O Estado de S. Paulo
Atual ambiente estimula o radicalismo palestino. Os ultranacionalistas de Israel sabem disso
Em toda disputa, o maior objetivo é provocar
no adversário a reação esperada. A previsibilidade decorrente dessa tática
permite o planejamento estratégico. Quem domina essa técnica é capaz de manter
a iniciativa. Reduzido à condição de coadjuvante, o adversário consome seu
tempo e energia reagindo, enquanto o protagonista se ocupa do próximo lance.
Se dois atores em lados opostos souberem empregar esse método com maestria e sem limites morais, ele se torna a única tática efetiva. O centro do tabuleiro é esvaziado, e a eletricidade se concentra nos polos opostos. Os extremistas palestinos e israelenses empregam essa técnica há 80 anos. Sua eficácia avassaladora e seu custo humano são comprovados mais uma vez.
As Forças de Defesa de Israel ignoraram as
advertências dos serviços de inteligência israelense, egípcio e americano. Elas
falharam durante as incursões do Hamas no dia 7 porque suas atenções estavam
voltadas para as prioridades do governo de Binyamin Netanyahu: a expansão das
colônias judaicas na Cisjordânia e o acesso de fiéis judeus ao complexo da
Mesquita de Al-Aqsa.
O governo israelense não concede alvará de
construção para palestinos na Cisjordânia e demole casas novas, assim como as
residências das famílias de palestinos acusados de atos de violência. Ao mesmo
tempo, financia a construção de novas moradias e a criação de novos
assentamentos para judeus na Cisjordânia.
Essa política tem elevado as tensões e
fomentado a atuação de células terroristas e de ataques de palestinos contra
colonos judeus e contra as forças de segurança israelenses. Os judeus podem
andar armados; os palestinos, não.
Os colonos, muitos deles recém-chegados da
Europa e dos Estados Unidos, invadem casas de palestinos cujas famílias moram
na Cisjordânia há muitas gerações, e os agridem, gritando frases como “vão
embora, aqui não é a sua terra”. Algumas vezes, sob o olhar de aprovação de
soldados israelenses.
REGRA. O ministro de Segurança Itamar
Ben-Gvir, líder dos colonos judeus da Cisjordânia, defende o livre acesso de
fiéis judeus ao complexo da Mesquita de Al-Aqsa. Grupos religiosos judeus
acreditam que suas orações nesse local dariam início à construção do 3.º
Templo. O 2.º Templo foi destruído pelos romanos no ano 70.
No mesmo local foi construída a mesquita entre
685 e 715. Os tratados de Paris e de Berlim, que regem o acesso a lugares
sagrados em áreas disputadas, firmados em 1856 e 1878 respectivamente,
determinam que só os judeus rezem no Muro das Lamentações, as fundações que
restaram do 2.º Templo, e só os muçulmanos tenham acesso à parte de cima.
Israel tradicionalmente respeitou essa regra,
violada pelo atual governo ultranacionalista. No terceiro dia da festa judaica
dos Tabernáculos, dia 1.º, a polícia israelense ordenou que os palestinos
fechassem suas lojas na Cidade Velha de Jerusalém, e impediu o acesso dos
muçulmanos, para garantir a entrada de judeus no complexo de Al-Aqsa.
O Hamas denominou a incursão no dia 7 de
“Inundação de Al-Aqsa”. Segundo seu comandante militar, Mohammed Deif, a
operação começou a ser planejada em maio de 2021, depois que policiais
israelenses invadiram a mesquita, durante o mês sagrado muçulmano do Ramadã,
espancaram e arrastaram palestinos de dentro de lá, alegando que eles os haviam
atacado.
O Hamas venceu as eleições de 2006 na Faixa
de Gaza e seu rival palestino, o Fatah, ganhou na Cisjordânia. Mas Estados
Unidos e União Europeia anunciaram o corte da ajuda de meio bilhão de dólares
cada para os palestinos, se o Hamas assumisse, por considerá-lo organização
terrorista. O Fatah então continuou governando Gaza até o ano seguinte, quando
o Hamas tomou o poder no território à força.
Desde então, houve cinco guerras entre Israel
e Hamas na Faixa de Gaza, que está sob bloqueio israelense. Metade da população
do território está desempregada. Segundo o Programa de Alimentos da ONU, 1,84
milhão de palestinos não tem comida suficiente, ou seja, um terço da população
nos dois territórios e mais Jerusalém Oriental. Desses, 1,1 milhão vive em
“grave insegurança alimentar” – 90% deles na Faixa de Gaza.
Esse ambiente estimula o radicalismo
palestino. Os ultranacionalistas israelenses sabem disso. A perpetuação do
conflito interessa a ambos. Fazer essa análise não é justificar a violência. É
entender suas causas. E, nesse sentido, honrar suas vítimas.
PERFEITO! Como diz o articulista: "Fazer essa análise não é justificar a violência. É entender suas causas." Infelizmente, muitos colunistas não estão interessados nisto, querem apenas CRIMINALIZAR os movimentos palestinos, que não se reduzem às ações violentas do Hamas, e as quais têm que ser vistas dentro do CONTEXTO parcialmente mostrado nesta coluna. Mas, quando a violência criminosa vem do governo israelense, muitos colunistas não querem ver e nem considerar! Aceitam tudo como "defesa de Israel". Que há décadas ataca os palestinos e desobedece constantemente as deliberações da ONU!
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