Folha de S. Paulo
Prévia do texto da mudança nos impostos
amplia favores para empresas e dificulta gestão das contas públicas
Na versão
do Senado para a Reforma Tributária, há um limite para a carga de impostos
sobre o consumo de bens e serviços. Não é boa ideia, piorada ainda pelo cálculo
desse teto de impostos, baseado na média de receita de 2012 a 2021.
Nesses anos, houve quedas na arrecadação por
causa de anos de recessões medonhas (2015, 2016, 2020) e crescimento pífio do
PIB. O cálculo prejudica em particular o governo federal.
Não é o único e talvez não venha a ser nem o maior problema da reforma do Senado. Mas é novidade ruim. De ruindades velhas ampliadas, temos mais regimes especiais. Quer dizer, redução de alíquota de impostos para certo tipo de empresa ou setor, o que eleva a alíquota do imposto médio geral. Por exemplo, benefícios para empresas ricas de advogados, médicos e outros profissionais. Qual o motivo da distinção?
Até esta quarta-feira (25), havia 693 emendas
à reforma da Câmara. Muitas não foram aceitas no relatório do senador Eduardo
Braga (MDB-AM). Mas o jogo ainda está rolando. A coisa pode ficar pior, com
mais favores.
Talvez alguém considere boa ideia impor um
teto da carga sobre o consumo. Pode ser, desde que, para compensar, seja viável
aumentar a arrecadação de outros impostos, em particular sobre renda.
Se assim não for, a receita total dos
governos pode ser insuficiente. Haveria ainda mais déficit. O problema seria
contido se houver um teto de gastos. Hum.
Quase ninguém quer um teto de gastos. Deu-se
cabo do teto de Michel Temer, de fato inviável. Luiz Inácio Lula da Silva
aprovou no Congresso o
teto móvel do dito "arcabouço fiscal", mas é incerto quando a carga
de gastos (em relação ao PIB) vai cair, o que depende de anos de bom
crescimento econômico.
A maioria do Congresso não quer aumento de
outros impostos. Quando pode, aumenta despesas ou reduz a receita do governo,
como o está fazendo por estes dias e na própria reforma (com
o aumento do Fundo Regional de Desenvolvimento, na conta federal).
O limite de impostos federais que serão
fundidos na CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) seria de 5% do PIB (meio
ponto percentual abaixo da média de 2010-2014). Trata-se da média da carga de
PIS/Pasep, Cofins e IPI de 2012 a 2021, como prevê o relatório do Senado. Nessa
conta falta o imposto seletivo (sobre bens daninhos), do qual nada se sabe.
A carga do novo imposto estadual e municipal
sobre bens e serviços, IBS, seria de 7,74% do PIB (média do ICMS e do ISS). No
total, 12,74% do PIB, pois. Essa aritmética é baseada na estimativa de carga
tributária da Secretaria do Tesouro Nacional.
Um objetivo da Reforma Tributária é que ela
seja neutra. Isto é, que não redunde de início em aumento
da carga de impostos. Tudo bem. Em termos.
Mas é preciso fazer um cálculo razoável desse
limite inicial da carga tributária sobre consumo. Depois, a carga pode aumentar
ou diminuir, a depender dos ritmos dos diversos setores da economia. Eventuais
ajustes devem ser feitos por governo e Congresso, de acordo com o contexto.
Engessar o futuro é má ideia. De resto, dado o limite geral, se a carga federal
de impostos sobre consumo aumentar, a de estados e cidades vai ter de cair (ou
vice-versa)?
O problema não vai aparecer logo. A primeira
medida de carga ocorreria em 2027 e 2028; o ajuste começaria em 2030. Parece
distante, mas assuntos como tributação ficam parados por décadas. Por falar
nisso, o tempo de implementação da reforma é ainda desesperadoramente longo.
De resto, as limitações de impostos sobre
consumo vão influenciar também a receita a ser projetada na reforma do imposto
de renda —ao menos esperamos que venha tal mudança em um tipo de tributação
especialmente iníquo.
Lendo e tentando aprender.
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