã.
Até a semana passada, os generais israelenses e seu famoso serviço de informações estavam tranquilos. Os egípcios teriam avisado que alguma “coisa grande” estava a caminho. Se esse aviso chegou ao governo israelense, não se sabe, mas a “coisa grande” aconteceu. Em dezembro de 1967, os generais americanos estavam seguros de si.
No final de janeiro, mais de 50 mil soldados
do Vietnã do Norte e cerca de 250 mil vietcongues atacaram bases americanas e
dezenas de cidades do Sul. O impensável aconteceu. (Impensável, mas vários
avisos foram ignorados.)
Apesar dessa semelhança militar, o paralelo
não deve ir muito longe. Mesmo tendo praticado atrocidades, sobretudo na cidade
de Hue, os vietnamitas do norte e os vietcongues não agiam como terroristas,
sequestrando inocentes para usá-los como escudos humanos. O Vietcongue atacou a
embaixada americana, o Hamas matou 260 pessoas num festival de jovens. (Em
1968, dois generais americanos e um almirante cogitaram usar armas nucleares
táticas para defender uma base militar sitiada. Johnson vetou a ideia.)
Em 2014, quando a tropa israelense entrou na
Faixa de Gaza,
1.462 civis morreram. Pelo menos 142 famílias palestinas perderam três ou mais
membros, 18 mil casas foram destruídas, e 108 mil pessoas ficaram sem teto.
Israel perdeu 67 soldados e seis civis.
O Hamas fez do assassinato de civis e dos
sequestros de cerca de 150 civis, inclusive mulheres e crianças, o coração de
sua ofensiva. Um episódio teve características militares, o outro
características terroristas.
O uso de civis como escudos humanos é uma
violência velha como as guerras. Na guerra civil da falecida Iugoslávia, ela
custou pesadas condenações a chefes militares, saídas do tribunal internacional
de Haia. Na batalha pela posse da cidade de Mossul, em 2016, o grupo Estado
Islâmico valeu-se de escudos humanos para mover seus combatentes. O primeiro-ministro
Bibi Netanyahu comparou os sequestros do Hamas às práticas do Estado Islâmico.
De certa maneira, o que o Hamas fez foi mais radical: os escudos humanos de
Mossul eram civis que viviam na cidade. As vítimas do Hamas foram sequestradas
em território israelense.
Os pilares da política de Bibi caíram na
frigideira que fritou Lyndon Johnson. Ao contrário dos regimes árabes do
Oriente Médio, Israel tem um regime democrático e liberdade de imprensa.
Sei.
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