O Globo
Você também tem a sensação de que a política
nacional parece uma grande sessão da tarde em que os vilões do passado
reaparecem, tentando se repaginar como mocinhos? E não só os personagens, mas
também os enredos se repetem? Não é só sensação.
Uma das principais notícias da semana é a
tentativa do governo Lula de
tutelar a Petrobras para
que controle os preços dos combustíveis de
forma a não deixar a inflação subir demais, além de investir em plataformas e
navios construídos no Brasil, apostando na volta da cota de conteúdo nacional
que contribua para a geração de empregos.
Quem já viu esse filme sabe o final. Jean Paul Prates pode até resistir por um tempo, mas terá de ceder quando Lula acionar o trator do Palácio do Planalto. Não é difícil prever o final da história, assim como não é difícil saber como termina o enredo batido da ressurreição da indústria naval.
Já houve diversas tentativas de financiar a
construção de navios em grande escala no Brasil com financiamento público. Mas,
sem mão de obra qualificada, tecnologia de ponta e metas de produtividade, os
estaleiros nacionais não conseguem competir num mercado global. Cedo ou tarde,
acabam sucumbindo e quebrando.
Claro que sempre haverá quem atribua a
responsabilidade pelo fracasso a fatores externos. Para amantes do conteúdo
nacional como Lula, a última onda de quebradeira foi culpa da Lava-Jato, que
investigou e prendeu dirigentes de estaleiros por corrupção — e não da
corrupção em si, vejam que curioso.
Mas quem conhece o setor sabe que teriam
sucumbido de qualquer maneira, porque a equação financeira não fechava nem com
muito subsídio.
O presidente da Petrobras acompanhou a
história, por isso tenta empurrar a discussão com a barriga, argumentando que a
empresa precisa investir em transição energética para garantir um futuro
longevo aos negócios.
Em tese ele está do lado certo, mas não dá
para entender como a busca da sustentabilidade casa com a insistência de Prates
em driblar as regras de governança para trazer de volta à cúpula da Petrobras
figuras que já foram investigadas e até afastadas sob suspeita de corrupção e
desvio de recursos.
Não é só na petroleira que figuras
defenestradas no passado vêm emergindo em busca de protagonismo. Ontem mesmo,
em São Paulo,
o ex-tesoureiro do PT João
Vaccari Neto fez uma reentrada pública na cena política, abrindo um seminário
da Central Única dos Trabalhadores (CUT) sobre fundos de pensão numa sessão que
tinha como tema “A Previc e
o novo governo”.
A Previc é a autarquia que regula e fiscaliza
a aplicação de mais de R$ 1 trilhão depositados em fundos de aposentadoria
privada de milhões de trabalhadores. Sentados à mesa com Vaccari estavam o
diretor superintendente e o diretor de normas da Previc.
Na sessão seguinte, presidentes dos maiores
fundos de pensão do país — do Banco do
Brasil, a Previ, e da Caixa
Econômica Federal, a Funcef — discutiram “problemas e soluções” para o
setor.
Para quem não se lembra, Vaccari foi o
todo-poderoso tesoureiro do PT entre 2010 e 2015, período que compreendeu as
duas campanhas de Dilma
Rousseff. Foi condenado em sete processos na Lava-Jato, um dos quais lhe
rendeu uma sentença de 15 anos de prisão por corrupção passiva e lavagem de
dinheiro.
Ficou na cadeia por quatro anos, até sair em
2019 por um indulto natalino da Justiça do Paraná. Em 2017, se
tornou réu na Justiça Federal por fraudes que provocaram prejuízos de R$ 402
milhões justamente na Funcef, representada no seminário da CUT.
O processo até hoje não terminou. Mas os
aposentados desses fundos sofrem desconto de parte do benefício todo mês para
cobrir o rombo. Pois Vaccari não apenas abriu o evento da CUT em posição
privilegiada, como também aproveitou o microfone para se defender das acusações
da Justiça sem que ninguém parecesse se espantar.
O bonde da volta dos que não foram é grande.
Seriam necessários mais parágrafos para listar as figurinhas carimbadas da
política e da economia ressurgindo, brandindo candidamente a pergunta em tom
por vezes até indignado: mas então quem já foi condenado pelos tribunais da
Justiça ou da mídia não tem o direito de refazer a vida e seguir em frente?
Claro que sim, desde que estejam dispostos a
mudar de conduta. Pelo que se viu até agora, todos se comportam como se
estivessem de volta à cena do crime, buscando concluir o que faziam quando
foram interrompidos.
Só que não estamos falando de ficção, mas de
realidade crua. Fazer tudo sempre igual não costuma levar a resultados
diferentes. Está aí uma reprise que não vale a pena ver de novo.
O ser humano não melhora mesmo.
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