Folha de S. Paulo
CPIs, agências reguladoras e outras
instituições de controle rendem quase nada
No domingo à noite, parado em um sinal da
Faria Lima, vejam só, o passageiro do carro ao lado abre o vidro para perguntar
se havia um posto de combustível por ali. Sim, pertinho. Não estavam sem
gasolina. Precisavam de diesel para um gerador, pois estavam sem
eletricidade na pequena empresa deles. "Prejuízo feio, tudo
estragando", disseram.
Que pobreza. E a gente mal fala dos oito
mortos. Que desgraça.
São histórias banais, pois comuns de milhões de pessoas e comércios que tiveram transtornos diversos e prejuízos, sem eletricidade. Sem luz talvez fiquemos por mais tempo.
O descalabro causou a revolta sabida e
"barata avoa" em governos e instituições oficiais. Até o um tanto
incógnito prefeito de São Paulo apareceu.
Todo mundo quer mostrar serviço, até que (quase) todo mundo se esqueça deste
fracasso.
Há uma CPI da Enel na Assembleia; os
vereadores querem criar a deles. Os bolsonaristas do B de São Paulo aproveitam
o furdunço para fritar a privatização da Sabesp de Tarcísio de Freitas,
governador paulista e bolsonarista.
Então a gente se lembra da CPI das
Americanas, da fraude de dezenas de bilhões de reais, ação de uma quadrilha
que, entre outras imundícies, jogou milhares de trabalhadores na rua. Deu em
nada. Lembra-se das multinhas da CVM (Comissão de Valores Mobiliários). Do
centrão aboletado em diretorias das agências reguladoras, embora técnicos ainda
tentem fazer o seu trabalho.
A fiscalização de empresas é uma piada.
Não se sabe quem são os responsáveis pelo
apagão paulista. Por ora, talvez para sempre, há apenas algazarra e chutes.
A Enel apregoa seus investimentos, que
aumentaram. Pelos balanços, foram de R$ 763 milhões em média, de 2013 a 2017,
quando ainda Eletropaulo Metropolitana. De 2018 a 2022, já Enel, a média foi de
R$ 1,34 bilhão. Comparando com a média do biênio 2016-2017 e dada a inflação,
não foi lá grande aumento. No biênio de 2021-2022, o investimento médio foi de
significativo R$ 1,7 bilhão, porém.
E daí? Não sabemos se foi pouco, dados o
contrato, necessidades de expansão, reforma, modernização. Um especialista
teria de estudar o assunto por semanas.
Em 2022, a Enel SP ficou em um pífio 19º
lugar no ranking nacional do indicador de tempo e frequência de interrupção de
energia (Desempenho Global de Continuidade, DGC), entre 29 posições. A empresa
já foi pavorosamente pior, entre 2015 e 2017, e pior em 2020. Ora tem um nível
de DGC parecido com o de 2013. O número de reclamações por interrupção de
energia cresceu muito em relação à média 2016-2019.
Desde 2018, a distância do indicador DGC da
Enel para a empresa líder do ranking pouco mudou, proporcionalmente. Os números
são da Aneel; conclusões, deste jornalista.
A companhia é Enel desde 2018, uns cinco
anos. Desde os anos 1980, os comunistas da China fazem planos quinquenais que
dão certo, ao menos em avanço do PIB e da tecnologia. Ah, a ironia.
O que apenas tais números dizem sobre a
responsabilidade da empresa no apagão? Não dá para dizer.
Funcionários? Não é possível, economicamente
viável, manter equipes permanentes em quantidade bastante para lidar com
situações críticas extremas e raras. Mas quanta reserva para riscos maiores tem
a Enel? Existem cálculos de risco e planos? Alguém fiscaliza?
Está em tempo. Vai chover muito até março,
talvez bem mais do que o habitual, por causa do El Niño.
Quem é responsável pelo estado porco da
fiação elétrica de São Paulo? Pelas tantas árvores imensas e caindo de podres,
matando e causando prejuízo? Vez e outra, morre gente eletrocutada por causa de
fios podres soltos. Quem empurrou com a barriga, ou coisa pior, o plano de
enterrar os fios? É um conluio público-privado de inépcia e incúria?
Eu morro de medo de chuva.
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