segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

Alex Ribeiro - Guillen evita cantar vitória no combate à inflação

Valor Econômico

Os preços dos serviços surpreenderam, mas ele atribuiu a desaceleração a fatores mais ligados à sorte do que a um efeito extraordinário da política monetária

A inflação de serviços, a mais difícil de derrubar, passou a surpreender positivamente nos últimos meses, sobretudo os preços mais sensíveis à atividade econômica. A questão: essa melhora seria bastante para o Banco Central acelerar os cortes dos juros e impor uma rédea menos curta na sinalização para a taxa Selic no fim do ciclo de distensão monetária?

Falando a investidores na sexta-feira, o diretor de política econômica do Banco Central, Diogo Guillen, evitou decretar uma vitória definitiva. Os preços dos serviços, de fato, surpreenderam, mas ele atribuiu a desaceleração acima da esperada dos reajustes a fatores mais ligados à sorte do que a um efeito extraordinário da política monetária.

Ele também indicou que está atento se o fenomenal desempenho do mercado de trabalho, com a queda do desemprego sem pressões disseminadas em salários, vai perdurar ao longo do tempo. O BC está olhando sobretudo os salários, mas ele reconhece que há uma desvantagem nessa abordagem: se ocorrerem pressões, o fato está instalado.

Guillen foi questionado nesse evento, promovido pelo banco Barclays, quantos meses de inflação benigna, sobretudo serviços e núcleos, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC precisa observar para ter certeza de que, de fato, a inflação caminha para as metas.

Na sua resposta, ele evitou sinalizar um período de tempo em que a autoridade monetária poderá estar mais confortável com os números. O que fez foi detalhar o diagnóstico do Copom sobre a queda da inflação, o que ajuda a entender um pouco melhor a função de reação do comitê e sua postura ainda um tanto cautelosa

No evento, ele discutiu, primeiro, o efeito da inércia dos preços industriais na queda dos preços de serviços. Esse é o componente de sorte: a inflação geral caiu e contaminou de uma forma mais favorável os preços de serviços. O Banco Central dissecou os números para saber qual foi o verdadeiro causador da queda dos preços dos serviços. Uma hipótese era que a queda da inflação dos preços industriais foi muito pronunciada. A outra hipótese era de que aumentou o coeficiente de repasse da inflação de bens industriais para os preços de serviços.

O que houve foi uma queda forte dos preços industriais, mas o coeficiente de repasse para os bens de serviços não mudou. A notícia é boa. Se esse coeficiente, que o Banco Central usa nos seus modelos de projeção, tivesse mudado, poderia ser grande o impacto na inflação de serviços de uma pequena aceleração nos preços de bens industriais. “O que aconteceu é que tivemos um grande choque primário, profundo, que mexeu com o núcleo de inflação.”

Sobre a queda da inflação de serviços em um ambiente de atividade econômica forte, ele ponderou que o desempenho da economia foi mais forte no primeiro semestre, mas que no segundo semestre está havendo uma moderação. Do ponto de vista dos modelos do BC, porém, a surpresa maior foi na queda dos bens industriais, e menos na inflação de serviços.

“Quando a gente olha os modelos desagregados, os maiores erros [na nossa projeção] foram nos bens industriais, e menos na inflação de serviços”, disse Guillen. No entanto, ao longo do ano, esses erros foram voltando para os padrões esperados. “Os erros estão dentro da média histórica, tanto para bens industriais quanto para serviços.”

O que se depreende da fala de Guillen é que, no final das contas, a surpresa da inflação recente foi mais episódica e menos estrutural. A inflação de bens industriais caiu muito, e isso afetou serviços, mas não com uma intensidade (ou um coeficiente de repasse) maior. Lá atrás, as coisas se saíram fora do previsto pelo modelo de projeção do Banco Central, mas sobretudo em bens industriais, e menos em serviços. Agora, a inflação está evoluindo mais em linha com o previsto pelo modelo. Isso significa que o Banco Central está confiante de que seu modelo vai ser mais preciso daqui para frente.

Esse diagnóstico de Guillen tem implicações práticas importantes. Uma parte do mercado vem afirmando que a inflação de serviços está reagindo de forma surpreendente - e que o Copom apenas está acumulando informações para concluir que, de fato, vivemos num mundo mais benigno que permite cortes mais agressivos de juros ou uma taxa terminal mais baixa no ciclo.

O sumário do que disse Guillen é que não há nada realmente novo e que a inflação deverá caminhar conforme o previsto. O esperado pelo BC é uma inflação de 3,6% em 2024 e de 3,2% em 2025, em ambos os casos acima das metas.

O diretor do BC deu uma declaração um pouco dura, na sexta-feira, para quem espera um Copom mais suave: a política monetária contracionista ainda tem um trabalho pela frente.

Guillen destacou a necessidade de observar os dados para determinar o orçamento de corte de juros. “Dissemos que depende dos dados e que é contracionista. Por que você precisa ter uma taxa terminal contracionista? Porque você tem expectativas de inflação acima da meta. E, finalmente, vai ser o ciclo necessário para trazer a inflação de volta para a meta”, afirmou. “As pessoas não se preocupam com isso, mas acho que é a frase mais importante na ata do Copom é que o ciclo vai ser o que for necessário para trazer a inflação para a meta."

 

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