O Globo
Os próximos 180 dias serão de intensa
negociação para definir os limites das concessões e, assim, influenciar na
alíquota final do novo imposto
Os dois impostos sobre valor agregado vão se
transformar em um só. É o que se ouve no Congresso e no governo. Acham que foi
necessário fazer dois pela desconfiança federativa, que poderá ser superada com
o tempo. O esforço na hora da regulamentação será para fazer tudo o mais
simples possível. A ideia que se tem na Fazenda é que a CBS e o IBS tenham um
sistema de cobrança só. Serão dois impostos com a mesma legislação, as mesmas
regras, o mesmo regulamento. A tramitação da Reforma
Tributária ainda não acabou, falta a Câmara, mas já se pensa na
implementação.
A proposta tem aberrações. Há um setor que
terá redução de alíquota que está definido como “segurança nacional, soberania
e cibersegurança”. Como dizer o que é isso? Os técnicos explicam que cada setor
foi nomeado genericamente e, por isso, as leis complementares serão tão
importantes para definir.
Só a lei dirá exatamente a dimensão de cada concessão, os limites de cada regime específico, como o de educação, por exemplo, me disse um técnico. O que ficará em educação? Eles dão como certo que seja a educação do básico ao superior. “Mas, e os cursos avulsos como inglês ou jiu-jitsu também terão redução da alíquota padrão?”, perguntou um técnico.
No caso dos profissionais liberais, que terão
30% de desconto, já se sabe que os médicos e dentistas entrarão no item saúde,
ou seja, terão um desconto maior, de 60%. Mas o absurdo é até consultoria ter
vantagem tributária. É que consultor está no grupo dos profissionais liberais.
As concessões têm dois defeitos opostos. Ou
são genéricas demais e agora precisam ser bem delimitadas, ou são específicas
demais. Há um item com isenção que é “suco de fruta natural sem adição de
açúcar e conservantes” . Certamente é o único país que terá uma coisa dessas na
Constituição.
A reforma sem dúvida é um avanço,
representará uma melhora no ambiente de negócios e simplificação do pagamento
dos tributos, mas inegavelmente essas exceções criaram vários problemas: têm
impacto na tarifa padrão, criam complexidades e distribuem privilégios.
A comparação numérica que se faz na Fazenda é
que se a complexidade é 100 no modelo atual, a reforma como foi concebida a
reduziria para 10. Mas com as exceções foi para 30. O resultado é muito melhor
do que o atual, mas de fato ela piorou ao tramitar. Isso é entendido como o
preço a pagar numa democracia em que tudo, felizmente, tem que ser negociado, e
não é uma imposição, como foi a reforma implantada no regime militar.
A negociação continuará intensa, tanto na
etapa final de tramitação e promulgação, quanto na formulação das leis
complementares. O prazo é de 180 dias para que se encontre o melhor desenho
para o novo regime tributário. O tempo das pressões continuará exatamente
porque agora é que se estabelecerá o limite de cada concessão.
A ideia do secretário Bernardo Appy, segundo
adiantou o “Valor”, é formar um grupo de trabalho do governo federal, estados e
municípios, assim que a reforma for promulgada, para que os três níveis
administrativos trabalhem juntos.
Depois disso, virão os anos da implementação.
Em 2024 e 2025, será montado todo o sistema de cobrança dos novos impostos.
Nesse momento será possível construir o caminho para que seja um só imposto
sobre valor agregado. Em 2026, tudo tem que estar pronto em relação aos
impostos federais para começar a fazer uma espécie de ensaio.
O Senado melhorou essa etapa ao estabelecer
que em 2026 nem precisa ser recolhido o imposto. Antes se previa o recolhimento
de um valor mínimo apenas para testar o sistema. Pela nova redação, basta as
empresas cumprirem a obrigação, calcularem quanto teria sido o tributo, mas não
precisarão recolher nada. Esse momento será fundamental porque se houver alguma
coisa disfuncional será a hora de corrigir.
Em 2027, começa mesmo a cobrança da
Contribuição sobre Bens e Serviços e serão extintos o IPI, PIS e Cofins. Isso
já vai permitir uma simplificação importante para as empresas. De 2029 a 2033,
será a transição do ICMS e do ISS para o Imposto sobre Bens e Serviços, dos
estados e municípios.
O país não saberá de imediato a alíquota do
novo imposto, porque dependerá de todo esse processo de legislação
complementar. Está dito que a alíquota será a “que mantém a carga tributária”.
Só isso que se sabe agora. Portanto, os próximos 180 dias, após a promulgação,
serão decisivos.
Pois é.
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