quinta-feira, 9 de novembro de 2023

William Waack - Triunfo das partes

O Estado de S. Paulo

Os principais desafios da reforma tributária ainda não foram resolvidos

A reforma tributária é um perfeito retrato do Brasil. Ficou longe do potencial, deixa muita coisa fundamental para depois, mas, ainda assim, traz uma sensação de alívio.

Tornou-se consenso que tão somente a simplificação de impostos já trará notável ganho de produtividade para empresas. O que equivale a atestar de maneira indireta como é complicado o ambiente de negócios no País.

O texto que está sendo aprovado significa o triunfo das partes sobre o todo. Sem uma forte liderança política capaz de conduzir o processo, toda a energia foi dirigida para a acomodação de dezenas de interesses dos mais variados setores e regiões.

Como sempre, no patrimonialismo brasileiro, isso se dá pela concessão de benefícios, privilégios, renúncias e regimes diferenciados que cada postulante julga ser essencial para a sua sobrevivência. Nesse sentido, está dentro do figurino o número de exceções e de tratamentos especiais contidos na atual reforma.

“Bem comum” ou “conjunto do país” são conceitos teóricos distantes do normal da nossa política. Olhando da perspectiva mais distante possível, o resultado disso é o fato de que o peso total dos tributos continuará sendo excessivo para um país emergente, embora cada “parte” possa considerar que “sua” demanda foi atendida.

Na expressão cunhada por Marcos Lisboa continuaremos sendo o país da meia-entrada, no qual uns pagam pelo que outros não pagam. Mas esse conceito não tem lugar nos embates dentro do nosso sistema político, que exibe escassa capacidade de reagir aos grandes problemas que a sociedade enfrenta.

Talvez se deva admitir que não há no momento perspectivas de se resolver os desafios enfrentados pelos que elaboraram a reforma. Ela esbarrou em questões fundamentais do pacto federativo que vêm se agravando e acabaram colocando Estados contra União, Estados contra Estados, Estados contra municípios e até municípios contra municípios.

Os formuladores da reforma tiveram de lidar com questões abrangentes como o grau de informalidade da economia, a alteração do peso específico de setores como agro, indústria e serviços – num ambiente agravado pela prevalência do problema fiscal (contas públicas). E sob a permanente condição da economia brasileira não gerar taxas de crescimento capazes de sanar as mazelas sociais de sempre.

Há ceticismo entre especialistas sobre a capacidade da reforma de gerar os benefícios que se almejam com um conjunto de medidas desse tipo. A transição é longa, os aspectos técnicos são de enorme complexidade e nem se começou a discutir as leis complementares.

Ainda bem que alívio às vezes se confunde com esperança.

 

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