O Globo
Com atuação das Forças Armadas, o objetivo do
plano divulgado pelo ministro Flávio Dino é descapitalizar a “narcomilícia”, e
estrangular a logística do crime
O governo convocou todas as forças federais
para atuar na crise de segurança, mas através de um plano que é diferente de
outros e, ao contrário do que se pensava, não é apenas do Rio. É nacional. A
Marinha e a Aeronáutica atuarão através de uma GLO, e que também é diferente
das que ocorreram no passado, porque será específica e pontual.
O ministro Flávio Dino me disse o que o
governo não fará: “não concordamos e não faremos ações de ocupação militar com
tiros a esmo porque isso é irresponsável, ineficiente, puramente demagógico e
quem morre são os mais vulneráveis”. O ministro combate a ideia de que o crime
organizado está apenas nas áreas mais pobres do Rio. “Quem inventou a milícia
no Rio de Janeiro foram os políticos. Onde houve a apreensão de 47 fuzis? Numa
mansão na Barra da Tijuca”.
Ontem, dia do lançamento do plano para combater a milícia e o tráfico de drogas, o ministro da Justiça me deu uma longa entrevista que foi ao ar na GloboNews. Ele detalhou o plano que resume como sendo “integrar as ações do Estado, focar na prioridade e não cometer erros pretéritos”. Além disso, falou de outros temas que o circundam. Negou que o presidente Lula tenha falado com ele sobre indicação para o Supremo e disse que prefere pensar no assunto apenas quando, e se, isso for colocado. Sobre a tentativa de golpe do começo do ano, ele descreveu o que sentiu.
—No dia 8 de janeiro, quando eu cheguei à
janela do Ministério da Justiça e olhei aquilo, a sensação foi a de estar à
beira de um abismo. Decorridos dez meses, hoje eu sei que o abismo era muito
mais profundo do que aquilo que eu via. Porque de fato havia o engendramento de
um golpe.
Flávio Dino é contra a criação do Ministério
da Segurança e justifica de forma objetiva: 90% do tempo de um ministro da
Justiça é dedicado à segurança pública. E há uma relação estreita entre os dois
temas, a tal ponto que, se fossem divididos, haveria uma duplicidade de
comandos.
A maior parte da entrevista foi, claro, sobre
o plano anunciado ontem pelo presidente Lula, com ministros e comandantes
militares. A operação segue a um planejamento claro: não é uma intervenção,
aliás, nem é apenas em um estado. A Marinha atuará nos portos do Rio, de
Itaguaí e de Santos. A Aeronáutica estará presente ostensivamente nos
aeroportos de Guarulhos e Galeão. Os dois mil homens e mulheres do Exército
reforçarão a atuação na fronteira. Desta forma, explicou o ministro, o governo
descapitaliza a “narcomilícia”, e estrangula a logística do crime. Por outro
lado, a inteligência da PF com a inteligência das polícias locais, e talvez a
Receita e o Coaf, atuarão para executar o estrangulamento financeiro do crime.
Integrarão também o plano a PRF e a Força Nacional.
—O Cifra (Comitê Integrado de Investigação
Financeira e Recuperação de Ativos) buscará a eficiência e a velocidade na
ação. Nos últimos anos, houve um alargamento dos negócios das milícias e do
tráfico. Há uma interpenetração profunda do crime organizado com postos de
gasolina, estabelecimentos comerciais e nunca houve uma investigação decidida
sobre esses mecanismos. O objetivo é desidratar e asfixiar o crime — disse o
ministro, que afirma ainda que a operação será centrada no Rio para atingir o
crime nacionalmente:
—As facções do Rio e de São Paulo, nascidas
no ventre do sistema penitenciário, acabaram se transformando em redes
nacionais e transnacionais. O trabalho no Rio alcança todos os estados
brasileiros.
Já está em andamento um plano específico para
a região Norte, onde o tráfico de drogas e de armas atua junto com o crime
ambiental.
— É o Plano Amazônia: Segurança e Soberania
(Amas) Haverá um encontro do governo com os governadores da região no dia 10 de
novembro. Vamos implantar bases híbridas, terrestres e fluviais e estamos nos
equipando com, por exemplo, lanchas blindadas porque o crime aumentou seu poder
bélico nos últimos anos e, de fato, não foi combatido.
Lembrei a ele que todas as intervenções na
segurança do Rio acontecem por espasmos. Vão na crise e depois se recolhem. O
ministro disse que a atuação das forças armadas é por seis meses, podendo ser
prorrogada, mas estão sendo criados mecanismos de cooperação com os estados que
serão permanentes. Para Dino, o que está acontecendo na prática é o começo da
implantação do Sistema Único de Segurança Pública, que foi criado por lei em
2018, mas até agora estava abandonado.
Tomara que dê certo.
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