Folha de S. Paulo
Déficits aumentam, governos querem mais
impostos, o que pode bater em consumo e preços
Fernando Haddad faz
"pronunciamento" nesta sexta-feira (24), às 9h. Vai anunciar meta de
superávit em 2024? Emergência fiscal? Piadas lúgubres à parte, a coisa está
feia a ponto de especularmos sobre coisas assim. O que está feio?
Neste ano, 16 estados e o Distrito Federal
aumentaram suas alíquotas de ICMS, para valer neste 2023 ou em 2024. Governos
do Sudeste e do Sul anunciaram nesta semana que pretendem
cobrar ICMS mais alto. O governo
federal quer cobrar imposto sobre parte das isenções de ICMS que
estados concederam a empresas, do que depende do Congresso. Etc.
Como impostos mais altos tendem a provocar mudança de comportamento de contribuintes, é difícil de cravar o efeito desses aumentos em preços e arrecadação, o que depende de cada mercado afetado e também da conjuntura econômica. Mas não é nada improvável que tributação mais elevada acabe em algum reajuste de preços. Pode bem ser também que um aumento de receita e de despesa de um governo não compense o efeito da redução do consumo provocada pelo aumento de tributos.
De qualquer modo, o risco de dar errado
parece evidente.
O assunto é obviamente relevante porque não
vai ser possível e/ou recomendável tapar
os buracos das contas públicas sem também um aumento de receita
tributária. Note-se o "TAMBÉM".
Estados de Sudeste e Sul argumentam que o
motivo do aumento de alíquotas do ICMS seria uma precaução. Como a fatia de
cada estado no bolo de impostos de 2024 a 2028 pode vir a determinar a
repartição de impostos depois da reforma tributária, seria conveniente inflar
seu pedaço.
É um argumento precário, como o próprio
governo federal observou: estados e cidades ainda vão poder aumentar impostos
depois da reforma; não faz sentido os governos de agora se sacrificarem por
governos do futuro, arcando com o desgaste de aumento de tributos.
Estados perdem receita, em parte por causa
das reduções de alíquotas aprovadas no Congresso no ano passado, patrocinada
pelo governo das trevas. Do primeiro semestre de 2022 para o primeiro deste
ano, a receita total de impostos dos estados caiu 3,5%, em termos reais (a do
governo federal, até setembro, caiu 3,8%).
A carga tributária tem caído, pois: receita
menor, PIB maior. "Carga tributária (bruta)" é apenas uma fração, o
total de receitas arrecadadas sobre o valor do PIB. Ainda assim, mesmo com a
queda da carga, o aumento de alíquotas ou quase isso pode dar problema. Alguém
vai pagar mais. No caso de impostos sobre consumo ou empresas, isso pode ter
impacto econômico na veia, sobre vendas, produção e investimento.
O resultado dessa combinação de impostos mais
salgados com déficits ainda grandes é o pior dos mundos. O que fazer? O óbvio,
mas não parece haver ninguém no controle, as lideranças são toscas, os lobbies
particularistas mais podres são fortes etc.
Cortar despesa é difícil, mas as tentativas
são pífias. O governo federal tem uma secretaria de revisão de gastos, que
tenta fazer seu trabalho, mas não há revisão de gastos. Muitos estados estouram
as contas e vão pedir dinheiro ao governo federal. O governo federal quase
inteiro quer aumento de despesa direito ou gambiarras fiscais e contábeis para
poder gastar mais, dane-se o déficit primário, que vai se aproximando de níveis
argentinos.
No Congresso, a opinião comum é "chega
de imposto", mas o aumento de gastos não para, vários deles também
patrocinados por gente governista.
Pelo conjunto dessas obras, o país está meio
à deriva, com credores cobrando muito caro para emprestar ao governo, o que
encarece crédito e outros empréstimos para famílias e empresas. Não há senso de
urgência ou responsabilidade. Esperanças e expectativas mais animadas começam a
derreter.
Pois é.
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